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Decisão do colegiado de 02/04/2019

Participantes

·       MARCELO BARBOSA – PRESIDENTE
·       CARLOS ALBERTO REBELLO SOBRINHO – DIRETOR
·       FLÁVIA MARTINS SANT’ANNA PERLINGEIRO – DIRETORA
·       GUSTAVO MACHADO GONZALEZ – DIRETOR
·       HENRIQUE BALDUINO MACHADO MOREIRA – DIRETOR

CONSULTA ACERCA DA POSSIBILIDADE DE ADOÇÃO DE PROCEDIMENTO DIFERENCIADO EM OPA PARA CANCELAMENTO DE REGISTRO DE COMPANHIA ABERTA - PROC. SEI 19957.007811/2018-06

Reg. nº 1360/19
Relator: SRE/GER-1

Trata-se de consulta apresentada pela Enel Brasil Investimentos Sudeste S.A. (“Enel” ou “Consulente”), em expedientes de 13.08.18 e 03.10.18, sobre a possibilidade de realização de oferta pública de aquisição de ações para cancelamento de registro da Eletropaulo Metropolitana Eletricidade de São Paulo S.A. (“Eletropaulo” ou “Companhia”) com adoção de procedimento diferenciado, nos termos do art. 34 da Instrução CVM nº 361/02 (“Instrução CVM 361”). A Consulente também solicitou tratamento confidencial à Consulta, com base no art. 4º-A da Instrução CVM 361.

O procedimento diferenciado proposto remete ao processo competitivo que resultou na aquisição de controle da Eletropaulo pela Consulente, realizado por meio de OPA voluntária concorrente (“OPA Concorrente Enel”), nos termos do art. 257 da Lei nº 6.404/76 (“LSA”), e concluído por meio de leilão realizado na B3 em 30.05.18. A esse respeito, a Consulente afirmou ter adquirido, tanto por meio da OPA Concorrente Enel, como por meio de aquisições supervenientes no período de 30 dias após sua realização, o equivalente a 93,3% do total de ações que compõem o capital social da Companhia (95,1% do free float).

Nesse contexto, a Consulente entende ser do interesse da Companhia o cancelamento de seu registro como companhia aberta, tendo em vista, principalmente: (i) a baixa liquidez das ações de emissão da Companhia; (ii) a depreciação significativa sofrida pelas ações desde a OPA Concorrente; (iii) o fato de que, na percepção da Enel, a atual cotação das ações de emissão da Companhia não refletiria seu valor justo; e (iv) a incapacidade de a Companhia atender ao requisito mínimo estipulado no Regulamento do Novo Mercado referente ao percentual de ações em circulação.

Desse modo, a Consulente solicitou que as ações adquiridas no âmbito daquela OPA para aquisição de controle fossem consideradas como concordantes com o cancelamento de registro da Companhia, para fins de cômputo do quórum de 2/3 de que trata o inciso II do art. 16 da Instrução CVM 361, em uma eventual OPA para cancelamento de seu registro. Adicionalmente, a Consulente solicitou autorização para a realização de resgate das ações de emissão da Companhia remanescentes em circulação, conforme previsto no art. 4º, § 5º, da LSA, o qual estaria sujeito ao lançamento da OPA para cancelamento de seu registro que seria realizada ao mesmo preço oferecido na OPA Concorrente Enel.

Em sua análise, nos termos do Memorando nº 20/2019-CVM/SRE/GER-1, a Superintendência de Registro de Valores Mobiliários – SRE entendeu que a confidencialidade da consulta poderia ser enquadrada no art. 4º-A da Instrução CVM 361, pois trata-se de OPA projetada, de modalidade que exige o registro na CVM (para cancelamento de registro) e cuja intenção ainda não foi divulgada ao mercado. Entretanto, ressalvou que a partir da deliberação pelo Colegiado da CVM, a consulta e a respectiva decisão deveriam ser tornadas públicas, pois a partir desse momento o ofertante teria as informações necessárias para que decida realizar ou não a OPA em questão. Nesse sentido, registrou que caberia à CVM, após a divulgação, fixar um prazo para que a Consulente e potencial ofertante da OPA apresentasse o pedido de registro da oferta ou “anunci[asse] ao mercado, de maneira inequívoca, que não pretende realizar a OPA dentro do período de 6 (seis) meses”, em observância ao previsto no § 4º do art. 4º-A da referida norma.

