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ATA DA REUNIÃO DO COLEGIADO Nº 16 DE 10.05.2022

Participantes

• MARCELO BARBOSA – PRESIDENTE
• FLÁVIA MARTINS SANT'ANNA PERLINGEIRO – DIRETORA
• ALEXANDRE COSTA RANGEL – DIRETOR
• OTTO EDUARDO FONSECA DE ALBUQUERQUE LOBO – DIRETOR

Outras Informações

Foram sorteados os seguintes processos:

 

 

PAS

Reg. 2576/22 - 19957.009335/2021-55 - DFP

Reg. 2577/22 - 19957.004989/2021-92 - DAR

 

 

 

Ata publicada no site em 08.06.2022,exceto decisão referente ao Proc. SEI 19957.001764/2018-89 (Reg. 2578/22) divulgada no site em 27.05.2022.

 

APRECIAÇÃO DE PROPOSTA DE TERMO DE COMPROMISSO – PROC. SEI 19957.005385/2020-82

Reg. nº 2575/22
Relator: SGE

Trata-se de proposta de termo de compromisso apresentada por Leandro Attie Testa (“Proponente”), na qualidade de investidor, previamente à instauração de Processo Administrativo Sancionador pela Superintendência de Relações com o Mercado e Intermediários – SMI, no qual não há outros investigados.

Segundo apurado pela SMI, o Proponente teria incorrido em suposta prática de front running, por meio da realização de operações com contratos futuros de boi gordo, entre 09.01.2020 e 18.08.2020, tendo conhecimento, como diretor da área de Originação da JBS S.A. ("Companhia"), das necessidades de hedge e da atuação da mesa de operações da Companhia, em infração, em tese, ao item I da Instrução CVM nº 08/1979, conforme o definido no item II, “d”, da referida Instrução.

No curso das investigações, o Proponente apresentou proposta para celebração de termo de compromisso, em que se obrigou, em síntese, a:

(i) pagar à Companhia o montante de R$ 1.033.279,50 (um milhão trinta e três mil duzentos e setenta e nove reais e cinquenta centavos), atualizado monetariamente pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA, a partir das datas das respectivas operações que deram origem ao lucro do Proponente, a título de indenização pelos danos que, teoricamente, teriam resultado das referidas operações;

(ii) pagar à CVM o montante correspondente a 50% (cinquenta por cento) da quantia acima referida, a título de reparação pelos danos difusos oriundos da conduta analisada; e

(iii) abster-se de operar com derivativos em mercados organizados de valores mobiliários, seja de bolsa ou de balcão, por um período de 5 (cinco) anos, a contar da data da assinatura do termo de compromisso.

Em razão do disposto no art. 83 da então vigente Instrução CVM nº 607/2019, a Procuradoria Federal Especializada junto à CVM – PFE/CVM apreciou, à luz do disposto no art. 11, §5º, incisos I e II, da Lei nº 6.385/1976, os aspectos legais da proposta apresentada e opinou "pela possibilidade de aceitação da proposta de pagamento à CVM de indenização a título de reparação pelos danos difusos".

Sendo assim, o Comitê de Termo de Compromisso (“Comitê”) entendeu que seria cabível discutir a viabilidade de um ajuste para o encerramento antecipado do caso e, assim, considerando, em especial, (i) o disposto no art. 86, caput, da Resolução CVM nº 45/2021; (ii) o histórico do Proponente; e (iii) a fase em que se encontrava o processo, propôs o aprimoramento da proposta, com assunção de obrigação pecuniária no montante de R$ 2.104.351,16 (dois milhões cento e quatro mil trezentos e cinquenta e um reais e dezesseis centavos), atualizado pelo IPCA, a partir de agosto de 2020, mês dos últimos negócios, até a data do efetivo pagamento ("Contraproposta").

Tempestivamente, o Proponente apresentou nova proposta no valor de R$ 1.324.347,67 (um milhão trezentos e vinte e quatro mil trezentos e quarenta e sete reais e sessenta e sete centavos), correspondente a 2 (duas) vezes o montante do resultado financeiro líquido obtido alegado, bem como já refletindo o fator redutor em razão da fase em que se encontrava o processo. Ademais, solicitou que o Comitê considerasse o ônus do compromisso de o Proponente abster-se de realizar operações com derivativos pelo prazo de 5 (cinco) anos.

