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Decisão do colegiado de 02/05/2018

Participantes

• MARCELO BARBOSA - PRESIDENTE
• GUSTAVO MACHADO GONZALEZ - DIRETOR*
• GUSTAVO RABELO TAVARES BORBA - DIRETOR
• HENRIQUE BALDUINO MACHADO MOREIRA - DIRETOR
• PABLO WALDEMAR RENTERIA - DIRETOR

* Por estar em São Paulo, participou por videoconferência.

 

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SRE - OPA POR ALIENAÇÃO DE CONTROLE DE CPFL ENERGIAS RENOVÁVEIS S.A. - STATE GRID BRAZIL POWER PARTICIPAÇÕES S.A. - PROC SEI 19957.001656/2017-25

Reg. nº 1000/18
Relator: SRE/GER-1

O Diretor Gustavo Gonzalez declarou-se impedido, tendo deixado a sala durante o exame do caso.

O Colegiado retomou a discussão do assunto iniciada na reunião de 27.03.2018.

Trata-se de recurso interposto por State Grid Brazil Power Participações S.A. (“Ofertante” ou “Recorrente”) contra decisão da Superintendência de Registro de Valores Mobiliários – SRE, no âmbito do pedido de registro de oferta pública de aquisição de ações por alienação indireta de controle de CPFL Energias Renováveis S.A. (“Companhia” ou “CPFL-R”).

A decisão recorrida, manifestada através do Ofício nº 41/2018/CVM/SRE/GER-1, afirmava que não havia sido possível realizar o teste de consistência do preço calculado por meio da Demonstração Justificada de Preço (“DJP”) – documento apresentado com vistas a justificar o preço atribuído à Companhia na alienação indireta de seu controle – com base no laudo de avaliação ("Laudo de Avaliação"), elaborado pelo Banco Fator S.A., bem como que o preço por ação resultante da Demonstração Justificada de Preço para CPFL Renováveis (R$ 12,20) não encontrava respaldo em nenhum dos preços encontrados com a aplicação de uma série de critérios objetivos e baseados em dados isentos, existentes à época da alienação de controle da Companhia (“Transação”), e sem qualquer necessidade de alteração que pudesse envolver juízo de valor. Desse modo, a SRE entendeu que o preço que garantiria ao acionista minoritário da Companhia tratamento igualitário àquele dispensado ao antigo controlador no âmbito da alienação de controle em questão seria, no mínimo, igual ao menor dos valores oriundos dos referidos critérios, que, no caso, referia-se aos preços-alvo divulgados em relatórios elaborados por analistas de mercado que avaliaram as duas companhias anteriormente à Transação (R$ 16,69).

Em seu recurso, a Ofertante trouxe os seguintes principais argumentos:

(i) os precedentes da CVM seriam claros no sentido de que, se houver um preço contratualmente estabelecido e uma demonstração justificada de preço, a CVM deveria limitar-se a confirmar a consistência interna do método empregado. Ambos os requisitos teriam sido devidamente preenchidos no caso em questão;

(ii) a SRE teria ignorado o preço contratualmente estabelecido, algo que só poderia ser feito, de acordo com os precedentes da CVM, se houvesse evidências concretas de comportamento fraudulento, o que não seria o caso, ou se o método de avaliação aplicado pela Ofertante fosse exótico ou incomum;

(iii) o método do EBITDA proporcional aplicado pela Ofertante seria um método de avaliação comum e válido que foi usado de forma consistente no cálculo do preço pago pela CPFL-R. Como tal, deve ser respeitado pela SRE;

(iv) a SRE solicitou à Ofertante que apresentasse laudo de avaliação para testar a consistência da DJP. O Laudo de Avaliação corroborou o preço fixado pela Ofertante, mas teria sido rejeitado pela SRE com base em opiniões subjetivas, sem demonstrar falhas técnicas no documento que pudessem justificar sua rejeição;

(v) a SRE teria então iniciado um exercício de avaliação irrestrito, escolhendo seus próprios métodos e pressupostos (que se assemelham a um exercício de tentar alocar o preço justo da CPFL-R – que não seria aplicável a ofertas públicas de aquisição como essa), sem ter demonstrado por que a DJP não seria adequada;

(vi) com esse comportamento, a SRE teria perdido de vista o fato de que o cálculo do preço da CPFL-R deve levar em conta o que a CPFL-R representa, proporcionalmente, no preço real que foi pago pela CPFL Energia S.A. (“CPFL Energia”). Em outras palavras, o cálculo de um preço autônomo, ideal ou justo, conforme a SRE realizou, não teria lugar no caso atual; e

(vii) a posição da SRE criaria instabilidade no mercado, violaria os precedentes relevantes e ignoraria o marco regulatório definido de forma diligente e deliberada pelo Colegiado da CVM ao longo dos anos.