Quanto ao mérito, a área técnica manifestou-se contrariamente ao pleito, tendo ressaltado que o procedimento diferenciado proposto estaria em conflito com:
(i) o §4º do art. 4º da LSA, pois, na prática, estaria tratando a OPA Concorrente Enel como uma OPA unificada que congrega a modalidade “para cancelamento de registro”, sendo que a mesma não foi realizada, à época, por acionista controlador ou pela própria companhia. Ademais, ainda que uma OPA para aquisição de controle pudesse ser unificada com uma OPA para cancelamento de registro , destacou que a OPA realizada em 2018 não observou os requisitos atinentes às OPAs para cancelamento de registro;
(ii) a previsão normativa contida no art. 21 da Instrução CVM 361, pois retiraria do titular de ações em circulação no momento da OPA o direito de decidir sobre o cancelamento de registro;
(iii) a disposição constante do Edital da OPA Concorrente Enel (nos termos do item 1.6 do referido documento), que previa que aquela oferta não implicaria o cancelamento de registro da Companhia, nem sua saída do Novo Mercado da B3; e
(iv) o princípio geral de OPA previsto no inciso II do art. 4º da Instrução CVM 361, pois a sua adoção resultaria no fato de que os titulares de ações em circulação que não alienaram suas ações no âmbito da OPA Concorrente Enel não foram dotados dos elementos necessários à tomada de uma decisão refletida e independente quanto à aceitação daquela OPA.

O Diretor Gustavo Gonzalez apresentou manifestação de voto em que ressaltou, inicialmente, a importância de a CVM analisar esse tipo de matéria em sede de consulta, visto que muitas vezes o lançamento de uma OPA envolve discussões jurídicas complexas, muitas vezes inéditas – assim como a situação do caso concreto. Destacou, ademais, que em determinadas situações não é possível segregar o enfrentamento de tais questões do próprio processo de registro, mas quando o é – tal como no caso em questão – a consulta deve ser o instrumento prestigiado.

A seu ver, a possibilidade de manutenção da consulta em sigilo é um componente importante para que as consultas passem a ser mais utilizadas, visto que em certas matérias, o tratamento confidencial é pré-condição para que o assunto seja levado à CVM em sede de consulta. Gonzalez pontuou, de um lado, que consultas como a em questão não podem ser mantidas indefinidamente em sigilo, em observância à Lei nº 12.527/2011, que estabelece a publicidade como preceito geral e o sigilo como exceção. De outro lado, o Diretor destacou a importância do sigilo no contexto de preparação das ofertas públicas, reconhecido pela regulamentação da CVM, nos termos do art. 4º-A da Instrução CVM 361 e da recente Deliberação CVM nº 809/2019.

Gonzalez pontuou, ainda, que o preceito geral de publicidade dos atos da administração estabelecido pela Lei nº 12.527/2011 não afastaria as regras de sigilo previstas nas legislações específicas, como, por exemplo, aquela prevista no artigo 157, § 5º da LSA, sob pena de torná-las letra morta.

Na mesma linha, o Diretor ressaltou que, dentre outras finalidades, o sigilo, nesses casos, busca evitar uma volatilidade excessiva do mercado em razão da possibilidade de lançamento de uma OPA. Registrou que essas ofertas usualmente envolvem um preço superior àquele praticado no mercado, de modo que o anúncio de uma OPA costuma ter um impacto bastante significativo na cotação das ações-objeto. Assim, na visão do Diretor, a divulgação imediata da resposta da CVM à consulta tornaria pública a possibilidade de a Enel formular uma OPA para cancelamento de registro, sem que, de fato, haja uma decisão concreta a esse respeito, e, por conseguinte, a informação geraria enorme especulação no mercado, sem cumprir a finalidade de informar os investidores.

Diante disso, Gustavo Gonzalez sugeriu a manutenção do tratamento confidencial à presente consulta pelo prazo de 6 (seis) meses, contados da data de decisão do Colegiado, ou até que seja publicado o fato relevante referente à OPA ou publicado o seu instrumento, a fim de que a Consulente possa tomar uma decisão quanto à viabilidade e conveniência de lançar uma OPA para cancelamento de registro da Eletropaulo e, findo esse prazo, que seja conferida publicidade tanto à consulta quanto à decisão do Colegiado, por meio da publicação do extrato da ata.

Ademais, na hipótese de o processo somente se tornar público após o decurso do prazo de seis meses, o Diretor propôs, em linha com o disposto no art. 4º-A, §4º, da Instrução CVM 361, que a Consulente, quando da divulgação da decisão da CVM, seja instada a (i) publicar o instrumento de OPA, nos termos do art. 11 da Instrução CVM 361 ou (ii) anunciar ao mercado, de maneira inequívoca, que não pretende realizar a OPA dentro do período de 6 (seis) meses – a fim de evitar a criação de uma volatilidade excessiva em razão da expectativa de lançamento de uma OPA. O Diretor Gustavo Gonzalez registrou, ainda, que, na hipótese de a informação escapar ao controle da Enel ou se houver oscilação atípica na cotação ou volume das ações de emissão da Eletropaulo, ela deverá observar o disposto no § 2º do art. 4º-A da Instrução CVM 361, bem como no parágrafo único do art. 6º da Instrução CVM nº 358/02.