O Comitê, por sua vez, considerou não ser conveniente nem oportuna a proposta de afastamento do mercado de derivativos feita pelo Proponente e decidiu reiterar, por seus próprios fundamentos, os termos de sua Contraproposta.

O Proponente, tempestivamente, encaminhou nova manifestação em que propôs pagar à CVM o valor total de R$ 1.655.434,58 (um milhão seiscentos e cinquenta e cinco mil quatrocentos e trinta e quatro reais e cinquenta e oito centavos), corrigido pela variação do IPCA a partir de agosto de 2020 até a data do efetivo pagamento.

Ante o exposto, o Comitê, considerando, em especial, que o valor final oferecido não se adequa aos parâmetros atualmente utilizados pela CVM para o tratamento de casos da espécie e tampouco atingiu o montante considerado como suficiente para desestimular a prática de condutas assemelhadas, entendeu não ser nem conveniente nem oportuna a celebração do termo de compromisso.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando o parecer do Comitê, deliberou rejeitar a proposta de termo de compromisso apresentada.

PEDIDO DE PRODUÇÃO DE PROVAS – FRANCISCO GURGEL DO AMARAL VALENTE – PAS SEI – 19957.004478/2018-75

Reg. nº 1339/19
Relator: DAR

O Diretor Otto Lobo se declarou impedido por ter sido consultado sobre fatos relacionados ao processo e não participou do exame do caso.

Trata-se de pedido de produção de prova testemunhal, juntada de provas documentais e tratamento sigiloso às referidas provas formulado por Francisco Gurgel do Amaral Valente (“Francisco Valente” ou “Requerente”) no âmbito de Processo Administrativo Sancionador (“PAS”) instaurado pela Superintendência de Registro de Valores Mobiliários – SRE em face de Socopa – Sociedade Corretora Paulista S.A., RO Participações S.A. e seus diretores, Francisco Valente e Arthur Mário Pinheiro Machado (em conjunto com todos os demais acusados, "Acusados").

O caso trata de supostas irregularidades identificadas na 1ª emissão de debêntures simples, não conversíveis em ações, da espécie quirografária, com garantia real, para distribuição pública, com esforços restritos de colocação da RO Participações S.A., realizada em 30.10.2012, nos termos da Instrução CVM nº 476/2009 (“Emissão”).

Em 05.04.2022, o julgamento do PAS foi pautado para a sessão que seria realizada em 10.05.2022. Em 26.04.2022, Francisco Valente juntou aos autos uma nova petição (“Petição Complementar”), requerendo: (i) o deferimento da produção de prova testemunhal postulada na defesa; (ii) a juntada de novas provas documentais, que formariam “um extenso conjunto de correspondências eletrônicas enviadas e recebidas pelas partes diretamente envolvidas no contexto da estruturação e negociação da Emissão” e provariam que Francisco Valente não esteve envolvido em nenhum entendimento relacionado à Emissão; (iii) a atribuição de tratamento sigiloso às provas documentais mencionadas no item anterior, nos termos do art. 3°, incisos I e III, da Resolução CVM n° 48/2021, pois “constituem informações e mensagens eletrônicas trocadas por terceiros – e, portanto, que não são de titularidade direta do Requerente”; e (iv) a retirada do PAS da pauta de sessão de julgamento do dia 10.05.2022.

Em 29.04.2022, o PAS foi retirado de pauta de julgamento de 10.05.2022, ocasionando a perda de objeto do pedido do item (iv) acima.

Ao analisar o pleito, o Diretor Relator Alexandre Rangel entendeu, em síntese, que:

(i) a produção da prova testemunhal, no caso concreto, não era necessária, tendo em vista que "o conjunto probatório reunido pela Área Técnica inclui documentos e informações a fim de demonstrar, de modo suficientemente claro, a individualização da conduta que, na visão da Acusação, foi atribuída a Francisco Valente no contexto da Emissão" e, portanto, a SRE teria reunido "elementos nos autos a indicar, com objetividade, qual teria sido a participação do acusado na Emissão". Ademais, o Relator ressaltou que "[a] suficiência e a pertinência de tais elementos, do ponto de vista probatório, será objeto de análise em sede de julgamento, não sendo necessário que qualquer dos Acusados produza prova negativa a respeito daquilo que entenda não ter praticado".

