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Decisão do colegiado de 11/06/2002

Participantes

JOSÉ LUIZ OSORIO DE ALMEIDA FILHO - PRESIDENTE
LUIZ ANTONIO DE SAMPAIO CAMPOS - DIRETOR (*)
NORMA JONSSEN PARENTE - DIRETORA
WLADIMIR CASTELO BRANCO CASTRO - DIRETOR

(*) Não participou da discussão do item 4 (Instrução Regulamento PAS)

RECURSO CONTRA A DECISÃO DA SMI EM PROCESSO DE FUNDO DE GARANTIA - CLUBE DE INVESTIMENTO FANECA / MARLIN S/A CCTVM - PROC. SP2001/0297

Reg. nº 3463/01
Relator: DWB
O Colegiado acompanhou o voto do Diretor-Relator, a seguir transcrito:
"PROCESSO CVM SP2001/0297 – REGISTRO EXE/CGP nº3463/2001
RECURSO DE DECISÃO DE FUNDO DE GARANTIA ("Caso Marlin")
Reclamante: Clube de Investimento Faneca
Relator: Diretor Wladimir Castelo Branco Castro
Relatório
Trata-se de recurso de decisão da SMI (fls.28) que reformou parcialmente a decisão do Conselho de Administração da Bovespa (fls.129 do Processo Bovespa FG 023/2001 – "Processo FG") proferida em razão de reclamação ao Fundo de Garantia interposta por Matias Rodrigues Maio, representante legal do Clube de Investimento Faneca (fls. 001 do Processo FG).
O Sr. Matias Rodrigues Maio, representante legal do Clube de Investimento Faneca (ficha cadastral e contrato às fls. 034 a 037 do Processo FG), em documento enviado em 24/01/2001 ao Fundo de Garantia da Bovespa, requer a reposição de 800.000 ações PN de emissão da Cia. Siderúrgica de Tubarão e 4.000.000 de ações PN de emissão do Banco do Brasil "alegando que tais ações estão faltando em sua posição de custódia, junto à Corretora Marlin", conforme confirmado pelo Relatório de Auditoria da Bovespa (fls.028 Processo FG).
De acordo com o Relatório de Auditoria da Bovespa (fls. 27 a 33), "em 05/09/2000 foi realizada pela corretora Marlin uma transferência de 800.000 ações" de emissão da Cia. Siderúrgica de Tubarão PN "da custódia do clube de investimento" Faneca, "mantida junto a CBLC, para o cliente Andorra Clube de Investimento, cliente da mesma corretora. Não se localizou qualquer documento junto a Marlin em que o clube de investimento tivesse autorizado a transferência ou o empréstimo das ações ao referido cliente. Restou um saldo na posição do cliente de 1.6000.000 ações preferenciais da Cia. Siderúrgica de Tubarão, das quais 400.000 ações foram vendidas. ..As restantes 1.200.000 ações ...foram transferidas para a conta do cliente na corretora Égide. (...) Em 25/05/2000, no pregão da BOVESPA, foram vendidas pela corretora Marlin 4.000.000 de ações PN de emissão do Banco do Brasil, sendo que o produto financeiro desta venda foi creditado para os seguintes clientes: Diagnósticos Laborat. Especializados Ltda. e Nilton Herbert do Sacramento. A liquidação física, contudo, foi realizada com as ações da posição de custódia do Faneca – Clube de Investimento, em razão da operação ter sido reespecificada em seu nome. Não se localizou qualquer documento junto a Marlin em que o clube de investimento tivesse autorizado a reespecificação ou empréstimo das ações aos referidos clientes" (fls. 031 e 032 do Processo FG). Ao final, o relatório ainda considera que "embora o administrador da carteira do clube (GDA) estivesse recebendo os extratos emitidos pela BOVESPA/CBLC que apontavam ausência de ações ...objeto da presente reclamação, desde maio e setembro de 2000, respectivamente, não identificamos qualquer manifestação formal a esse respeito (fls. 033 do Processo FG).
Ao observar o Relatório de Auditoria da Bovespa, também é importante ressalvar a seguinte informação: "Além da Corretora Marlin na condição de administradora do Clube, existia também uma empresa com o nome de GDA Assessoria, Consultoria e Realizações Ltda., responsável pela administração da carteira do clube e que se encontrava locada dentro das instalações da própria Corretora Marlin" (fls.029 Processo FG).