No mérito, Gonzalez recapitulou os requisitos necessários à OPA para cancelamento de registro, a fim de examinar a possibilidade de compatibilização dos procedimentos adotados na OPA Concorrente Enel com aqueles exigidos para a referida OPA obrigatória. Em sua análise, o Diretor Gustavo Gonzalez considerou que (i) o preço da OPA Concorrente Enel atenderia ao requisito de “preço justo” determinado pela LSA, visto ter sido formado a partir de um processo amplamente competitivo para a aquisição do controle originário da Eletropaulo, envolvendo partes altamente sofisticadas; (ii) a Consulente se propôs a apresentar laudo de avaliação quando do lançamento da pretendida OPA para cancelamento de registro, em observância ao artigo 8º da Instrução 361; (iii) deveria ser conferida aos acionistas titulares de 10% das ações em circulação da Eletropaulo a prerrogativa de requerer a revisão do valor da oferta, nos termos do artigo 4º-A da LSA; e (iv) à ocasião da OPA Concorrente Enel, a Consulente não era acionista controladora da Companhia e, portanto, não se enquadrava no rol de legitimados para lançar uma OPA para cancelamento de registro, tendo como única alternativa viável a realização de uma OPA subsequente para então concluir pela viabilidade da compatibilização dos procedimentos.

Sendo possível compatibilizar os procedimentos em questão e tendo em vista as circunstâncias específicas do presente caso, notadamente (i) a concentração extraordinária das ações de emissão da Companhia decorrente do resultado da OPA Concorrente Enel; (ii) a baixa liquidez de tais ações; (iii) a ausência de interesse dos acionistas remanescentes em participar da vida social, haja vista a exígua participação nas assembleias e o não exercício do direito de preferência na subscrição de novas ações; e (iv) a depreciação significativa sofrida pelas ações desde a OPA Concorrente Enel, o Diretor Gustavo Gonzalez opinou pela possibilidade de adoção do procedimento diferenciado proposto, uma vez que, em seu entendimento, a ”proposta em questão atende não somente ao melhor interesse da Companhia – que se desonera dos excessivos custos de manutenção de uma companhia aberta com free float significativamente reduzido e pouco participativo – como confere aos acionistas remanescentes o recebimento de preço vantajoso pela aquisição de suas ações”, que seria 23,71% superior ao valor de cotação atual das ações de emissão da Eletropaulo.

Na mesma direção, o Diretor manifestou-se pela possibilidade de deliberação em assembleia sobre o resgate previsto no § 5º do art. 4º da LSA, uma vez finalizado o prazo da OPA para cancelamento de registro.

Gonzalez reconheceu que a utilização do quórum de adesão da OPA Concorrente Enel no cômputo do quórum de sucesso da OPA para cancelamento de registro, faria com que já se soubesse de antemão, mesmo antes da realização da segunda oferta, que a Companhia teria o seu capital fechado e que os acionistas teriam suas ações compulsoriamente resgatadas na forma do artigo 4º, § 5º da LSA e que tal ponto não teria passado despercebido pela área técnica.

Contudo, assinalou que os argumentos levantados pela SRE – que salientava, em suma, a possibilidade de os acionistas da Eletropaulo terem decidido manter-se na Companhia, listada no segmento do Novo Mercado da B3, acreditando na melhora de sua rentabilidade ao longo do tempo sob a gestão do novo controlador–, a seu ver, não representariam justificativas para negar o procedimento especial proposto na consulta por, ao menos, três razões: (i) a OPA Concorrente Enel resultou na concentração extraordinária das ações de emissão da Companhia pela Consulente, gerando um desenquadramento no percentual mínimo de ações em circulação determinado pelo Regulamento do Novo Mercado – o que, a rigor, inviabilizaria a manutenção da Companhia naquele segmento de listagem; (ii) os dados referentes à atual base acionária da Companhia não indicavam a existência de uma base ativa de acionistas que realmente permaneceram na Companhia por acreditar em sua valorização no longo prazo; e (iii) seria de fundamental importância o sopesamento dos interesses de todas as partes envolvidas, visto que quando presentes circunstâncias excepcionais que não justificam a manutenção do registro de companhia aberta e desde que sejam adotados procedimentos que garantam o cumprimento dos requisitos fundamentais para o cancelamento de registro, previstos na LSA e na Instrução CVM 361, o interesse da Companhia não deveria sucumbir aos interesses dos acionistas minoritários remanescentes.

Para Gonzalez, o ponto seria especialmente salutar nas situações em que as ações em circulação representassem uma parcela ínfima do capital social, ainda mais quando tal concentração decorresse de operações societárias legítimas e que não poderiam, por definição serem aglutinadas a uma OPA para cancelamento de registro.

Por fim, o Diretor destacou que a CVM não pode descuidar da proteção daqueles que investem no mercado brasileiro, mas que isso não significaria que os interesses legítimos dos demais participantes devam ser sempre sacrificados.

Após a manifestação de voto do Diretor Gustavo Gonzalez, a reunião foi suspensa por pedido de vista do Diretor Henrique Machado.

 

ESTA DECISÃO FOI TORNADA PÚBLICA EM 27.06.19, QUANDO NÃO MAIS SUBSISTIAM MOTIVOS QUE IMPEDISSEM SUA DIVULGAÇÃO.

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