(ii) quanto às provas documentais, em que pese ter ressalvado que não caberia antecipar qualquer juízo sobre a força probatória dos novos documentos apresentados, observou, em análise preliminar, que se trataria de material que guarda relação com os fatos objeto da acusação. Ademais, o Relator não vislumbrou no pedido de juntada de novas provas, considerando as circunstâncias específicas do caso concreto, um viés procrastinatório que tenha como objetivo retardar a conclusão do PAS, constatação essa que poderia, conforme o caso, ensejar o indeferimento do pleito; e

(iii) no que se refere ao pedido de sigilo perante terceiros sobre as novas provas apresentadas pelo Requerente, manifestou-se no sentido de que (iii.1) o material contém informações sobre diversas outras pessoas, naturais e jurídicas, que não integram o polo passivo do PAS e que, dentre as informações, incluem "trocas de e-mails com assessores legais, protegidos pelo sigilo profissional e que podem dar ensejo a tratamento sigiloso, como expressamente reconhecido pela Autarquia e pelo Superior Tribunal de Justiça"; e (iii.2) trata-se eminentemente de informações operacionais e preparatórias relativas à Emissão, que dizem respeito a atividades profissionais não apenas de Acusados, mas também de terceiros envolvidos. Assim, embora possam ter pertinência para a defesa de Francisco Valente, não devem ser tornados públicos a terceiros. O Diretor ressaltou, entretanto, que o sigilo não alcança os demais Acusados do PAS, que serão intimados a se manifestar a respeito das referidas provas e terão a oportunidade de acessar todos os documentos na íntegra, observada a finalidade específica de viabilizar o exercício da ampla defesa e do contraditório.

Ante o exposto, o Colegiado, por unanimidade, acompanhando o voto do Relator, deliberou pelo (i) indeferimento do pedido de produção de prova testemunhal; (ii) deferimento da juntada das provas adicionais trazidas aos autos por meio da Petição Complementar, com a subsequente abertura do prazo regulamentar a todos os Acusados, para que, caso queiram, possam se manifestar a respeito dos documentos; e (iii) deferimento do pedido de sigilo sobre as referidas novas provas perante terceiros – sigilo esse que, todavia, não se aplica aos Acusados, aos quais será assegurada a oportunidade de acessar integralmente os referidos documentos, para a finalidade específica de permitir o exercício do contraditório e da ampla defesa no PAS.

 

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SSR – INTIMAÇÃO PARA FORNECIMENTO DE INFORMAÇÕES E DOCUMENTOS – PROC. SEI 19957.001764/2018-89

Reg. nº 2578/22
Relator: SSR

Trata-se de recurso interposto por BRF S.A. ("Companhia" ou "BRF") contra decisão da Superintendência de Supervisão de Riscos Estratégicos – SSR acerca da necessidade de fornecimento à CVM de documentos que, de acordo com a Companhia, estariam abarcados em tratativas de acordos de leniência em andamento entre ela e outros órgãos públicos. A Companhia condicionou a entrega da documentação solicitada pela CVM ao fornecimento de garantia formal por meio da qual a Autarquia assegure que não irá compartilhar tais informações e documentos com outras autoridades além da Controladoria-Geral da União – CGU, Advocacia-Geral da União – AGU e o Ministério Público Federal, representado pela Procuradoria da República em Ponta Grossa/PR (“MPF Ponta Grossa”).

O processo administrativo em questão foi instaurado pela Superintendência de Relações com Empresas – SEP com o propósito de se obter esclarecimentos da Companhia a respeito de notícias veiculadas na mídia sobre a prisão de ex-executivos da Companhia nas Operações Trapaça e Carne Fraca, deflagradas pela Polícia Federal, e de supostas tratativas mantidas pela Companhia com a CGU e a AGU para a celebração de um acordo de leniência, bem como analisar a conduta dos administradores da Companhia no que diz respeito à observância dos dispositivos normativos emanados pela CVM.