O administrador da carteira do clube informou à auditoria da Bovespa, em documento enviado em 09/03/2001, que "após incessantes cobranças verbais dirigidas à Custódia da Marlin S/A CCTVM, face ao não recebimento dos Extratos Mensais de Custódia visando encaminhamento aos gestores dos Clubes, a direção da Marlin assinou correspondência ...a pedido da GDA, solicitando à Câmara Brasileira de Liquidação e Custódia – CBLC que tais extratos fossem emitidos e enviados mensalmente. Esta correspondência comprova que os extratos não estavam sendo recebidos na própria Marlin ou estavam extraviados" (fls. 069 do Processo FG).
O parecer da Consultoria Jurídica da Bovespa concluiu que "parte do pedido de ressarcimento formulado pelo Reclamante está prescrito, especificamente quanto à utilização de 4.000.000 de ações do Banco do Brasil para liquidar operações de terceiros. Considerando que a irregularidade acima descrita ...ocorreu em 25/05/00 e que o administrador do Reclamante recebia extratos de custódia, fato este que não foi por ele contestado quando de sua manifestação acerca do Relatório de Auditoria, não há como afastar a prescrição quanto a estas 4.000.000 de ações preferenciais do Banco do Brasil. (...) Ainda que seja alegado ...o parágrafo segundo do artigo 41" – da Resolução CMN nº2.690/00 com a redação dada pela Resolução CMN nº2.774/00 – "e possa, assim, justificar o pedido de ressarcimento formulado em janeiro de 2001, esta assertiva não pode ser aceita. A justificativa é simples: a Reclamante teve acesso a elementos que lhe permitiram tomar conhecimento dos fatos, estes elementos são os extratos da BOVESPA/CBLC enviados ao administrador. O administrador tinha o dever de verificar a regularidade das operações, fornecer relatórios mensais ao Reclamante e ser diligente na condução da administração do Clube (nos termos do artigo 14 da Instrução CVM nº40/84)" (fls. 123 –124 do Processo FG).
Em relação ao ressarcimento de 800.000 ações preferenciais da Cia. Siderúrgica de Tubarão o Parecer da Consultoria Jurídica da Bovespa considera que "os levantamentos efetuados pela Consultoria de Auditoria desta Bolsa confirmam a falta desta quantidade de ações e, também, confirmam a falta de autorização para a transferência que ocasionou esta ausência de ações de titularidade do Reclamante. A operação irregular, que levou a falta destas 800.000 ações, ocorreu em 05/09/00. (...) A Regulamentação da época dos fatos determinará as hipóteses de ressarcimento de prejuízos pelo Fundo de Garantia.(...) Este ato praticado pela Reclamada constitui uso indevido de valores mobiliários e numerário do Reclamante por parte da Reclamada. A Reclamada indevidamente, sem autorização, transferiu ações do Reclamante. Fica demonstrado que a conduta da Reclamada gerou prejuízo ao Reclamante e que esta conduta (transferência indevida) constitui hipótese de ressarcimento pelo Fundo de Garantia, conforme disposto no Inc. II do artigo 40 do Regulamento anexo à Resolução CMN nº 2.690/00 com redação dada pela Resolução CMN nº2.774/00, vigente à época de ocorrência da irregularidade e ainda em vigor." (fls. 125 e 126 Processo FG).
Assim o Parecer conclui que "o pedido do Reclamante deve ser parcialmente atendido, já que parte da reclamação está prescrita. Ou seja, houve prescrição e a conseqüente perda do direito de ressarcimento de 4.000.000 de ações preferenciais do Banco do Brasil. O Reclamante tem direito ao ressarcimento pelo Fundo de Garantia da Bovespa de 800.000 ações preferenciais da Cia. Siderúrgica de Tubarão e todos os direitos a elas inerentes."(fls.127 Processo FG).
O Conselho de administração da Bovespa aprovou o Parecer da Comissão Especial de Fundo de Garantia, que por sua vez seguiu o entendimento prolatado nos Pareceres da Consultoria Jurídica. (fls.128 a 130 do Processo FG).
