CVM agora é GOV.BR/CVM

 
Você está aqui:

Decisão do colegiado de 11/06/2002

Participantes

JOSÉ LUIZ OSORIO DE ALMEIDA FILHO - PRESIDENTE
LUIZ ANTONIO DE SAMPAIO CAMPOS - DIRETOR (*)
NORMA JONSSEN PARENTE - DIRETORA
WLADIMIR CASTELO BRANCO CASTRO - DIRETOR

(*) Não participou da discussão do item 4 (Instrução Regulamento PAS)

RECURSO CONTRA A DECISÃO DA SMI EM PROCESSO DE FUNDO DE GARANTIA - LÍGIA DE ALBUQUERQUE DIAS / MARLIN S/A CCTVM - PROC. SP2001/0300

Reg. nº 3465/01
Relator: DWB
O Colegiado acompanhou o voto do Diretor-Relator, a seguir transcrito:
"PROCESSO CVM SP2001/0300 – REGISTRO EXE/CGP Nº 3465/2001
RECURSO DE DECISÃO DE FUNDO DE GARANTIA ("Caso Marlin")
Reclamante: Lígia de Albuquerque Dias
Relator: Diretor Wladimir Castelo Branco Castro
Relatório
Trata-se de recurso de decisão da SMI (fls.108) que decidiu reformar a decisão do Conselho de Administração da Bovespa (fls.49 do Processo Bovespa FG 121/2001 – "Processo FG") proferida em razão de reclamação ao Fundo de Garantia interposta por Lígia de Albuquerque Dias (fls. 002 do Processo FG).
A Sra. Lígia de Albuquerque Dias (ficha cadastral e contrato às fls.010 e 011 do Processo FG), em documento enviado em 03/04/2001 ao Fundo de Garantia da Bovespa, requer a reposição de 15.000 Recibos de Carteira Selecionada de Ações Telebrás (RCTB 41), "alegando que tais ativos estão faltando em sua posição de custódia, junto à Corretora Marlin" (fls.005 Processo FG).
Segundo o Relatório de Auditoria da Bovespa de 17/04/2001(fls. 004 a 009), que trata exclusivamente do pedido descrito acima, "no dia 20/06/00, através da Corretora Marlin, 15.000 Recibos Representativos da Carteira Selecionada de Ações Telebrás (RCTB 41) foram transferidos da conta de custódia da reclamante, junto à CBLC, para a conta de custódia de outro cliente da Marlin, de nome ‘Pedro Luiz Gueiros Taulois’, também na CBLC. Não localizamos documento outorgado pela reclamante, autorizando a transferência ou empréstimo destes ativos. A posição de custódia em nome da reclamante junto à Corretora Marlin,(...) apresenta, ainda, saldo de 5.000 Recibos Representativos de Carteira Selecionada de Ações Telebrás (RCTB 41) que (...) foram transferidos a seu pedido, para sua conta de custódia junto à Corretora Égide. A movimentação ocorrida, conforme demonstrado, resultou em falta efetiva de 15.000 Recibos de Carteira Selecionada de Ações Telebrás (RCTB 41), na conta de custódia da Sra. Lígia de Albuquerque Dias, junto à Marlin" (fls.008 Processo FG).
Contudo, em documento enviado à Auditoria da Bovespa, datado de 30/03/2001, a reclamante veio a solicitar, além do que constou no pedido inicial, "a regularização dos papéis Telebrás PN (...)" e questionar "quanto tempo a carteira estará totalmente regularizada e transferida para a Corretora Égide, sem quaisquer exigências após a transferência das 100 ações da Petrobrás PN, para a conta da Marlin para cobrir a posição destes papéis nesta corretora" (fls. 017 Processo FG).
A Bovespa, em carta datada de 24/04/2001, informou à reclamante que "em atenção à sua correspondência datada de 30/03/2001, ...instauramos o processo de Fundo de Garantia em epígrafe..." (fls. 020 Processo FG), muito embora se tenha verificado que o pedido complementar contido na mencionada correspondência não tenha sido objeto de exame pela Auditoria da Bovespa.
Contudo, a reclamante declarou à Auditoria da Bovespa, em documento enviado em 23.05.2001, que "tendo em vista o levantamento feito pela Auditoria BOVESPA, no que se refere aos atos reclamados (reposição de 15.000 ações PN RCTB 41 Telebrás), estou ciente do resultado da auditagem, que está correto, assim aguardo a reposição das referidas ações e direitos que existiam, ou que venham a existir em função das mesmas", aproveitando para informar "que o momento em que tomei conhecimento da falta das ações... foi no dia 11 de janeiro de 2001, quando da intervenção da Bovespa na Marlin" (fls.034' Processo FG) - grifou-se.
O Parecer da Consultoria Jurídica da Bovespa (fls. 40 a 49 do Processo FG) diz que "a apresentação do pedido de ressarcimento em 03 de abril de 2001 é intempestiva. Uma vez que o ato irregular ocorreu em 20/06/00, e que a Reclamante, conforme consta do Relatório de Auditoria, recebeu os Extratos da CBLC e nada fez, não há como aceitar a alegação de que tomou conhecimento em 11/01/01". Esse parecer ainda diz: "ainda que o seja alegado que o parágrafo segundo do ... artigo 41" – do Regulamento anexo à Resolução CMN nº2.690/00, com redação dada pela Resolução CMN nº 2.2774/00 – "disponha que ‘quando o investidor não tiver comprovadamente possibilidade de acesso a elementos que lhe permitam tomar ciência do prejuízo havido, o prazo estabelecido no parágrafo anterior será contado da data do conhecimento do fato’ e possa, assim justificar o pedido de ressarcimento formulado em abril de 2001, esta assertiva não pode ser aceita.
A justificativa é simples: a Reclamante teve acesso a elementos que lhe permitiram tomar conhecimento dos fatos, estes elementos são os extratos da CBLC" (fls.45-46 do Processo FG).
O Conselho de Administração da Bovespa aprovou o parecer da Comissão Especial de Fundo de Garantia que por sua vez seguiu o entendimento prolatado nos Pareceres da Consultoria Jurídica, "negando provimento integral à reclamação formulada ... contra a Marlin ... devido à prescrição do pedido de ressarcimento, com a conseqüente perda do direito ao ressarcimento pelo Fundo de Garantia" (fls.037 e 048 do Processo FG).
