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Decisão do colegiado de 10/07/2018

Participantes

• MARCELO BARBOSA – PRESIDENTE
• GUSTAVO MACHADO GONZALEZ – DIRETOR*
• GUSTAVO RABELO TAVARES BORBA – DIRETOR
• HENRIQUE BALDUINO MACHADO MOREIRA - DIRETOR
• PABLO WALDEMAR RENTERIA - DIRETOR

* Por estar em São Paulo, participou por videoconferência.

ANÁLISE DA PROPOSTA DE DESTINAÇÃO DO LUCRO LÍQUIDO – MINASMÁQUINAS S.A. – PROC. SEI 19957.000881/2017-44

Reg. nº 0704/17
Relator: DGB

Trata-se da continuação da discussão iniciada pelo Colegiado em 03.04.18 a respeito do processo instaurado pela Superintendência de Relações com Empresas - SEP para apreciar a proposta da administração de destinação do lucro líquido apurado no exercício social de 2016 da Minasmáquinas S.A. (“Minasmáquinas” ou “Companhia”). Na ocasião, o Diretor Relator Gustavo Borba proferiu seu voto, cujos fundamentos encontram-se resumidas no extrato da ata daquela reunião.

Retomada a discussão após o pedido de vista do Diretor Pablo Renteria, este Diretor apresentou manifestação de voto divergindo do Relator, tendo concluído que seria ilegal a deliberação aprovada na assembleia geral da Minasmáquinas que aprovou o aumento de capital por meio da destinação de parte do lucro líquido apurado no exercício de 2016.

Inicialmente, o Diretor Pablo Renteria destacou que a questão envolvia a análise de aparente antinomia existente entre, de um lado, (i) o art. 169 da Lei 6.404/76 (“Lei das S.A.”), que permite a capitalização tanto de reservas quanto de lucros, o que embasaria juridicamente a destinação de lucro líquido do exercício ao aumento de capital, e, de outro, (ii) os arts. 192 e 202, § 6º da Lei 6.404/76, que militariam em sentido oposto.

A este respeito, Pablo Renteria salientou que, a partir da leitura do art. 192, depreende-se que a proposta da administração não pode prever outra destinação ao lucro líquido do exercício além daquelas previstas de forma expressa nos artigos 193 a 203 da Lei 6.404/76, entre as quais não se insere a capitalização. Além disso, ressaltou que a redação contida no art. 202, § 6º da Lei 6.404/76, incluída pela Lei nº 10.303/01, prevê que todo lucro líquido que não seja destinado na forma prevista nos artigos 193 a 197 deve, necessariamente, ser distribuído aos acionistas na forma de dividendos, orientação que já se encontrava presente na redação original da Lei das S.A., assim como era adotada pela CVM por meio da Nota Explicativa nº 59/86, nos seguintes termos: “a parcela do lucro remanescente, após as destinações para as reservas de lucros e o pagamento de dividendo obrigatório, também deverá ser destinada. Neste caso, as destinações cabíveis seriam a título de retenção de lucros, devidamente justificada por orçamento de capital ou para pagamento de dividendos complementares ao mínimo obrigatório.”.

Na visão do Diretor, o § 6º do art. 202, que procurou proteger o direito essencial dos minoritários à participação nos lucros sociais (art. 109, I) frente ao arbítrio da administração e da maioria, consolidou o que se pode chamar de “numerus clausus da destinação do lucro líquido do exercício, que somente pode ser retido pela companhia por uma das formas autorizadas pelo legislador nos artigos 193 a 197, ou bem distribuído aos acionistas como dividendo”, não se admitindo, portanto, a possibilidade de capitalização.

Isto posto, e observando que (i) o § 6º do art. 202, por ter sido incluído pela reforma legislativa de 2001, revoga as disposições anteriores da Lei das S.A. que forem com ele incompatíveis, e (ii) os artigos 192 e 202, § 6º possuem âmbito de aplicação mais específico do que o disposto no art. 169, Pablo Renteria entendeu que há a possibilidade de conciliar, sistematicamente, os diferentes preceitos normativos. Nesse sentido, o Diretor concluiu que: “De um lado, o disposto no art. 169 autoriza a capitalização das reservas previstas ou autorizadas por lei (art. 193 a 195) e, ainda, dos lucros de exercícios pretéritos que foram retidos por deliberação da assembleia geral, na forma prevista no art. 196. De outro, em virtude do preceituado nos artigos 192 e 202, § 6º, resta vedada a destinação do lucro líquido do exercício (precedente) ao aumento do capital social”.

Em seguida, evidenciou que a Lei das S.A., em reação aos abusos verificados no passado em decorrência da manutenção de “lucros suspensos”, estabeleceu um regime rigoroso de destinação dos lucros líquidos, que exige, para cada modalidade de retenção não obrigatória, fundamentação técnica, bem como a observância estrita da finalidade estabelecida no respectivo dispositivo legal de regência. Nessa linha, indicou que (i) as reservas legais facultativas, constantes nos arts. 195, 197 e 202, § 5º somente podem ser empregadas nas condições previstas na Lei, de forma que sua criação, em sede assemblear, é plenamente vinculada aos pressupostos legais, (ii) as reservas estatutárias, nos termos do art. 194, necessitam de definição precisa e completa, no estatuto, da sua finalidade, dos critérios de determinação da parcela anual do lucro líquido que lhes será destinada e do limite máximo de cada uma delas, e (iii) a retenção de lucros prevista no art. 196 só é admitida caso esteja amparada em justificativa dos órgãos de administração e orçamento de capital previamente aprovado.

Por fim, o Diretor ressaltou que a possibilidade de capitalização do lucro líquido do exercício iria de encontro aos objetivos da Lei das S.A., ao enfraquecer a proteção legal do direito do acionista de receber dividendos, pois que, diferentemente da retenção legal de lucros, aquela não requer justificativa específica nem vincula os recursos retidos à perseguição de determinado objetivo. Destacou, ademais, que a interpretação proposta não inviabiliza a capitalização dos lucros, desde que seja limitado aos lucros previamente destinados a reservas ou retidos por decisão assemblear, bem como não impede que as companhias possam agir em eventuais dificuldades financeiras ou financiar suas atividades com seu próprio capital, já que a Lei das S.A. apresenta uma série de mecanismos legais para tanto.

Após a manifestação de voto do Diretor Pablo Renteria, o Diretor Henrique Machado solicitou vista do processo.

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