Conforme entendimentos mantidos, a SEP encaminhou o processo à SSR que, por sua vez, norteou suas diligências pelas informações divulgadas ao mercado pela Companhia desde os Comunicados ao Mercado de 05.03.2018. Nesse sentido, a SSR solicitou à Companhia o resultado dos trabalhos realizados pelo Comitê Independente de Investigação mencionado no Comunicado ao Mercado datado de 15.10.2018, bem como por eventuais outros Comitês ou órgãos assemelhados que tivessem realizado trabalho no sentido de apurar os assuntos tratados nos Comunicados ao Mercado realizados pela Companhia em 15.10.2018, 19.10.2018 e 01.10.2019.

À medida em que a SSR recebeu as respostas aos seus questionamentos, novas solicitações de informações e documentos se fizeram necessárias para aprofundamento e esclarecimento de fatos e condutas apuradas pela Companhia. Em razão da existência de tratativas de acordos de leniência com outros órgãos públicos e da consequente sensibilidade do fornecimento de informações negociadas pela Companhia com tais órgãos à CVM, a área técnica solicitou à BRF uma reunião anterior ao envio dos Ofícios nºs 2 e 3/2022/CVM/SSR/GSR-1 ("Ofícios nºs 2 e 3/2022”, respectivamente) para esclarecer a seus representantes os objetos de solicitação, todos diretamente relacionados a respostas anteriores apresentadas pela Companhia à CVM. Nesse contexto, a BRF requereu que a CVM confirmasse que as informações e documentos fornecidos pela Companhia em resposta aos Ofícios nºs 2 e 3/2022 seriam mantidas em sigilo, conforme tem sido requerido pela Companhia em todas as suas manifestações, e informasse qual a extensão da proteção conferida por tal sigilo aos referidos documentos e informações, especialmente no que se referia ao seu eventual compartilhamento com outras autoridades públicas e sua utilização fora do escopo dos processos administrativos conduzidos pela CVM.

Em reuniões realizadas entre a CVM e representantes da Companhia, foi esclarecido que a investigação realizada pela CVM não tinha interesse especificamente em documentos eventualmente produzidos no âmbito das tratativas de acordo em negociação com a CGU/AGU e o MPF, mas sim no resultado das apurações internas que a Companhia comunicou ao mercado desde 2018 que faria.

Em 23.02.2022, a BRF manifestou preocupação em relação à "existência de uma lacuna legislativa e regulamentar sobre a questão relativa ao compartilhamento de documentos e informações no curso da negociação de acordos de leniência". Em sua solicitação, a Companhia ressaltou que a CGU/AGU, no Memorando de Entendimentos firmado com a Companhia, assumiu, dentre outros, o compromisso, sob o amparo do art. 35 do Decreto nº 8.420/2015, de que em caso de resilição dos respectivos instrumentos: (i) os denominados “Documentos Sigilosos” não deveriam ser usados em qualquer processo ou procedimento da CGU ou da AGU ou em procedimentos instaurados ou ações ajuizadas pela AGU, bem como, não poderiam ser compartilhadas pela CGU ou AGU com outras autoridades ou entes, ressalvadas a obtenção dos referidos documentos por fontes independentes; (ii) a CGU e a AGU deveriam devolver à Companhia todos os materiais, notas ou documentos apresentados pela Companhia no contexto das negociações, sem reter cópias destes; e (iii) sem prejuízo dos itens anteriores, qualquer Documento Sigiloso fornecido nos termos do Memorando de Entendimento continuaria sob sigilo, que permaneceria em vigor após a resilição do Memorando, salvo disposição em contrário contida no próprio Memorando.

A SSR, por meio do Ofício nº 4/2022/CVM/SSR/GSR-1 (“Ofício nº 4/2022”), reafirmou que os documentos recebidos pela Autarquia receberiam o tratamento padrão de sigilo já apontado nos Ofícios nºs 2 e 3/2022, e intimou a Companhia a fornecer o que havia sido neles solicitado, sob pena de multa e embaraço à fiscalização.

