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ATA DA REUNIÃO EXTRAORDINÁRIA DO COLEGIADO DE 18.04.2022

Participantes

• MARCELO BARBOSA – PRESIDENTE
• FLÁVIA MARTINS SANT’ANNA PERLINGEIRO – DIRETORA
• ALEXANDRE COSTA RANGEL – DIRETOR
• OTTO EDUARDO FONSECA DE ALBUQUERQUE LOBO – DIRETOR

Reunião realizada eletronicamente.

 

Outras Informações

Ata divulgada no site em 19.04.2022.

PEDIDO DE INTERRUPÇÃO DO CURSO DO PRAZO DE ANTECEDÊNCIA DE CONVOCAÇÃO DE ASSEMBLEIA GERAL ORDINÁRIA DA GAFISA S.A. – PROC. SEI 19957.003175/2022-11

Reg. nº 2569/22
Relator: SEP

Trata-se de pedido apresentado por Esh Theta Fundo de Investimento Multimercado (“Requerente”), acionista da Gafisa S.A. (“Gafisa” ou “Companhia”), de interrupção do curso do prazo de convocação da assembleia geral ordinária da Companhia convocada em 28.03.2022 e prevista para realizar-se em 20.04.2022 (“AGO”), com base no art. 3º da Instrução CVM nº 372/03 c/c art. 124, § 5º, II, da Lei 6.404/76.

De acordo com o edital de convocação divulgado em 28.03.2022, a AGO tem como pauta os seguintes itens: (i) aprovar as contas dos administradores, examinar, discutir e votar as demonstrações financeiras do exercício social findo em 31.12.2021; (ii) deliberar sobre a destinação do resultado do exercício; (iii) rerratificar a remuneração global dos administradores para o exercício de 2021; e (iv) fixar a remuneração global dos administradores para o exercício de 2022.

Em seu pedido de Interrupção, o Requerente alegou, de forma geral, as seguintes supostas ilegalidades em relação aos procedimentos e matérias a serem apreciadas na AGO: (i) exigência de apresentação de comprovante de vacinação contra a Covid-19 contemplando a completa imunização, para o comparecimento presencial no conclave; e (ii) proposta de eleição em separado de que trata o art. 161, § 4º, alínea a, da Lei nº 6.404/76, prevista no boletim de voto à distância (“BVD”) divulgado pela Companhia.

No que se refere ao primeiro ponto, o Requerente afirma que a obrigatoriedade de apresentação da caderneta de vacinação teria o intuito de dificultar a participação dos acionistas na assembleia, eventualmente criando embaraços à participação de determinados acionistas e o exercício da atividade de fiscalização. Isto porque a legislação municipal que trata do tema – Decreto Municipal nº 61.125/2022 – descreve como obrigatória a apresentação do referido documento somente em estabelecimentos e serviços pertencentes ao setor de eventos, tais como shows, feiras, congressos e jogos, com público superior a 500 pessoas.

Quanto ao segundo questionamento, a Companhia divulgou, em 31.03.2022, seu BVD, que previu, em seu item 9: “Caso um dos candidatos que compõem a chapa deixe de integrá-la para acomodar a eleição em separado de que trata os arts. 161, § 4º, e 240 da Lei nº 6.404, de 1976, os votos correspondentes às suas ações podem continuar sendo conferidos à chapa escolhida?

Nesse contexto, o Requerente afirma que (i) a estrutura societária atual da Gafisa, descrita como “empresa sem acionista controlador”, não permitiria a correta aplicação do dispositivo legal acima destacado, que prevê a eleição em separado de membros do conselho fiscal, haja vista que a norma destacada atribui ao “acionista minoritário” detentor de 10% ou mais de ações com direito a voto a prerrogativa de eleger, em votação em separado, um membro titular e suplente do conselho fiscal, e, portanto, a ausência de um acionista controlador definido e, por contraposição, de acionistas minoritários, não tornaria possível a correta aplicação da referida norma; (ii) por outro lado, pontua que, embora sem um controlador definido – conforme conceito descrito no art. 116 da Lei nº 6.404/76 – as decisões assembleares seriam controladas, em conjunto, por veículos de investimento detidos pelo Sr. N.S.R.T. Assim, defende que a correta interpretação do termo “acionista minoritário” seria a do “acionista vencido” na composição do conselho fiscal, ou seja, aqueles acionistas que não conseguiram eleger, por voto da maioria, um membro titular e suplente para o referido órgão societário.

