Decisão do colegiado de 31/10/2017
Participantes
• MARCELO BARBOSA - PRESIDENTE
• GUSTAVO MACHADO GONZALEZ - DIRETOR
• GUSTAVO RABELO TAVARES BORBA - DIRETOR
• HENRIQUE BALDUINO MACHADO MOREIRA - DIRETOR
• PABLO WALDEMAR RENTERIA - DIRETOR
RECURSOS CONTRA ENTENDIMENTO DA SEP EM PROCESSOS DE RECLAMAÇÃO - MARIA LÚCIA BARBOSA LINS E OUTROS - PROC. SEI 19957.009579/2016-71
Reg. nº 0529/16Relator: SEP
A SEP relatou o assunto nos termos do art. 13-A da Deliberação CVM nº 558/2008.
Trata-se de recursos interpostos por Maria Lúcia Barbosa Lins e Rafael Lycurgo Leite, conselheiros de administração da Companhia Energética de Brasília (“CEB” ou “Companhia”), e Murici dos Santos, acionista minoritário da CEB (em conjunto, "Recorrentes"), contra o entendimento da Superintendência de Relações com Empresas - SEP manifestado nos Processos RJ2014/15038 e SP2015/0123, que trataram de Reclamações apresentadas pelos Recorrentes.
As Reclamações referem-se à condução de negócios sociais da CEB Distribuição S.A. ("CEB-D"), subsidiária integral da CEB, e abordam a aplicação do diferimento do reajuste tarifário, proposto em 2014 pela diretoria da CEB-D à Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, após negociação com o Governo do Distrito Federal (“GDF”), seu acionista controlador.
Ao analisar conjuntamente as Reclamações, que versavam sobre assuntos conexos e complementares, a SEP concluiu no seguinte sentido:
(i) em relação à competência para apreciação dos atos de gestão praticados na CEB-D, não merecia prosperar o entendimento defendido pelo acionista controlador e pelo então presidente do conselho de administração da CEB, de que não caberia a análise dessa matéria, respectivamente, na assembleia geral e no conselho de administração da Companhia; e
(ii) quanto ao diferimento tarifário, não foi possível concluir pela ocorrência de irregularidades na condução do seu processo, tendo em vista notadamente os efeitos financeiros que vieram a ser verificados.
Em sede de recurso e através de manifestações adicionais, os Recorrentes argumentaram que: (i) o Relatório da SEP não teria se manifestado quanto ao suposto abuso de poder de controle praticado pelo GDF, uma vez que este oficiou o Presidente da CEB-D em relação ao reajuste tarifário, interferindo diretamente na administração de uma subsidiária; (ii) a decisão quanto ao pedido do diferimento tarifário foi aprovada por administradores indicados pelo GDF, e portanto, em conflito de interesses; (iii) além disso, teria restado configurada hipótese de conflito de interesses do GDF, notadamente por ter aprovado as demonstrações financeiras e as contas dos administradores que conduziram o processo de reajuste no exercício de 2014, o que caracterizaria seu impedimento para deliberar em votação da proposta de ação de responsabilidade civil "contra os administradores e o próprio controlador" pelos supostos prejuízos causados à Companhia; e (iv) na análise dos mesmos fatos, o Tribunal de Contas do Distrito Federal (“TCDF”) teria concluído por irregularidades no diferimento tarifário.
Ao examinar o recurso, a SEP destacou inicialmente que o simples envio de ofício por um acionista controlador à administração da companhia não caracterizaria abuso de poder de controle. No caso concreto, realçou que tal correspondência estaria em linha com pedido apresentado pelo Conselho de Consumidores da CEB-D, e teria sugerido a criação de grupo de trabalho para identificar medidas necessárias à manutenção do equilíbrio financeiro da CEB, que vieram a ser implementadas de tal forma que não houve prejuízos ao fluxo de caixa da Companhia. Ademais, segundo a área técnica, a responsabilidade por analisar a proposta do GDF, no melhor interesse da Companhia, e eventualmente rejeitá-la ou propor contrapartidas, pertenceria aos administradores da CEB-D.
