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Decisão do colegiado de 27/12/2018

Participantes

·       MARCELO BARBOSA – PRESIDENTE

·       CARLOS ALBERTO REBELLO SOBRINHO – DIRETOR

·       GUSTAVO MACHADO GONZALEZ – DIRETOR*

·       PABLO WALDEMAR RENTERIA – DIRETOR

* Por estar em São Paulo, participou por videoconferência.

 

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SEP – PEDIDO DE DISPENSA DE DIVULGAÇÃO DE OPERAÇÕES ROTINEIRAS DE GESTÃO DE CAIXA E TESOURARIA REALIZADAS COM PARTES RELACIONADAS - ART. 30, XXXIII, DA INSTRUÇÃO CVM 480/09 - PETRÓLEO BRASILEIRO S.A. – PETROBRAS – PROC. SEI 19957.003597/2018-19

Reg. nº 1018/16
Relator: DPR

Trata-se de recurso interposto por Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobras (“Companhia” ou “Recorrente”) em face da decisão da Superintendência de Relações com Empresas – SEP que não concedeu a dispensa requerida pela Companhia de divulgação, na forma prevista no art. 30, XXXIII, da Instrução CVM nº 480/09, de operações rotineiras de gestão de caixa e tesouraria realizadas com partes relacionadas.


Em 14.07.17, a Companhia encaminhou consulta à SEP com finalidade de confirmar seu entendimento sobre “a desnecessidade de comunicação à CVM, em até 7 (sete) dias úteis, das operações de caixa e tesouraria realizadas entre partes relacionadas, tal como prevista no Anexo 30-XXXIII da Instrução CVM nº 480/09, mesmo quando tais operações superam o valor de R$50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais).”.


A SEP, por meio do Relatório nº 155/2017-CVM/SEP/GEA-1, destacou que, embora o benefício da referida informação ao usuário seja questionável, não caberia à área técnica conceder a dispensa pleiteada, por ausência de previsão legal para tanto.


Em 02.04.18, a Companhia apresentou recurso, tendo reiterado o pedido de dispensa pelas seguintes razões: (i) ”ausência do enquadramento de determinadas operações de gestão de caixa e tesouraria, de natureza ordinária e cotidiana - tais como operações de câmbio, movimentações para liquidez de caixa, aplicações e resgates - ao conceito de relevância”; (ii) “dimensão e porte da Companhia, que implica o envolvimento frequente de valores superiores ao previsto no referido Anexo 30-XXXIII em tais operações, gerando custos de observância regulatórios desnecessários à Companhia”; e (iii) “ausência de benefício na divulgação de tantos comunicados, sem qualquer filtro de materialidade e relevância, ocasionando o decréscimo da qualidade da decisão em razão do excesso de informações”.


A SEP analisou o recurso por meio do Relatório nº 76/2018-CVM/SEP/GEA-1, tendo concluído que, embora os argumentos trazidos pela Recorrente sejam pertinentes, a área técnica não teria competência para dispensar a Companhia do cumprimento do referido requisito normativo. Não obstante, a área técnica manifestou o entendimento de que os limites estabelecidos pelo Anexo XXXIII (R$50.000.000,00 ou 1% do ativo total do emissor, sendo o menor dentre eles) precisariam ser reavaliados pela CVM, uma vez que, no caso de companhias abertas de grande porte que possuem ativo total superior a 5.000.000.000,00 (cinco bilhões de reais), como é o caso da Petrobras e mais de cem companhias abertas, a exigência de divulgar qualquer operação entre partes relacionadas com valor superior a R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais) se revela bastante onerosa, sendo, ainda, tal montante, significativamente inferior a 1% do ativo total.


Em seu voto, o Diretor Relator Pablo Renteria esclareceu inicialmente que o recurso foi conhecido, ainda que intempestivo, tendo em vista a relevância do tema – que atinge não somente a Recorrente, mas também outras companhias abertas em situação similar – e a continuidade dos efeitos que o cumprimento da norma vem produzindo, o que justificaria um pronunciamento do Colegiado.


Em relação ao mérito, o Relator destacou que o objetivo da norma em tela, conforme explicitado no Edital de Audiência Pública SDM Nº 03/13 e no respectivo Relatório de Audiência Pública, é viabilizar o tempestivo monitoramento das operações entre partes relacionadas, permitindo a rápida reação do mercado e facilitando a supervisão da CVM. Nessa linha, a despeito de o dispositivo não estabelecer exceção, o Relator, considerando a finalidade da norma, entendeu que a exigência de divulgação das operações ordinárias de gestão de caixa e tesouraria – tais como contas a pagar, contas a receber, depósitos judiciais, contratos de câmbio, movimentações para liquidez de caixa, aplicações e resgates – pouco contribui para o seu atingimento. Ademais, na visão do Diretor, a exigência normativa iria na contramão dos objetivos pretendidos pela CVM, uma vez que dissemina no mercado informações de importância incerta, que concorrem com outras efetivamente relevantes, que deveriam receber a atenção dos investidores e do próprio órgão regulador.