Em sua análise, nos termos do Memorando nº 17/2018-CVM/SRE/GER-1, a SRE ratificou seu entendimento e propôs ao Colegiado a manutenção da determinação constante do Ofício nº 41/2018/CVM/SRE/GER-1, condicionando o registro da Oferta à reapresentação de sua documentação com a elevação do preço da OPA para no mínimo R$ 16,69 por ação, pelos seguintes motivos:

(i) é papel da CVM na análise dos pedidos de registro das OPA por alienação de controle indireta certificar que a demonstração justificada prevista pelo § 6º do art. 29 da Instrução CVM 361/2002 foi elaborada de forma razoável, garantindo que o preço atribuído à Companhia indiretamente alienada tem equivalência com o preço praticado no negócio de transferência de controle, seja ela de 80%, como estabelece a Lei nº 6.404/1976, ou de até 100%, como estabelece o Regulamento do Novo Mercado da B3;

(ii) a DJP não se utilizou de metodologia que contemplou diferenças fundamentais entre as Companhias, de modo que o resultado a que se chegou por meio do referido documento para o valor atribuído à CPFL-R no âmbito da alienação de controle de CPFL Energia não observa o requisito de tratamento igualitário previsto na regulamentação aplicável ao presente caso, considerando ainda que tal valor não pôde ser referendado por nenhuma das metodologias aplicadas pela área técnica na realização do teste de consistência;

(iii) o Laudo de Avaliação contém premissas que não são razoáveis, de modo que não foi possível realizar o teste de consistência do preço calculado por meio da DJP com base no referido laudo, ressaltando que essa conclusão foi devidamente embasada e dentro da competência da SRE, uma vez que o Laudo de Avaliação tinha a função de auxiliar a área técnica na realização do supramencionado teste de consistência, mas não se mostrou apto para tal; e

(iv) a área técnica atuou dentro da competência delegada à CVM ao realizar o teste de consistência da DJP, tendo se utilizado de critérios objetivos e baseados em dados isentos, existentes à época da Transação e sem qualquer necessidade de alteração que pudesse envolver juízo de valor, portanto suficientes para concluir, dentro de uma razoabilidade, que o preço da OPA deveria ser elevado para no mínimo o menor dentre aqueles encontrados com base em tais critérios, de forma a garantir ao acionista minoritário da Companhia tratamento igualitário àquele dispensado ao antigo controlador no âmbito da alienação de controle em questão.

O Presidente Marcelo Barbosa apresentou manifestação de voto na qual afirmou que a resolução da controvérsia requer o enfrentamento de questões complexas a respeito dos limites e possibilidades da atuação da CVM no âmbito do processo de registro de uma OPA por alienação indireta de controle, matéria examinada pelo Colegiado em poucas oportunidades. Além de questões que tocam a qualquer processo de registro de OPA por alienação indireta, há também questões específicas ao caso sob discussão, pertinentes a determinados aspectos da metodologia aplicada na DJP que foram questionados pela área técnica.

Primeiramente, observou não ser aceitável que se procure definir o preço da OPA de forma desvinculada do negócio original de compra e venda de controle, de modo que qualquer que seja a forma de demonstração da parcela do preço global de compra atribuída à controlada indireta, é necessário que sua razoabilidade possa ser demonstrável de forma consistente do ponto de vista técnico.

Assim, não haveria como se atribuir papel determinante à menção contratual do preço correspondente à CPFL-R. Este seria sem dúvida um elemento a ser considerado pela área técnica em seu trabalho de análise do processo de registro da OPA. Porém, tal análise deveria ser feita em conjunto com a DJP, a qual representa o principal elemento de formação da convicção da área técnica, sendo secundários tanto a menção em instrumento contratual quanto o laudo de avaliação.

A esse respeito, não seria a DJP apenas um requisito formal, devendo sua análise ter o grau de profundidade necessário para que a SRE possa decidir se o documento serve como justificativa razoável para o preço que a ofertante pretende apresentar na OPA. Por outro lado, qualquer consideração que vá além da verificação de sua existência e razoabilidade estaria além do escopo da tutela permitida à CVM, não cabendo à Autarquia se substituir ao ofertante na tarefa de determinação do valor, ou mesmo de uma faixa de valor, a ser utilizado na OPA por alienação indireta.

Porém, caberia também à Ofertante demonstrar na DJP que o preço oferecido aos minoritários da controlada guarda a devida relação com o valor pago pelas ações de emissão da controladora, assegurando-lhes a igualdade de tratamento legalmente exigida. Nesse tocante, observou o Presidente que a maneira mais objetiva de se realizar tal demonstração - e menos suscetível a contestações - seria através da utilização dos mesmos critérios de avaliação tanto para a controladora quanto para a controlada.