Diante disso, em 18.03.2022, a BRF apresentou manifestação, afirmando seu entendimento de que não estaria obrigada a apresentar a documentação solicitada pela CVM, tendo destacado que estariam em curso tratativas para a celebração de acordos de leniência entre a Companhia e a CGU/AGU e o MPF Ponta Grossa e que tais negociações assegurariam à BRF, na forma do disposto na Lei nº 12.846/2013 e no Decreto nº 8.420/2015, "uma série de garantias e prerrogativas específicas", dentre as quais "aquela referente à não utilização, em prejuízo da Companhia, das informações e documentos por ela fornecidos às autoridades com as quais tais acordos estão sendo negociados". Assim, "deve[ria] ser reconhecido que a BRF S.A. tem legítimo interesse em assegurar que a garantia de não utilização das informações e documentos apresentados à CGU/AGU e ao MPF Ponta Grossa em seu desfavor não seja prejudicada em situações de seu eventual compartilhamento com outras autoridades públicas que, diferentemente da CGU/AGU e do MPF Ponta Grossa, não tenham se comprometido com tal garantia". Ante o exposto, a Companhia (i) reiterou o pedido para que a SSR manifestasse expressamente seu entendimento a respeito da possibilidade de os documentos e informações eventualmente apresentados em resposta aos Ofícios nºs 2 e 3/2022 serem compartilhados pela CVM com outras autoridades públicas; (ii) solicitou que, caso o entendimento da SSR “acerca das questões tratadas na presente petição seja diferente daquele ora manifestado pela Companhia (isto é, no sentido de que ela não pode ser obrigada a fornecer os documentos e informações objeto dos Ofícios 2 e 3/2022, por estarem protegidos pelas garantias inerentes ao processo de negociação dos acordos de leniência, a não ser que essa d. Comissão formalmente assegure que não irá compartilhar tais informações e documentos com outras autoridades, que não a CGU/AGU e o MPF Ponta Grossa), a presente petição seja encaminhada ao Colegiado desta d. Autarquia, sob a forma de recurso, em conformidade com o disposto na Resolução CVM nº 46/2021"; e (iii) na hipótese acima mencionada, a BRF requereu, ainda, que o recurso seja recebido com efeito suspensivo, conforme previsto no art. 6º da Resolução CVM nº 46/2021, de modo que, enquanto a questão não for decidida pelo Colegiado, não lhe seja imposta multa cominatória ou qualquer outra eventual sanção pela não apresentação dos documentos e informações solicitados nos Ofícios nºs 2 e 3/2022.

A SSR, em análise consubstanciada no Ofício Interno nº 6/2022/CVM/SSR/GSR-1, entendeu, em síntese, que (i) não poderia pautar sua atuação de acordo com as escolhas dos jurisdicionados, devendo cumprir seus deveres institucionais, e que a CVM estaria respaldada nos incisos I e II do art. 9° da Lei n° 6.385/1976 ao efetuar intimações com a finalidade de obter informações e documentos; (ii) a atuação da CVM se deu em razão dos Comunicados ao Mercado citados anteriormente, tendo em vista que as informações divulgadas apontavam possível prática de irregularidades pela BRF; (iii) as intimações foram efetuadas à Companhia de forma ordinária, assim como seria feito para quaisquer outras dentre as inúmeras instituições sujeitas à atuação da CVM e que estivessem sob investigação da SSR; (iv) na visão da área técnica, a BRF requer tratamento privilegiado da CVM, “condicionando o cumprimento das intimações regularmente efetuadas ao fornecimento de garantias de que eventual comunicação de ilícitos por parte desta Autarquia seja feita apenas às autoridades por eles especificadas (CGU e MPF de Ponta Grossa), que são as autoridades com quem estão desde 2018 negociando acordo de leniência"; e (v) a condição imposta pela BRF constitui obstáculo injustificado à atuação da CVM.

Tendo em vista a complexidade do tema, a área técnica solicitou parecer da Procuradoria Federal Especializada junto à CVM – PFE/CVM, que, em síntese, manifestou-se no sentido de que:

(i) "Não há (...) incompatibilidade insuperável entre o sigilo da Lei n° 12.846/13 e o sistema de proteção aos acionistas previstos na Lei n° 6.385/76 e Lei n° 6.404/76";

(ii) "não há qualquer base legal para que a apuração de atos ilícitos praticados por administradores seja obstada por conta de um acordo que versa sobre sujeito diverso – a companhia. Especialmente diante de condutas que podem configurar violações dos deveres de administradores, tanto para com a própria sociedade empresária quanto para o mercado e seus investidores";

(iii) "[a] CVM, (...) como reguladora do mercado de valores mobiliários, tem o dever de apurar esses fatos, sendo sua prerrogativa requisitar os elementos de informação necessários. Por outro lado, não pode ser descartada na hipótese a possibilidade de se adotar solução de natureza consensual também no âmbito da CVM, aplicando-se, mutatis mutandi, o entendimento contido no DESPACHO n. 00511/2020/PFE - CVM/PFE-CVM/PGF/AGU, cujos principais trechos seguem transcritos: A adesão ao Acordo de Colaboração Premiada, no que tange aos depoimentos e os compromissos e benefícios pactuados no acordo original, deverá levar em consideração a diversidade dos bens jurídicos tutelados pela CVM, sua missão institucional, o poder-dever de apurar as infrações administrativas de sua competência e, finalmente, a possibilidade de questionamento dos atos processuais à luz do mencionado entendimento da Segunda Turma do E. STF, segundo o qual "deverão ser respeitados os termos do acordo em relação à agravante e aos demais aderentes, em caso de eventual prejuízo a tais pessoas";

(iv) "a CVM somente possui autorização legal para garantir benefícios nos contornos dos instrumentos específicos para a solução consensual de litígios administrativos, a saber, o termo de compromisso previsto no art. 11, § 5°, da Lei n° 6.385/76 e o acordo administrativo em processo de supervisão, previsto nos arts. 30 e seguintes da Lei n° 13.506/17. Além disso, há previsão de possibilidade de atenuação de sanções prevista no § 9° do art. 11 da Lei n° 6.385/76. Esses instrumentos não são necessariamente inconciliáveis com aqueles previstos nas Leis n°s 12.846/13 e 12.852/13, sendo possível cogitar a compatibilização de suas premissas e finalidades sem prejuízo da forma que deve ser observada, conforme se apresente cada caso concreto";

(v) "a obrigação de confidencialidade assumida pela companhia em acordo que poderá ser celebrado, em tratativas desde 2018, (...) não configura justificativa legítima para recusa em apresentar as informações e documentos solicitados. A despeito da cláusula de confidencialidade, a Companhia deve disponibilizar as informações/documentos em questão”;

(vi) "No que tange à caracterização de embaraço à fiscalização, tendo em vista a ocorrência da expedição de mais de um ofício à companhia e a permanência da situação da negativa de apresentação dos documentos solicitados pela CVM, caracteriza-se como infração grave face a possibilidade de configuração de embaraço a fiscalização, com supedâneo n[o] art. 1º, parágrafo único, do Anexo 64 Anexo B Resolução CVM nº 45, de 31 de agosto de 2021 que considera como infrações graves de que trata o art. 64, parágrafo único";

(vii) "não há supedâneo jurídico para oponibilidade de sigilo à CVM, de vez que, em havendo apenas um vislumbre da ocorrência de qualquer irregularidade realizada no âmbito de sua competência, a CVM detém o poder-dever legal de intimar qualquer pessoa física ou jurídica, para prestar, sob cominação de multa, informações ou esclarecimentos sobre atos ilícitos praticados em sua esfera de competência"; e

(viii) "a condição para o acesso da CVM à documentação requisitada foi formulada com base em opinião jurídica da própria companhia - pessoa jurídica de direito privado - sem que sequer tenha sido trazido aos autos documento subscrito pelas autoridades públicas envolvidas na mencionada negociação confirmando o seu entendimento".

Ante o exposto, a SSR manifestou-se no sentido da manutenção dos efeitos dos Ofícios nºs 2, 3 e 4/2022/CVM/SSR/GSR-1, entendimento corroborado pela PFE/CVM, que destacou ainda a possibilidade da ocorrência de embaraço à fiscalização e aplicação de multa por não cumprimento às intimações realizadas.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando a manifestação da área técnica, deliberou pelo não provimento do recurso.

 

RECURSO EM PROCESSO DE MECANISMO DE RESSARCIMENTO DE PREJUÍZOS – F.S.O. / XP INVESTIMENTOS CCTVM S.A. – PROC. SEI 19957.000783/2021-93

Reg. nº 2574/22
Relator: SMI

Trata-se de recurso interposto por F.S.O. ("Reclamante" ou "Recorrente") contra decisão da BSM Supervisão de Mercados ("BSM") que indeferiu seu pedido de ressarcimento de prejuízos, no âmbito do Mecanismo de Ressarcimento de Prejuízos ("MRP"), movido em face da XP Investimentos CCTVM S.A. ("Reclamada" ou "Corretora").