Em recurso enviado à Bovespa (fls. 132 a 135 do Processo FG), o recorrente alega que "somente veio a tomar conhecimento das irregularidades praticadas pela Corretora em janeiro de 2001" (fls. 132 do Processo FG). Alega ainda o reclamante que "sempre que o Recorrente teve algum problema, se dirigia a reclamada, que lhe prestava informações, dizia que houve uma pequena falha, que já tinha tomado providências etc. ...A Corretora induziu o Recorrente em erro, mostrando-lhe documentos, que agora, veio saber serem falsos, de que a custódia das ações estava no Banco Brascan. ...Os representantes do Clube procuraram os responsáveis pela Corretora e, recebendo explicações, que pareceram adequadas, não tinham motivos para recorrer ao Fundo, brigar com a Corretora" (fls.133 Processo FG).
A SMI decidiu "(i) manter a decisão do Conselho de Administração da BOVESPA, de 04.06.2001, na parte que julgou procedente o pedido de ressarcimento; e (ii) reformar essa decisão na parte que julgou improcedente o pedido de ressarcimento sob a alegação da ocorrência de prescrição, adotando para tanto, como se aqui escrito estivesse, o Parecer CVM/GMN/026/2001, de 01.08.2001" (fls.28).
O recurso da Bovespa requer que o Colegiado reforme integralmente as decisões da SMI, por considerar que "neste processo decidiu-se pela prescrição porque, de acordo com as apurações efetuadas pela Consultoria de Auditoria da BOVESPA, foram enviados para o endereço do Clube (o endereço de seu Administrador coincidia com o endereço do Administrador do Clube) os extratos de custódia da CLC e da CLBC que refletiam a falta das ações reclamadas. Logo, é incontestável que o Clube, através de seu Administrador e do Administrador de Carteira, tinha meios de ter conhecimento do desvio das ações de sua conta. Fica evidente que houve falta de zelo e atenção do Reclamante. Afastada a prescrição, por determinação da CVM, apesar dos fatos evidenciados acima, este Reclamante teria direito ao ressarcimento de 4.000.000 de ações do Banco do Brasil PN, transferidas indevidamente de sua conta na CBLC em 25/05/00. A responsabilidade deste ressarcimento seria do Fundo de Garantia da BOVESPA" (fl.80).
Em razão de algumas questões levantadas pela Bovespa em seu recurso, a GMN ofereceu "novo parecer que substitui por completo o anterior e que relata, ainda que de forma sucinta, todos os casos" (fls.88). Este novo parecer concluiu que "os reclamantes não tiveram comprovadamente a possibilidade de acesso a elementos que lhes permitiriam tomar ciência dos prejuízos havidos, uma vez que a ação dos fraudadores era de tal modo engendrada que até os diretores da corretora, os auditores da Bovespa/BVRJ, bem como o auditor independente, não puderam detectar elementos que lhes permitiram tomar ciência das fraudes, o que, portanto, afasta a alegada prescrição" (fls.107-108).
Em 04.10.01 a SMI decidiu "(i) manter a decisão do Conselho de Administração da BOVESPA, de 04.06.2001, na parte que julgou procedente o pedido de ressarcimento; (ii) reformar essa decisão na parte que julgou improcedente o pedido de ressarcimento sob a alegação da ocorrência de prescrição, adotando para tanto, como se aqui escrito estivesse, o Parecer CVM/GMN/029/2001, de 01.10.01; e (iii) reformar, com fulcro no item III da Deliberação CVM nº202/96, a decisão desta SMI de 03.09.01 quanto aos seus fundamentos e determinação, haja vista as razões do recurso apresentado pela Bovespa em 19.09.01" (fls.109).
É o relatório.
Voto
As hipóteses de ressarcimento pelo Fundo de Garantia são enumeradas pelo artigo 40 da Resolução CMN nº2.690/00, na redação original - em vigor ao tempo das operações que geraram a reclamação das ações de emissão do Banco do Brasil - e na redação dada pela Resolução CMN 2.774/00 - em vigor ao tempo das operações que geraram a reclamação das ações de emissão da Siderúrgica Tubarão - abaixo transcrita:
"Art. 40. As bolsas de valores devem manter Fundo de Garantia, com finalidade exclusiva de assegurar aos investidores do mercado de valores mobiliários, até o limite do Fundo, ressarcimento de prejuízos decorrentes da atuação de administradores, empregados ou prepostos de sociedade membro ou permissionaria, em relação a intermediação de negociações realizadas em bolsa e aos serviços de custodia, especialmente nas seguintes hipóteses:(NR)
I - inexecução ou infiel execução de ordens;
II - uso inadequado de numerário, de títulos ou de valores mobiliários, inclusive em relação a operações de financiamento ou de empréstimos de ações para a compra ou venda em bolsa (conta margem);
III – entrega ao investidor de títulos ou valores mobiliários ilegítimos ou de circulação proibida; (NR) 
IV – inautenticidade de endosso em titulo ou em valor mobiliário ou ilegitimidade de procuração ou documento necessário a transferencia dos mesmos;
V – decretação de liquidação extrajudicial pelo Banco Central do Brasil ;e (NR) VI – encerramento das atividades. (NR)
Parágrafo único. A negociação com os títulos mencionados no art. 33 deste Regulamento em recinto ou sistema de bolsa de valores não se encontra abarcada pelo disposto neste artigo."
