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Decisão do colegiado de 19/03/2019

Participantes

·       MARCELO BARBOSA – PRESIDENTE
·       CARLOS ALBERTO REBELLO SOBRINHO – DIRETOR
·       FLÁVIA MARTINS SANT’ANNA PERLINGEIRO – DIRETORA

 

RECURSO EM PROCESSO DE MECANISMO DE RESSARCIMENTO DE PREJUÍZOS – SERGIO SENDER/CGD INVESTIMENTOS CVC S.A. - PROC. SEI 19957.004043/2016-69

Reg. nº 1266/18
Relator: SMI/GME (Pedido de vista PTE)

Trata-se de recurso (“Recurso”) interposto por Sergio Sender (“Recorrente”) contra decisão da BM&FBOVESPA Supervisão de Mercados (“BSM”) que deferiu parcialmente seu pedido de ressarcimento no âmbito do Mecanismo de Ressarcimento de Prejuízos (“MRP”), movido em face de CGD Investimentos CVC S.A. (“Reclamada”), pela suposta realização, entre 21.08.12 e 05.07.13, de operações não autorizadas e em desacordo com seu perfil de investidor.

 

Em sua Reclamação, o Recorrente relatou que no início do relacionamento comercial, o preposto da Reclamada teria mantido contato frequente e, em algumas ocasiões, teria solicitado autorização para a realização de operações, e que, no entanto, a partir de novembro de 2012, o referido agente autônomo não teria mais lhe procurado. Alegou ainda que, diante dessa situação e considerando que não recebia os extratos mensais, solicitou, em 05.07.13, seus extratos e sua posição investida. Assim, ao ter acesso às notas de corretagem e extratos, ele teria percebido diversas operações não autorizadas e a perda de cerca de 90% do valor de seu investimento inicial, que teria sido de R$ 160.000,00 (cento e sessenta mil reais).

 

Em sua defesa, a Reclamada argumentou que: (i) o Recorrente não teria atendido a todos os requisitos exigidos nos pedidos de ressarcimento, pois não houve a descrição exata da forma como a Reclamada teria causado os alegados prejuízos nem a descrição das operações questionadas; (ii) o Recorrente recebia mensalmente os extratos de sua conta, e também poderia tê-los acessado em endereço eletrônico; e (iii) teria sido solicitado do cliente a autorização para as operações realizadas em seu nome, desde o início do contrato celebrado entre as partes, em fevereiro de 2012 até dezembro de 2012.

 

A Superintendência de Auditoria de Negócios – SAN da BSM elaborou o relatório de auditoria nº 048/2017, em que verificou que, no período reclamado, o Recorrente não teria preenchido questionário para a definição de seu perfil como investidor e foi classificado pela Reclamada como “conservador”. A SAN também consolidou o resultado líquido das operações em nome do Recorrente para os quais a Reclamada não apresentou a autorização das ordens executadas, concluindo que houve uma perda de R$ 44.636,03 (quarenta e quatro mil seiscentos e trinta e seis reais e três centavos).

 

Em sua análise, a Superintendência Jurídica da BSM ‒ SJUR destacou que, conforme regulamentos aplicáveis, a Reclamada tinha o dever de gravar e guardar as ordens proferidas previamente à realização dos negócios, de modo que o ônus da prova da existência das ordens recairia sobre ela. Desse modo, concluiu que houve infiel execução das ordens sem comprovação de autorização em nome do cliente, no período reclamado, o que corresponderia ao inciso I do artigo 77 da Instrução CVM nº 461/07, e opinou pelo ressarcimento no valor apontado pela SAN, atualizado monetariamente pelo IPCA, acrescido de juros simples de 6% ao ano, a partir de 20.12.12, data da última operação não autorizada. O Diretor de Autorregulação da BSM - DAR e o Conselho de Supervisão da BSM acompanharam o parecer da SJUR, tendo decidido pelo ressarcimento parcial no valor de R$ 44.636,03.

 

Ao analisar o recurso, nos termos do Memorando nº 118/2018-CVM/SMI/GME, a SMI questionou a BSM sobre algumas operações consideradas autorizadas. Em resposta, a BSM esclareceu que as operações para as quais não houve ordens prévias e inclusive para aquelas ordens cujas autorizações precederam a solicitação encaminhada pelo preposto da Reclamada ao Recorrente, entraram no cômputo das operações não autorizadas, cujo resultado líquido negativo foi de R$ 44.636,03.

 

Nesse contexto, a SMI destacou que a SAN teria relacionado tanto as ordens não autorizadas que apresentaram prejuízo como também as que apresentaram lucro. Entretanto, na visão da SMI, “as operações lucrativas, mesmo que não autorizadas, não devem entrar no cômputo do cálculo do ressarcimento do MRP, pois esse instrumento visa proteger o investidor das ordens infiéis que geraram perdas financeiras”.