Em sua Reclamação à BSM, o Reclamante informou que, em 04.03.2020, ao aditar o valor da compra de 12.200 VVAR3, comprou mais 11.100 ações, o que deveria ter sido rejeitado pela Reclamada, dada sua incapacidade financeira. Apenas em 06.03.2020, em razão de alegada indisponibilidade da Reclamada no dia anterior, conseguiu enviar a ordem de venda de 11.500 VVAR3 a R$13,96 (treze reais e noventa e seis centavos), tendo sido, no entanto, registrada uma compra de 11.500 VVAR3 a R$ 12,65 (doze reais e sessenta e cinco centavos), a qual foi totalmente executada. Na mesma data, o Reclamante afirmou ter recebido, via correspondência eletrônica, uma “Notificação de Saldo Negativo” sem informação relativa ao montante. Nos dois dias subsequentes, o Reclamante recebeu outras Notificações de Saldo Negativo, desta vez especificando o saldo negativo de R$ 160.902,66 (cento e sessenta mil novecentos e dois reais e sessenta e seis centavos), na notificação de 10.03.2020, e de R$ 309.513,97 (trezentos e nove mil quinhentos e treze reais e noventa e sete centavos), na notificação de 11.03.2020. Em 12.03.2020, recebeu nova correspondência eletrônica informando a disponibilização de nota de corretagem com as operações do dia anterior, ou seja, a venda de 28.100 ações VVAR3, fazendo com que ficasse com 6.700 VVAR3, totalizando o valor de R$ 58.089,00 (cinquenta e oito mil e oitenta e nove reais). Por fim, após relatar que no último trimestre de 2019, por diversas vezes enviou ordem de venda que apareciam posteriormente como ordem de compra e que a Reclamada teria permitido que a plataforma fizesse operações reincidentes de duas vezes o valor do patrimônio, mesmo após contato por meio de correspondência eletrônica para que fossem feitas somente operações dentro do patrimônio, requereu o ressarcimento do montante total de R$ 125.228,74 (cento e vinte e cinco mil duzentos e vinte e oito reais e setenta e quatro centavos).

Após receber a defesa da Reclamada, a BSM elaborou Relatório de Auditoria em que apurou que (i) as trilhas de auditoria entre o sistema gerenciador de ordens (OMS) e a B3 apresentadas pela Reclamada, bem como o relatório de ordens extraído do sistema da B3, indicaram que todas as ordens com VVAR3 que constavam nos pregões dos dias 04.03 e 06.03.2020 foram enviadas à B3, tendo sido registradas como ofertas de compra; (ii) não foram apresentadas as trilhas de auditoria que demonstrariam as ordens do Reclamante desde a tela de seu computador até o OMS da Reclamada; (iii) não houve registros de indisponibilidade do pregão ou na plataforma de negociação em 05.03.2020 e (iv) a liquidação compulsória parcial de 28.100 VVAR3 do Reclamante no pregão de 11.03.2020 ocorreu em conformidade com o manual de risco da Reclamada, uma vez que o Reclamante apresentava saldo devedor de R$ 309.513,97 (trezentos e nove mil quinhentos e treze reais e noventa e sete centavos) em sua conta corrente, conforme documentos apresentados pela Reclamada.

O Diretor de Autorregulação da BSM – DAR, tendo observado, em síntese, que (i) a Corretora, como responsável pelas obrigações decorrentes das ofertas de seus clientes no âmbito do monitoramento de risco pré-negociação, pode, a seu exclusivo critério, cumprir a ordem emitida e permitir a inserção de ofertas que ultrapassem os limites por ela estabelecidos; (ii) não havia evidências de que a Reclamada tenha assumido a obrigação de não executar ordens que representassem risco excessivo em relação à capacidade financeira do Reclamante, de modo que a Corretora tinha discricionariedade para aceitar a inserção de ordem de compra de 11.100 VVAR3 enviada pelo Reclamante no pregão de 04.03.2020; (iii) a Reclamada disponibiliza canais de atendimentos alternativos similares para execução de eventuais operações, assim como a alternativa de utilização da mesa de operações para envio de ordens, aos quais o Reclamante poderia ter recorrido para encerrar suas posições com o ativo VVAR3; (iv) não havia evidências de infiel execução das ordens pela Reclamada, já que a ordem referente a 11.500 VVAR3 foi registrada e executada como ordem de compra; e (v) a Reclamada, com base em suas regras de monitoramento e gestão de risco descritas em seu manual de risco e amparada pelas disposições do contrato de intermediação e da ficha cadastral firmados pelo Reclamante, estava autorizada a liquidar compulsoriamente a posição do Reclamante, julgou improcedente o pedido do Reclamante, nos termos do art. 77 da Instrução CVM nº 461/2007.