Instada a se manifestar através do Ofício nº 67/2022/CVM/SEP/GEA-3, a Companhia afirmou, em essência, que:

(i) o pedido de interrupção não deve ser conhecido, pois o mecanismo previsto no art. 3º da Instrução CVM nº 372/03 e no art. 124, §5º, II, da Lei 6.404/76 se referem exclusivamente às assembleias gerais extraordinárias, o que não seria o caso em questão;

(ii) o comprovante de vacinação se encontra legalmente previsto no Decreto nº 60.488/21 – citado erroneamente pelo Requerente como Decreto nº 61.125/21 –, que prevê, em seu art. 3º, a recomendação a todos os estabelecimentos localizados no Município de São Paulo que solicitem, para acesso das pessoas às suas dependências, comprovante de vacinação contra COVID-19;

(iii) reconhece que, de fato, não há acionista ou grupo de acionistas que detém mais de 50% das ações da Gafisa, sendo que todos os seus administradores foram indicados por administrações anteriores, não havendo, assim, acionista indicando administradores em assembleia (ambos os pontos seriam condicionantes para a aplicação da alínea “a” do art. 116 da Lei das S.A.);

(iv) não houve acionista ou grupo de acionistas prevalecendo em quaisquer deliberações assembleares da Gafisa, tendo inclusive parte dos acionistas administrados pelos fundos citados pelo Requerente (Planner e MAM Asset) se abstendo na última assembleia que reelegeu o atual conselho de administração; e

(v) a redação do item “9” do BVD é uma inclusão automática feita pelo sistema da B3 S.A. que é utilizado para gerar o boletim e aparece em todas as deliberações que contenham eleição de conselho fiscal por chapa, não sendo permitido o ajuste para que esta deliberação não conste do referido documento.

Em análise contida no Parecer Técnico nº 41/2022-CVM/SEP/GEA-3, a SEP destacou, de iníco, que a previsão legal para o pedido formulado, constante do inciso II do § 5º do art. 124, cuida exclusivamente das solicitações de interrupção do curso do prazo de convocação de assembleia geral extraordinária (“AGE”) por até 15 (quinze) dias, a fim de que a CVM conheça e analise as propostas a serem submetidas à assembleia. Já no presente caso, o edital de convocação e a proposta da administração divulgadas cuidam de matérias exclusivas de deliberação em sede de AGO, consoante o disposto no art. 132 da Lei nº 6.404/76.

Portanto, em razão da natureza das deliberações assembleares a serem tratadas na AGO de 20.04.2022, não há previsão legal para pedidos de interrupção do prazo de convocação, cabendo somente pedido de aumento, para 30 (trinta) dias, de prazo de antecedência de convocação desta assembleia geral, nos termos do § 5º, inciso I, do mencionado art. 124.

Com relação ao escopo e à natureza do pedido, a SEP pontuou que sua análise deve se ater a eventuais ilegalidades e deficiências informacionais afetas aos temas a serem deliberados. Não seria possível, contudo, correlacionar os temas propostos para a AGO com as supostas ilegalidades associadas ao pedido.

Além disso, na visão da área técnica, a questão suscitada pelo Requerente acerca do correto entendimento da CVM sobre a aplicação do art. 161, § 4º, alínea a, da Lei Societária não deve ser analisada no âmbito de um processo de rito sumário como um pedido de interrupção, somando-se a isso o fato de que o Requerente apresentou ilações a respeito de suposto controle exercido por um grupo de investidores, sem, todavia, apresentar documentação comprobatória de tais alegações.

Assim, passando à análise das supostas ilegalidades das propostas apresentadas para a AGO, a SEP concluiu que:

(i) O Decreto nº 60.488, publicado pela Prefeitura Municipal de São Paulo em 27.08.2021, prevê, em seu art. 3º, recomendação para que todos os estabelecimentos no referido Município solicitem, para acesso das pessoas às suas dependências, comprovante de vacinação contra COVID-19. Assim sendo, não causaria estranheza a solicitação de comprovante vacinal para a participação na AGO. Todavia, consta da proposta de administração uma exigência (e não uma solicitação), o que não parece razoável. Isto posto, caso algum acionista não apresente o comprovante vacinal, a SEP entende que não pode este fato ser motivo para que a companhia o impeça de participar da assembleia.

(ii) Com relação à eleição em separado de membros do conselho fiscal prevista no BVD, a SEP ressaltou, em linha com o alegado pela Companhia, que, de fato, a inclusão da questão sobre eleição em separado no BVD acontece de forma automática pelo Cicorp (sistema onde são elaborados e encaminhados os BVD), quando é incluída questão sobre a eleição de membros do conselho fiscal.

Ademais, com relação ao questionamento do Requerente quanto ao correto entendimento sobre o conceito de acionista minoritário, uma vez que configurada sua presença, abriria a possibilidade da eleição em separado de que trata o art. 161, §4º, a, da Lei 6.404/76, a SEP ressaltou que o Requerente não enviou documentos que comprovem suas afirmações de que alguns acionistas exercem, nas assembleias, o controle "de fato" da Companhia, e que o procedimento ao qual se submete um pedido de interrupção de assembleia não se coaduna com as diligências que seriam necessárias para que a SEP pudesse chegar a esta conclusão.

De todo modo, a área técnica discordou da tese apresentada pelo Requerente no sentido de que poderia haver uma eleição em separado de acionistas ordinaristas minoritários, mesmo sem que se configurasse a existência de um acionista controlador. Embora realmente não haja na Lei das Sociedades Anônimas uma definição clara de acionista minoritário, ao contrário da definição de acionista controlador, que se encontra do art. 116, a SEP entende que a Lei não identifica acionista minoritário como aqueles que, nas palavras do Requerente, "são contrapostos à maioria e não ao acionista controlador", até por que, se essa fosse a melhor interpretação para o que a Lei chama de acionista minoritário no caso de companhias sem controle definido, “em cada deliberação se formaria um novo grupo identificado como "minoritários", já que a oposição à maioria poderia recair sobre qualquer acionista, dependendo de seu voto em determinada deliberação.”

Assim, no entedimento da SEP não há, com base nas informações atualmente disponíveis, ilegalidade ou irregularidade na não ocorrência de eleição em separado para o conselho fiscal objeto desta análise.

O Colegiado registrou que, embora concorde com a conclusão da SEP quanto à inépcia do pedido de interrupção do curso do prazo de convocação da AGO, por manifesta ausência de previsão legal, alguns aspectos da fundamentação adotada pela área técnica mereceriam ressalvas.

Em primeiro lugar, o Colegiado ressaltou que não cabe à CVM avaliar a legalidade da exigência de comprovante vacinal estabelecida pela Companhia como requisito para admissão ao local da realização da assembleia em questão, à luz da legislação e regulamentação aplicáveis editadas pelas autoridades competentes. Na restrita e sumária análise feita em sede de apreciação de pedido de interrupção, compete à Autarquia avaliar, somente, se a deliberação proposta aos acionistas viola dispositivos legais ou regulamentares, conforme o art. 124, §5°, II, da Lei nº 6.404/76. Assim, a legalidade da exigência de comprovante vacinal, por não ser objeto de deliberação, mas apenas requisito de admissão e participação na assembleia é, antes de tudo, questão alheia ao escopo delimitado pelo citado dispositivo. Além disso, a competência para estabelecer restrições para a admissão em recintos com base em razões de natureza sanitária é do poder executivo da localidade. O Colegiado destacou, porém, que a criação deliberada de mecanismos visando impedir ou dificultar o exercício do direito de voto pelos acionistas pode configurar conduta abusiva, sujeita a apuração pela CVM em sede de processo administrativo sancionador.

Em segundo lugar, quanto à conclusão da SEP de que a eleição em separado para membros do conselho fiscal apenas seria cabível em companhias com controlador definido, o Colegiado entende que se trata de tema que demanda exame mais aprofundado, incompatível com o rito sumário do pedido de interrupção. Neste sentido, deve-se considerar na discussão do tema que a eleição de membro do conselho fiscal é mecanismo que permite o exercício do direito essencial dos acionistas à fiscalização da gestão dos negócios, previsto no artigo 109, III, da Lei nº 6.404/76. Além disso, a lei societária, embora não preveja com clareza, tampouco afasta de forma absoluta a possibilidade de adoção do voto em separado para a eleição de membro do conselho fiscal em companhias sem controlador definido. É possível, portanto, que haja cenários em que a dispersão das ações da companhia somada ao comportamento de alguns dos acionistas leve à conclusão da aplicabilidade do voto em separado mesmo que não seja possível identificar um controlador ou grupo de controle. Entretanto, de todo modo, no caso sob análise, o Requerente não logrou demonstrar, com amparo em fatos devidamente comprovados, suas alegações quanto à existência de relação entre determinados acionistas.

Assim, o Colegiado, por unanimidade, acompanhando a conclusão da área técnica, deliberou pelo não conhecimento do pedido de interrupção do curso do prazo de convocação da AGO.

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