A reclamante apresentou recurso dessa decisão à CVM (fls. 17 a 25), do qual se extrai o seguinte excerto:
"No caso da Marlin S/A, os dirigentes do Fundo de Garantia da Bovespa resolveram, não se sabe o porquê, prestar meias garantias, ao invés da total e efetiva devida.
E, para assim procederem, resolveram falar em ocorrência de prescrição, sob a presunção, mera presunção, de que os clientes da corretora teriam que interpor reclamação a contar da data em que a CBLC expediu extrato de posição de custódia, com valores incorretos.
Entretanto, essa premissa não é válida. Não está escrita em qualquer regulamento, nem no extrato mensal de custódia.
A única nota que consta nos papéis da Bovespa, no Aviso de Negociação de Ações (ANA) é que: "Este aviso 'ANA' será documento válido para eventuais reclamações junto às Corretoras e Bolsa de Valores de São Paulo.'
Na nota de nº 3 está escrito o seguinte: 'As reclamações sobre os dados constantes no 'ANA' deverão ser formuladas inicialmente junto às Corretoras e posteriormente à Superintendência Geral da Bolsa de Valores de São Paulo, no prazo de 7 (sete) dias do recebimento.'
Ora, se o cliente reclama, como manda tal impresso, junto à Corretora e esta lhe diz que o assunto foi resolvido, não há que se cogitar de ir, posteriormente, fazer reclamação à Superintendência da Bolsa" (fls. 19 e 20).
A SMI decidiu "reformar a decisão do Conselho de Administração da Bovespa, de 04.06.2001, que julgou improcedente o pedido de ressarcimento sob a alegação da ocorrência de prescrição, adotando para tanto, como se aqui escrito estivesse, o Parecer CVM/GMN/026/2001, de 01.08.2001". (fls.27)
Em seu recurso, a Bovespa alega que "decidiu-se pela prescrição porque a Reclamante, segundo consta do Relatório de Auditoria, recebia os extratos de custódia que refletiam a falta dos recibos em sua conta, mas não foi encontrado qualquer registro de manifestação de sua parte. Logo, a reclamante tinha meios de ter conhecimento do desvio dos recibos de sua conta. Fica evidente que houve falta de zelo e atenção da Reclamante. Afastada a prescrição, por determinação da CVM, apesar dos fatos evidenciados acima, esta Reclamante teria direito ao ressarcimento de 15.000 RCTB 41, transferidos indevidamente de sua conta custódia mantida na CBLC em 20/06/00. Este ressarcimento competiria ao Fundo de Garantia da Bovespa." (fls.80).
Ao final, a Bovespa requer que o Colegiado "reforme integralmente as decisões da SMI dando provimento integral ao presente recurso" (fls.82).
Em razão de algumas questões levantadas pela Bovespa em seu recurso, a GMN ofereceu "novo parecer que substitui por completo o anterior e que relata, ainda que de forma sucinta, todos os casos" (fls.87). Este novo parecer concluiu que "os reclamantes não tiveram comprovadamente a possibilidade de acesso a elementos que lhes permitiriam tomar ciência dos prejuízos havidos, uma vez que a ação dos fraudadores era de tal modo engendrada que até os diretores da corretora, os auditores da Bovespa/BVRJ, bem como o auditor independente, não puderam detectar elementos que lhes permitiram tomar ciência das fraudes, o que, portanto, afasta a alegada prescrição." (fls.106-107).
A SMI, por sua vez, "tendo examinado o recurso da Bovespa, ... decidiu reformar a decisão do Conselho de Administração da Bovespa, que julgou improcedente o pedido de ressarcimento sob a alegação da ocorrência de prescrição, adotando para tanto, o Parecer CVM/GMN/029/2001 de 01.10.2001; e, decidiu reformar, com fulcro no item III da Deliberação CVM nº202/96, a decisão da SMI de 03.09.01, quanto aos seus fundamentos e determinação" (fls.109).
É o Relatório.
Voto
O artigo 40 da Resolução CMN nº 2690, vigente à época dos fatos, enumera as hipóteses de ressarcimento pelo Fundo de Garantia.
"Art. 40. As bolsas de valores devem manter Fundo de Garantia, com finalidade exclusiva de assegurar aos clientes de sociedade membro, até o limite do Fundo, ressarcimento de prejuízos decorrentes: 
I- da atuação de administradores, empregados ou prepostos de sociedade membro ou permissionária da bolsa de valores que tiver recebido a ordem do investidor, em relação a intermediação de negociações realizadas em bolsa e aos serviços de custódia, especialmente nas seguintes hipóteses:
a) inexecução ou infiel execução de ordens;
b) uso inadequado de numerário, de títulos ou de valores mobiliários, inclusive em relação a operações de financiamento ou de empréstimos de ações para a compra ou venda em bolsa (conta margem);
c) entrega ao comitente de títulos ou valores mobiliários ilegítimos ou de circulação proibida;
d) inautenticidade de endosso em título ou em valor mobiliário ou ilegitimidade de procuração ou documento necessário a transferência dos mesmos;
e)encerramento das atividades; e
II- da atuação de administradores, empregados e prepostos da sociedade membro que represente a contraparte da operação.
Parágrafo único. A negociação com os títulos mencionados no art. 33 deste Regulamento em recinto ou sistema de bolsa de valores não se encontra abarcada pelo disposto neste artigo. "
De acordo com os autos, é possível identificar este caso na hipótese do inciso I, alínea "b", já que, segundo os autos, não houve autorização da reclamante para a transferência de suas ações para a conta de outro cliente da corretora.
Já o parágrafo 2º do artigo 41da resolução supra citada dispõe que:

"Art.41. O investidor poderá pleitear o ressarcimento do seu prejuízo por parte do Fundo de Garantia, independentemente de qualquer medida judicial ou extrajudicial contra a sociedade membro ou permissionária, ou a bolsa de valores. (NR)
Parágrafo2º. Quando o investidor não tiver tido comprovadamente possibilidade de acesso a elementos que lhe permitam tomar ciência do prejuízo havido, o prazo estabelecido no parágrafo anterior será contado da data do conhecimento do fato." (NR)
Embora a reclamante estivesse recebendo os extratos emitidos pela CLC, tais extratos foram questionados pela reclamante junto à corretora devido à sua "irregularidade e inconstância" (cf. fls. 017 Processo FG), dando oportunidade para que a Corretora passasse à cliente a falsa impressão de que a irregularidade reclamada seria resolvida em seu âmbito. Por essa razão, entendo que o prazo prescricional deve ser contado a partir de quando as fraudes praticadas por funcionários da corretora tornaram-se públicas, visto que, ademais, como já salientou a SMI, a ação dos fraudadores era de tal modo engendrada que mesmo os diretores da empresa e os auditores da Bovespa/BVRJ, assim como os auditores independentes, não puderam detectar elementos que lhes permitissem tomar ciência da fraude.
Firmo meu entendimento na opinião da PJU, proferida no MEMO/CVM/GJU-1/051/02, ora anexado a estes autos, segundo a qual "na hipótese em que prepostos da instituição intermediária fornecem informações falsas acerca de movimentações informadas em extratos enviados pela instituição custodiante, induzindo mediante ardil, seus clientes a erro, a presunção de ciência do dano operada pelo recebimento do aviso é desconstituída, dado ser natural a crença do investidor na informação prestada pela instituição com que este mantém relação imediata, em detrimento da informação contida em extrato enviado por terceiro com quem o investidor não possui qualquer vínculo de confiança" (fls.126).
Sendo assim, entendo que não ocorreu prescrição, tendo em vista que os fatos tornaram-se públicos em janeiro de 2001 e o pedido de ressarcimento foi apresentado em abril do mesmo ano, portanto dentro do prazo legal de seis meses, e voto pelo não acolhimento do recurso da Bovespa, devendo esta efetuar o ressarcimento de 15.000 Recibos Representativos da Carteira Selecionada de Ações Telebrás (RCTB 41), atualizadas na forma regulamentar e conforme decisão do Colegiado proferida em 13/02/2001.
Rio de Janeiro, 11 de junho de 2002
Wladimir Castelo Branco
Diretor Relator"
Voltar ao topo