 

A esse respeito, a SMI realizou análise na qual segregou as operações lucrativas e não autorizadas das operações não autorizadas que tiveram resultado negativo, tendo observado que as operações lucrativas não autorizadas geraram resultado de R$ 4.526,65 (quatro mil quinhentos e vinte e seis reais e sessenta e cinco centavos). Assim, diante da premissa de que essas operações não deveriam ter sido consideradas no cálculo do prejuízo indenizável, a área técnica entendeu que esse valor (R$ 4.526,65) deveria ser acrescido ao prejuízo calculado pela BSM (R$ 44.636,03), totalizando um valor a ser ressarcido de R$ 49.126,68 (quarenta e nove mil, cento e vinte e seis reais e sessenta e oito centavos). Por fim, a SMI destacou que, embora o critério ora proposto seja inovador, estaria em linha com a natureza do MRP, “especialmente considerando-se que o art. 77 é explícito ao considerar que a função do mecanismo é ressarcir os investidores dos prejuízos causados pela ação do intermediário, sendo certo que cada ordem não autorizada caracteriza uma ação autônoma do intermediário”.

 

O Presidente Marcelo Barbosa, que havia solicitado vista do processo, apresentou manifestação de voto em que se declarou favorável à manutenção integral da decisão do Conselho de Supervisão da BSM. Em seu entendimento, a abordagem mais pertinente para a análise do caso concreto seria o exame das operações irregulares em seu conjunto, não como ações autônomas, tendo em vista que a Reclamada realizou negociações em nome do Recorrente sem o seu consentimento durante todo o período ora questionado, preservando a mesma conduta antijurídica. Para o Presidente, todas as operações realizadas evidenciam o mesmo nexo de causalidade – a infiel execução de ordens pela Reclamada (infração ao art. 77, I da Instrução CVM nº 461/07) –, restando claro um padrão de conduta da Reclamada perpetrado através de uma série de ações consecutivas.

 

Não obstante, o Presidente apresentou ressalva no seguinte sentido: “ao avaliar o conjunto de operações em um determinado período, é possível que tais operações estejam associadas a atos ilícitos não coincidentes (praticados, por exemplo, por agentes distintos ou decorrentes de ações ou omissões diversas) e que, por consequência, apresentam diferentes nexos de causalidade. Nestas hipóteses, entendo que a compensação entre os resultados das operações, para fins de determinação do valor a ser ressarcido, poderia não se justificar.”.

 

O Presidente Marcelo Barbosa destacou ainda que, como a Instrução CVM nº 461/07 e o Regulamento do MRP não especificam a metodologia aplicável para apuração do valor indenizável, caberia recorrer ao tratamento conferido ao instituto jurídico da indenização no âmbito da responsabilidade civil. Sendo assim, fazendo referência ao art. 944 do Código Civil, ressaltou que as premissas do direito à indenização não permitem que se conduza o investidor lesado à situação mais benéfica do que aquela em que se encontrava antes da conduta ilegal.

 

Em relação ao caso concreto, o Presidente Marcelo Barbosa realçou que, conforme apurado, as ordens executadas pela Reclamada sem autorização prévia, no período questionado, teriam resultado em ganhos e perdas patrimoniais para o Recorrente, sendo certo que o resultado líquido teria sido desfavorável ao investidor no valor de R$ 44.636,03. Assim, concluiu que tal valor seria a exata medida da extensão do dano patrimonial causado pela execução infiel de ordens, devendo ser este o ressarcimento pelo MRP.

 

Por fim, o Presidente registrou seu entendimento de que a metodologia proposta pela área técnica, além de exceder a natureza indenizatória do MRP, poderia dar margem para a criação de incentivos indesejados, uma vez que o MRP “passaria a cobrir situações em que investidores que não suportaram nenhum prejuízo pecuniário – i.e. na hipótese de as operações irregulares apresentarem tanto ou mais resultados positivos do que negativos – receberiam valores do MRP sob o argumento de que as operações que apresentaram prejuízos deveriam ser individualmente consideradas e, portanto, ressarcidas.”. Desse modo, entendeu que o método até então adotado pela BSM e corroborado pela CVM, para apuração do valor a ser indenizado em casos de MRP, não mereceria ser substituído.

 

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando o voto do Presidente Marcelo Barbosa, deliberou pelo não provimento do recurso, com a consequente manutenção integral da decisão do Conselho de Supervisão da BSM, devendo o Recorrente ser indenizado no valor de R$ 44.636,03, correspondente ao resultado líquido das operações irregulares realizadas pela Reclamada.

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