De acordo com os autos, é possível identificar este caso na hipótese do inciso II, visto que não foram localizados documentos em que o reclamante tivesse autorizado a transferência ou empréstimo das ações.
Já o artigo 41 da Resolução CMN nº2.690/00, com a redação dada pela Resolução CMN 2.774/00, e mesmo na redação original, dispõe que:
"Art.41.Oinvestidor poderá pleitear o ressarcimento do seu prejuízo por parte do Fundo de Garantia, independentemente de qualquer medida judicial ou extrajudicial contra as sociedade membro ou permissionária, ou a bolsa de valores. (NR)
Parágrafo 1º. O pedido de ressarcimento ao Fundo de Garantia deve ser formulado no prazo de seis meses, a contar da ocorrência da ação ou omissão que tenha causado o prejuízo. 
Parágrafo 2º. Quando o investidor não tiver tido comprovadamente possibilidade de acesso a elementos que lhe permitam tomar ciência do prejuízo havido, o prazo estabelecido no parágrafo anterior será contado da data do conhecimento do fato." (NR)
Embora a Bovespa tenha afirmado que o reclamante - administrador da carteira do clube - estivesse recebendo os extratos emitidos pela CBLC, fato negado por este, entendo que o prazo prescricional deve ser contado a partir de quando as fraudes praticadas por funcionários da Corretora, que também era administradora do Clube, tornaram-se públicas, em vista da ação dos fraudadores ser de tal modo engendrada que mesmo os diretores da empresa e os auditores da Bovespa/BVRJ, assim como os auditores independentes, não puderam detectar elementos que lhes permitissem tomar ciência da fraude.
Ademais, é preciso considerar as alegações do reclamante, já transcritas, segundo as quais "sempre que o Recorrente teve algum problema, se dirigia a reclamada, que lhe prestava informações, dizia que houve uma pequena falha, que já tinha tomado providências etc. ...A Corretora induziu o Recorrente em erro, mostrando-lhe documentos, que agora, veio saber serem falsos, de que a custódia das ações estava no Banco Brascan. ..."(fls.133 Processo FG).
Firmo meu entendimento na opinião da PJU, proferida no MEMO/CVM/GJU-1/051/02, ora anexado a estes autos, de que "na hipótese em que prepostos da instituição intermediária fornecem informações falsas acerca de movimentações informadas em extratos enviados pela instituição custodiante, induzindo mediante ardil, seus clientes a erro, a presunção de ciência do dano operada pelo recebimento do aviso é desconstituída, dado ser natural a crença do investidor na informação prestada pela instituição com que este mantém relação imediata, em detrimento da informação contida em extrato enviado por terceiro com quem o investidor não possui qualquer vínculo de confiança" (fls.125).
Assim sendo voto pelo não acolhimento do recurso da Bovespa, por entender que não houve prescrição em relação ao pedido de ressarcimento de 4.000.000 de ações do Banco do Brasil PN, reconhecendo que o reclamante só teve conhecimento dos fatos em janeiro de 2001 e o pedido de ressarcimento foi apresentado no dia 24 do mesmo mês, portanto dentro do prazo legal de 6 meses, devendo a Bovespa, portanto, efetuar o ressarcimento destas ações além de efetuar o ressarcimento das 800.000 ações PN da Cia. Siderúrgica de Tubarão - com o qual a Bovespa já havia concordado - e todos os direitos a elas inerentes, atualizados na forma regulamentar e conforme decisão do Colegiado proferida em 13/02/2001.
Rio de Janeiro, 11 de junho de 2002
Wladimir Castelo Branco Castro
Diretor Relator"
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