Em seu recurso, o Recorrente, além de reiterar que a Reclamada não apresentou os documentos solicitados e apresentar questionamentos sobre o Relatório de Auditoria e a decisão da BSM, alegou que a Reclamada não teria observado os normativos do mercado de valores mobiliários, notadamente a Instrução CVM nº 505/2011 e Ofício Circular nº 2/2020-CVM-SMI. Ademais, afirmou que não teria concluído a compra realizada em excesso.

A Superintendência de Relações com o Mercado e Intermediários – SMI, nos termos do Ofício Interno nº 42/2022/CVM/SMI/SEMER, entendeu, em síntese, que:

(i) estando o Recorrente enquadrado no perfil moderado, as operações questionadas foram adequadas;

(ii) a compra de ações no mercado à vista não significa necessariamente um risco imediato para o participante na data da operação, uma vez que a liquidação ocorrerá em dois dias e o cliente poderá depositar os recursos necessários até a data da liquidação. Assim, a Reclamada não estava obrigada a barrar a execução da ordem do Recorrente para a compra de 11.100 VVAR3 adicionais, que, por sua vez, poderia ter sido revertida com o envio de ordem de venda dos referidos ativos;

(iii) o Relatório de Auditoria apontou que não houve registros de indisponibilidade para o pregão de 05.03.2020;

(iv) tendo em vista que a Reclamada não apresentou as trilhas de auditoria com os registros das ordens enviadas pelo Recorrente até o OMS, a equipe de Auditoria da BSM concluiu não ser possível garantir que todas as ordens tenham sido oriundas de comandos prévios do Recorrente. Ou seja, comprovou-se o registro das ordens do OMS para a B3, mas não se comprovou, por falta de informação, o registro das ordens da tela do Recorrente para o OMS da Reclamada;

(v) sem comprovação, presume-se que, em 06.03.2020, o Recorrente teria registrado a ordem de venda de 11.500 VVAR3 a R$ 13,96, ainda que o registro da ordem não seja garantia de execução, o que ocorreria somente se houvesse condições de mercado. Nesse sentido, a área técnica verificou que “o Boletim Diário de Informações – BDI da B3 referente ao pregão de 06.03.2020 mostra que a cotação do ativo VVAR3, variou de um mínimo de R$ 11,39 a um máximo de R$ 12,84, pelo que a ordem de venda de 11.500 VVAR3 a R$13,96 não seria executada por falta de condições de mercado e não haveria nenhum débito ou crédito de valores na conta do Reclamante, nem variação na sua posição em custódia”. Assim, a SMI entendeu que teria sido registrada e executada uma compra de 11.500 VVAR3 a R$ 13,96, em vez de uma venda, e que a Reclamada teria incorrido em infiel execução de ordem, nos termos do art. 77, inciso I, da Instrução CVM nº 461/2007, que ocasionou o débito irregular de R$ 145.546,82 (cento e quarenta e cinco mil quinhentos e quarenta e seis reais e oitenta e dois centavos) na conta corrente gráfica do Recorrente.

Ante o exposto, a SMI opinou pelo provimento parcial do recurso, no valor de R$ 19.325,47 (dezenove mil trezentos e vinte e cinto reais e quarenta e sete centavos), conforme cálculo descrito nos itens 45 a 47 do Ofício Interno nº 42/2022/CVM/SMI/SEMER, devidamente acrescido de juros e atualização monetária, na forma prevista no art. 24 do Regulamento do MRP, desde 13.03.2020 até a data do efetivo ressarcimento.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando a manifestação da área técnica, deliberou pelo provimento parcial do recurso, com a consequente reforma da decisão da BSM.

 

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