Em relação à metodologia utilizada pela Ofertante, entendeu o Presidente serem procedentes as críticas pontuais apresentadas pela SRE, não sendo possível se certificar, com base na DJP e nos termos em que foi apresentada, o atendimento ao requisito de tratamento igualitário exigido no caso em análise. Em termos práticos, opinou que a igualdade de tratamento só poderia ser assegurada no caso concreto se a DJP fosse ajustada a fim de incorporar alguma visão prospectiva da Companhia, podendo a Ofertante, se entendesse oportuno, apresentar novo laudo de avaliação que corroborasse seus ajustes. Ressaltou ainda que uma das maneiras de se desincumbir dos ajustes solicitados seria por meio da utilização de metodologia baseada em cotação das ações em mercado para calcular o preço-alvo da CPFL-R, de modo a refletir o método de avaliação empregado para CPFL Energia.

Sobre a função do laudo de avaliação, destacou o Presidente não se tratar de documento meramente informativo, servindo de base para auxiliar a CVM a determinar se o preço da oferta obedece ao disposto no art. 254-A, na hipótese de não ter logrado formar sua convicção apenas com base no exame da DJP. Nessa linha, seria de interesse do ofertante que o laudo a ser entregue à CVM fosse preparado de acordo com as melhores práticas e que sua fundamentação e conclusões se apresentassem de forma clara e em consonância com a boa técnica, já que caso a CVM entenda que o laudo não atende à finalidade para a qual foi solicitado (permitir a realização do teste de consistência), terá maior dificuldade de proceder em relação ao pedido de registro. Não obstante, não poderá a CVM determinar ao avaliador a tomada de nenhuma atitude com que este não esteja confortável, sendo a independência do avaliador regra que deve ser aplicada tanto em relação ao cliente quanto à CVM.

Especificamente quanto à análise do laudo feita pela SRE, o Presidente entendeu procedentes as inconsistências apontadas pela área técnica no que toca à forma de utilização dos parâmetros de perpetuidade e das taxas de impostos, bem como à escolha das “empresas comparáveis” feita pelo avaliador.

O Presidente resumiu seu entendimento nos seguintes princípios orientadores:

(i) o propósito da DJP (e do laudo de avaliação, quando solicitado) é permitir a comprovação de que o preço proposto pela ofertante aos acionistas minoritários da controlada pode ser justificado a partir dos cálculos ali apresentados;
(ii) ao analisar a DJP e o laudo de avaliação, a CVM deverá empregar o grau de profundidade que entender necessário para formar sua convicção sobre o conteúdo de tais documentos;
(iii) o tratamento igualitário se comprova via de regra e conforme precedente firmado no Caso Arcelor mediante a utilização da mesma metodologia para fins de avaliação da companhia controladora alienada diretamente e da companhia controlada alienada indiretamente. Em não sendo possível tal prática, deverá o ofertante valer-se de metodologia que guarde a necessária correspondência com os critérios utilizados para precificação da companhia controladora de forma a explicitar a igualdade de tratamento prevista no art. 254-A da Lei 6.404/76;
(iv) o laudo de avaliação previsto no art. 29 § 6º, II da ICVM 361/02 é documento preparado por solicitação da CVM para auxiliar na avaliação da DJP e sua elaboração deve resultar de um trabalho independente e técnico, sendo assegurado ao avaliador o direito de dar seu trabalho por encerrado mediante a entrega, não sendo obrigado a realizar ajustes com os quais não esteja de acordo; e
(v) ao mesmo tempo, a CVM terá plena liberdade para, caso considere que o laudo não atendeu à finalidade para a qual foi requerido, informar ao ofertante a respeito da situação, para que este possa decidir as medidas que pretende tomar com o objetivo de cumprir a exigência consistente na demonstração da forma de cálculo do preço correspondente à alienação indireta de controle.

Pelo exposto concluiu pelo provimento parcial do recurso de forma a:

(i) Reformar a decisão da SRE no que toca à determinação de um patamar de preço mínimo a ser praticado na OPA; e
(ii) Manter a determinação da SRE de que a DJP seja reapresentada com os seguintes ajustes, a saber: utilização de dados anuais de EBITDA em substituição a trimestrais de modo a evitar distorções decorrentes de efeitos sazonais e incorporação de visão prospectiva das companhias, a fim de refletir as diferenças em suas expectativas de crescimento.

Por fim recomendou que nos casos de pedidos de registro de OPA por alienação de controle concomitantes tanto para a companhia alienada diretamente quanto para aquela cujo controle se transfere indiretamente, o deferimento do registro também ocorresse em conjunto e no mesmo momento. Assim, seria possível evitar situações como a presente, em que apenas uma das etapas foi concluída e o não prosseguimento do rito com a reversão ao status quo anterior, se necessário, mostrar-se-á demasiado gravoso para o mercado e as partes envolvidas.

Os demais membros do Colegiado acompanharam a manifestação do Presidente.  

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