Além disso, o Diretor Pablo Renteria ressaltou os custos de observância que são desnecessariamente incorridos pelas companhias abertas na divulgação de operações dessa natureza, conforme demonstrado pela Recorrente. Para o Relator, a imposição de uma norma apenas se justifica na medida em que gera benefícios superiores aos custos incorridos no seu cumprimento, o que não se verificaria no caso em análise, haja vista a ausência de efeitos positivos provenientes da comunicação ao mercado de operações ordinárias de gestão de caixa e tesouraria, que, contudo, exigem das companhias abertas o dispêndio de recursos que poderiam ser alocados na condução de atividades mais relevantes para seus objetivos. Nessa direção, fez referência a um dos princípios contábeis dispostos no CPC 00, o qual reforça a importância de que os “custos sejam justificados pelos benefícios gerados pela divulgação da informação".


Considerando que a questão mereceria reflexões adicionais, votou pelo encaminhamento do processo à Superintendência de Desenvolvimento de Mercado – SDM, para que conduza estudos sobre o tema no âmbito do Projeto Estratégico de Redução de Custos de Observância. A esse respeito, o Relator indicou possível solução regulatória para a questão, no sentido de que, “ao invés da alteração dos valores estabelecidos no art. 1º, I, do Anexo 30-XXXIII, seria mais recomendado reconhecer a especificidade das referidas operações de gestão de caixa e tesouraria e dispensar a sua comunicação ao mercado”.


No caso concreto, levando em conta as evidências acerca dos efeitos prejudiciais que o cumprimento da norma vigente pode acarretar não só para as companhias abertas, mas também para os investidores e o mercado em geral, o Relator votou pelo provimento do recurso, de modo que a Companhia seja dispensada da comunicação ao mercado de operações ordinárias e recorrentes de gestão de caixa e tesouraria, na forma prevista no Anexo 30-XXXIII da Instrução CVM nº 480/09, desde que, quando pertinente, sejam realizadas dentro do intervalo das tabelas tarifárias divulgadas pelas instituições financeiras contratadas. Na mesma linha, salientando que outras companhias também podem estar enfrentando os efeitos nocivos decorrentes do cumprimento da regra, o Diretor sugeriu que a mesma dispensa seja estendida a todos os emissores registrados na categoria A.


Por fim, o Relator ressalvou que a referida dispensa: (i) não se aplica a operações de gestão de caixa e tesouraria extraordinários, isto é, que não sejam realizadas pelo emissor de modo recorrente no curso normal dos negócios, nem aquelas que sejam estipuladas fora das condições usuais de mercado; (ii) não interfere na divulgação de operações entre partes relacionadas no formulário de referência e nas demonstrações financeiras, na forma prevista na regulamentação específica aplicável; e (iii) não exime administradores e acionistas controladores do fiel cumprimento, em qualquer negócio com parte relacionada, dos deveres estabelecidos na Lei das S.A., notadamente daqueles previstos no art. 116, parágrafo único, 153, 154, 155, 156 e 246.


O Colegiado, por unanimidade, acompanhando o voto do Relator, deliberou pelo provimento do recurso, de modo que a Companhia seja dispensada da comunicação ao mercado de operações ordinárias e recorrentes de gestão de caixa e tesouraria, na forma prevista no Anexo 30-XXXIII da Instrução CVM nº 480/09, desde que, quando pertinente, realizadas dentro do intervalo das tabelas tarifárias divulgadas pelas instituições financeiras contratadas. Da mesma forma, o Colegiado estendeu a dispensa ora concedida a todos os emissores registrados na categoria A, e determinou o encaminhamento do processo à SDM para que conduza estudos a fim de verificar a melhor solução regulatória para a questão em tela.


O Diretor Gustavo Gonzalez apresentou manifestação de voto acompanhando o posicionamento do Diretor Relator, mas tecendo comentários adicionais acerca do tema. Para Gonzalez, independentemente da dispensa pleiteada, os serviços financeiros contratados por companhia aberta junto a uma parte relacionada devem, para fins do Anexo 30-XXXIII, ser mensurados com base no valor da contraprestação paga pelo serviço prestado e não o valor total da operação financeira. O Diretor defendeu sua posição a partir de uma interpretação teleológica do dispositivo, considerando que o objetivo do referido comunicado é assegurar a rápida prestação de informações relativas ao processo de negociação e aprovação de determinadas transações com partes relacionadas para que se possa verificar a comutatividade da transação.


Não obstante, o Diretor Gustavo Gonzalez entende que a solução baseada unicamente na interpretação teleológica tem limitações importantes, decorrentes do fato de que as operações de gestão de caixa e de tesouraria podem envolver transações diversas, cada uma com suas particularidades. Ademais, Gonzalez entende que o comunicado de transações com partes relacionadas não foi pensado para divulgar operações corriqueiras de gestão de caixa ou de tesouraria, fazendo referência à regra norte-americana que declaradamente inspirou o Anexo 30-XXXIII e que possui dispositivos específicos, por exemplo, para lidar com empréstimos contraídos junto a bancos ou outras instituições, desde que no curso ordinário dos negócios e em condições de mercado.


Por fim, o Diretor Gustavo Gonzalez sugeriu que a eventual revisão das regras do Anexo 30-XXXIII inclua também as regras referentes à divulgação de operações correlatas, de modo que esse conceito contribua para divulgações mais eficazes.

 

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