A SEP também entendeu que não caberia o argumento de que os administradores da CEB-D estariam conflitados por terem sido indicados pelo acionista controlador. Para a área técnica, os precedentes da CVM indicam que a regra de conflito de interesse, disposta no art. 156 da Lei nº 6.404/1976, incide quando são considerados interesses pessoais do administrador, e não interesses do acionista que o tenha eleito. Na mesma linha, a área técnica destacou que não ficou demonstrada a quebra de deveres fiduciários dos administradores previstos no art. 154 da Lei nº 6.404/1976, especialmente considerando o resultado financeiro do diferimento.
Quanto ao suposto conflito de interesses do GDF, a SEP ressaltou que a assembleia geral da CEB ocorrida em 23.03.2015 tinha na ordem do dia a deliberação acerca de proposição de ação de responsabilidade civil contra ex-membros da diretoria e membros do conselho de administração da Companhia, nos termos do art. 159 da Lei nº 6.404/1976, não cabendo o argumento recursal de que a proposta contemplava também o controlador. Nesse contexto, a área técnica manifestou o entendimento de que não se pode presumir a ocorrência de conflito de interesses do controlador ao votar sobre a propositura de ação de responsabilidade civil contra administrador apenas por tê-lo eleito, raciocínio que também se aplicaria às aprovações das demonstrações financeiras e das contas desses administradores.
Em relação à denúncia analisada pelo TCDF, a área técnica questionou o ponto central da conclusão do referido órgão, que se fundamentou no fato de os gestores da CEB terem solicitado o diferimento sem avaliar o impacto econômico-financeiro da medida. Na visão da SEP, embora fosse desejável tal estudo preliminar, no caso concreto, a sugestão e criação de grupo de trabalho, que atuou de forma célere e efetiva, prejudicaria a caracterização de falta de diligência dos administradores da CEB-D à época do pedido de diferimento. Na sequência, a SEP esclareceu que, após a apresentação das justificativas dos diretores da CEB-D, o TCDF concluiu que o efeito negativo do diferimento tarifário foi compensado pelo acordo que permitiu o parcelamento e o perdão dos juros e multas decorrentes da retenção indevida de ICMS e da Contribuição de Iluminação Pública – CIP, razão pela qual autorizou o arquivamento da referida denúncia.
Pelo exposto, a área técnica concluiu que não estariam presentes no caso concreto os elementos que justificariam eventual atuação sancionadora, tendo sugerido, em função disso, a manutenção do entendimento recorrido. Por fim, a SEP salientou que, nos termos da Deliberação CVM nº 457/2002 e em linha com precedentes da CVM, a Autarquia adotou modelo institucional em que prevalece a segregação entre as instâncias investigativas e julgadoras, de forma que o Colegiado não intervém nas atividades de investigação e acusação, conduzidas, de maneira independente, pelas superintendências da Autarquia.
O Colegiado, com base na manifestação da área técnica, consubstanciada no Relatório nº 144/2016-CVM/SEP/GEA-3, deliberou, por unanimidade, o não conhecimento dos recursos apresentados. Não obstante, o Colegiado manifestou especial preocupação com a transparência que deve ser conferida aos motivos e os potenciais impactos das decisões tomadas por administradores em sociedade de economia mista que possam ter sido orientadas por seus controladores a fim de atender objetivos de interesse público. Por um lado, destacou que tais decisões devem ser adequadamente motivadas e ponderadas com os demais interesses da companhia, bem como estar diretamente relacionadas ao interesse público que justificou a criação da empresa estatal, descrito ou inferível de seu estatuto ou da lei autorizativa. Por outro, em linha com o disposto no art. 153, da Lei nº 6.404/76, e no art. 8º, da Lei nº 13.303/16, asseverou que o dever de diligência a que se submetem tais administradores requer, inclusive, a definição clara dos recursos a serem empregados e dos impactos econômico-financeiros da consecução daqueles objetivos.
- Anexos
- Consulte a Ata da Reunião em que esta decisão foi proferida: