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ATA DA REUNIÃO DO COLEGIADO Nº 17 DE 17.05.2022

Participantes

• MARCELO BARBOSA – PRESIDENTE
• FLÁVIA MARTINS SANT'ANNA PERLINGEIRO – DIRETORA
• ALEXANDRE COSTA RANGEL – DIRETOR
• OTTO EDUARDO FONSECA DE ALBUQUERQUE LOBO – DIRETOR

Outras Informações

Foi sorteado o seguinte processo:

PAS
Reg. 1905/20 - 19957.003611/2020-91 - DFP

 

Ata publicada no site em 15.06.2022, exceto decisão referente ao Proc. SEI 19957.006102/2020-10 (Reg. 2388/21) divulgada em 17.05.2022. 

PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO DE DECISÃO DO COLEGIADO – DISTRIBUIÇÃO DE RENDIMENTOS EM FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO – BTG PACTUAL SERVIÇOS FINANCEIROS S.A. DTVM – PROC. SEI 19957.006102/2020-10

Reg. nº 2388/21
Relator: SSE

Trata-se de Pedido de Reconsideração (“Pedido de Reconsideração” ou "Pedido") encaminhado por BTG Pactual Serviços Financeiros S/A DTVM (“BTG”, “Requerente” ou “Administradora”), na qualidade de administrador do Maxi Renda Fundo de Investimento Imobiliário (“Fundo”), em face da Decisão do Colegiado da CVM de 21.12.2021 ("Decisão do Colegiado" ou "Decisão"), que deliberou pelo provimento parcial do Recurso interposto pela Requerente, contra decisão da SSE contida no Ofício nº 6/2021/CVM/SSE/SSE-Assessoria (“Ofício 06/2021”), de 07.07.2021.

Na Decisão de 21.12.2021, o Colegiado, por maioria, acompanhando o voto do Diretor Fernando Galdi (“Voto Condutor”), concluiu que “o reconhecimento contábil da distribuição dos resultados dos FII deve ser refletido nas demonstrações financeiras de acordo com os requisitos da ICVM 516/11 combinados, apenas naquilo que for pertinente, com as normas contábeis emitidas pela CVM aplicáveis às companhias abertas. Deste modo, caso a distribuição dos resultados seja superior a soma do lucro líquido do exercício com o montante de lucros acumulados (e/ou reserva de lucros) do exercício anterior, há uma transação de restituição ou devolução de capital [i.e., amortização] entre o Fundo e os cotistas, com a transferência de recursos do patrimônio líquido da entidade para os detentores das cotas do FII”.

Em 31.01.2022, foi protocolado pedido de efeito suspensivo da Decisão, até a apreciação do pedido de reconsideração. Na mesma data, em reunião extraordinária, o Colegiado se manifestou pelo seu deferimento.

Em 15.02.2022, a Requerente apresentou o Pedido de Reconsideração invocando o art. 10 da Resolução CVM nº 46/2021 e, subsidiariamente, o art. 56 da Lei nº 9.784/1999, acompanhado de Parecer Técnico - Contábil elaborado por professor de contabilidade, tendo, em 06.04.2022, solicitado a juntada de outros dois pareceres jurídicos.

Quanto ao cabimento do Pedido, alegou que existiriam contradições no Voto Condutor, quando o Diretor Fernando Galdi afirma discordar do entendimento da área técnica manifestado no Ofício 06/2021, e, ao mesmo tempo, exige que o montante distribuído que exceda a soma do lucro contábil e acumulado seja reconhecido contabilmente como “restituição ou devolução de capital”. Na visão da Requerente, “essa condição torna os efeitos produzidos por sua conclusão em quase tudo similares aos produzidos pelo entendimento da área técnica, logo, não é possível concluir sobre qual é a extensão da discordância, se é que há discordância”, o que traria à tona “um problema de lógica interna na Decisão, uma vez que as principais assertivas e fundamentos do voto condutor, contrastam com a posterior conclusão”.

A Requerente afirma que “a contradição entre o trecho de fundamentação e o trecho dispositivo/conclusivo torna obscura e de difícil compreensão a extensão do provimento parcial manifestado na Decisão e suas repercussões jurídicas, práticas, econômicas e operacionais”, e postula que o julgamento não deve se ater, unicamente, aos requisitos descritos na Resolução CVM nº 46/2021. Assim, defende que, “caberia à CVM adentrar no exame da inobservância, em sua integralidade, dos princípios que informam o processo administrativo, o que, por erro de julgamento quando da interpretação da Lei nº 8.668/93, por si só, também justifica a revisão do ato”, elencando, nesse sentido, os seguintes argumentos:

"(a) O vocábulo “lucro” contido parágrafo único do artigo 10 da Lei nº 8.668/93, de natureza preponderantemente tributária, deve ser interpretado conforme o Direito Tributário e não a Ciência Contábil.
(b) O referido dispositivo legal considera que o fato gerador do IR é a disponibilidade econômica (caixa), sendo essa a escolha expressa do legislador ordinário.
(c) A obrigatoriedade de distribuição automática de, no mínimo, 95%, dos lucros teve em vista propiciar a incidência de IR, nos termos do artigo 17 da mesma Lei, estando a isenção restrita a determinadas hipóteses legais.
(d) As premissas contábeis que fundaram as conclusões da SSE e da Decisão estão equivocadas, resultando em conclusões que não se sustentam, como evidencia o Parecer Contábil.
(e) O conceito de capital social não se amolda à natureza jurídica dos FII, de forma que perspectiva que inspirou a Decisão subestimou a impropriedade de importar esse conceito específico para o caso concreto. Enquanto uma companhia tem seu conjunto próprio de normas (Lei nº 6404/76) voltado a preservar a sua continuidade e construído sobre o conceito da intangibilidade do capital social como garantia dos credores, a legislação do FII, regrada subsidiariamente pelo Código Civil, como pacificado por essa CVM, busca a imediata distribuição do caixa disponível.
(f) Não é permitido aos cotistas, como enunciado na Decisão e pela SSE, deliberar em assembleia pela não distribuição de rendimentos. A prerrogativa da assembleia está restrita a, após a compulsória e automática distribuição, deliberar pelo reinvestimento integral dos rendimentos. Isso significa reputar como valor distribuído, tributar e reinvestir, estando na esfera discricionária da assembleia apenas a última etapa: o reinvestimento.
(g) Do ponto de vista contábil a Decisão infringe os comandos contidos na ICVM 577/2016, que estabelece com clareza e simplicidade quais eventos devem ser contabilizados à conta de ‘cotas de investimento’ e quais devem ser registrados em ‘lucros ou prejuízos acumulados’.
(h) As normas contábeis produzem uma representação da realidade; os fatos representados pela aplicação da norma contábil, entretanto, não se confundem com a realidade propriamente dita nem alteram os fatos propriamente ditos. Quando se analisam os fatos sobre os quais incidem a norma jurídica, o prisma contábil não é uma imposição.
(i) Ainda sob o prisma contábil (partindo-se da premissa de que a Decisão exige apenas a reclassificação contábil), a mera reclassificação contábil dos valores distribuídos a título de rendimentos não alteraria o valor do patrimônio líquido do Maxi Renda além de tornar a representação dos eventos mais sintética, sem aprimorar a qualidade da informação contábil.
(j) O Maxi Renda não incorre no risco de descontinuidade (going concern risk) ou mesmo de higidez financeira pelo fato de distribuir os rendimentos a seus cotistas de acordo com a Lei nº 8.668/93, como evidencia a análise exposta no Parecer Contábil, que demonstrou que os principais eventos negativos no resultado contábil do Maxi Renda e que provocam diferença entre o lucro contábil (competência) e os “lucros auferidos, apurados segundo o regime de caixa” são ajustes a valor justo (“AVJ”). Por sua natureza, ajustes a valor justo são estimativas decorrentes de julgamentos críticos e subjetivos e não necessariamente se convertem em entrada ou saída de caixa.
(k) A prevalência da essência sobre a forma, mencionada tanto no parágrafo 605 da Decisão quanto no item 10 do Parecer Técnico Nº 13/2021-CVM/SNC/GNC como motivação para tratar a distribuição de rendimentos como se amortização de cotas fosse, apesar de ter raiz na contabilidade, não pode alterar a natureza jurídica de eventos econômicos cuja aferição e destinação são dadas pelo Direito. E ainda que assim não fosse, o entendimento de que em essência o Maxi Renda distribui capital e não rendimentos é equivocado como demonstrado no Parecer Contábil.
(l) Além das questões anteriores, de cunho estritamente técnico, o desfecho do presente caso deve considerar outros aspectos, não menos importantes, como (i) dificuldades operacionais intransponíveis para fins de cumprimento das obrigações tributárias por parte dos administradores, na condição de responsáveis legais, (ii) a criação de distorções e assimetrias entre FII em função das características de suas carteiras e seus reflexos contábeis, (iii) efeitos retroativos nos casos em que os regulamentos dos FII (é o caso do Maxi Renda) determinem a antecipação mensal da distribuição dos rendimentos, entre outros que podem prejudicar sobremaneira os investidores e um mercado pujante com expressa expansão nos últimos anos.
".

Quanto à extensão dos efeitos da Decisão, a Administradora alegou que a sua implementação “traz não apenas riscos jurídicos, como também implicações operacionais, financeiras, de governança, de gestão de liquidez, e até mesmo tributárias, no contexto de uma distribuição de rendimentos/patrimônio”, e adverte que “espera-se que o Colegiado esclareça e limite os efeitos da aplicação da Decisão à forma menos onerosa possível, a fim de propiciar aos administradores e agentes do mercado a adoção de medidas cabíveis e adequadas para ajustar seus procedimentos às mudanças impostas”.

A Requerente enfatizou, ainda, o risco de descasamento que decorre da distribuição de recursos sob a rubrica “rendimentos” em bases mensais, tendo em vista que o regulamento do Fundo prevê tal periodicidade e a avaliação a valor justo dos ativos do FII ocorre em bases semestrais e/ou anuais, de modo que poderia ocorrer eventual mudança retroativa da classificação dos rendimentos já pagos aos cotistas, com potenciais repercussões tributárias.

Por fim, afirmou que “com base nos Ofícios Circulares divulgados pela CVM, notadamente do Ofício Circular 01/2014, [que] sempre se entendeu vigorar, resta claro que a Decisão constitui inovação normativa ou interpretativa, dela não se podendo retirar efeitos retroativos, razão pela qual deveriam ser indicadas, expressamente, caso eventualmente a Decisão seja mantida, as suas consequências jurídicas e administrativas”, e que, conforme disposto no artigo 23 da LINDB (Lei 4.657/42), “caso este Pedido de Reconsideração não venha a ser acatado, [...] caberia então admitir-se que a Decisão ora em análise deveria prever uma regra de transição, preferencialmente após um amplo debate, vez que, como é sabido, é vedada à Administração Pública a aplicação retroativa de nova interpretação”.

Diante disso, a Administradora requereu que "(i) sejam sanadas as omissões, contradições e obscuridades exaustivamente apontadas na Decisão proferida na reunião do Colegiado de 21.12.2021, a fim de que se conciliem adequadamente as exigências contábeis - essencialmente de natureza informacional - com as jurídicas, de destinação obrigatória de resultados apurados pelo regime definido na Lei nº 8.668/93 e no Ofício-Circular CVM/SIN/SNC nº 01/2014, que, diante do quadro legal aplicável, não podem subsistir; (ii) subsidiariamente, caso não seja a Decisão reformada em sua integralidade, pede-se, de forma sucessiva: (ii.a) que o tratamento determinado nos parágrafos 59 a 61 seja reformulado para que seus efeitos fiquem expressamente restritos à esfera contábil, sem que se altere a qualificação jurídica dos rendimentos distribuídos nos termos da Lei nº 8.668/93, que permanecerão tratados como rendimentos para todos os outros fins, conforme o comando legal e a decisão do d. Colegiado de 17 de março de 2015, que ratificou o entendimento do Ofício-Circular 1/2014; e (ii.b) considerando-se que, se a Decisão for mantida, acarretará a alteração do critério jurídico contido em diretrizes da própria CVM, que sejam então modulados os efeitos da Decisão para se dar adequado tratamento às diversas consequências jurídicas, práticas e operacionais para administradores, investidores e outros stakeholders da indústria de FII, solução que poderia contar com prévia audiência pública antes de se editar a competente regulação."

Em análise consubstanciada no Ofício Interno nº 1/2022/CVM/SSE/SSE-Assessoria (“Ofício Interno nº 1/2022”), a SSE afirmou que: (i) o Pedido de Reconsideração vai além do que prevê a Resolução 46/2021, pois se reveste de características de um novo recurso, inclusive com a apresentação de pareceres; e (ii) a argumentação elaborada no Pedido de Reconsideração, a rigor, repete os assuntos já enfrentados no recurso original, sem trazer fatos novos.

Assim, não caberia o conhecimento do Pedido de Reconsideração, haja vista que não teria sido comprovado, pelo BTG, a omissão, obscuridade, contradição ou erro material ou de fato na Decisão do Colegiado de 21.12.2021. Contudo, a área técnica defendeu que o Pedido de Reconsideração fosse conhecido, por avaliar que o ajuste à Decisão do Colegiado apresentado no Ofício Interno nº 1/2022 pode limitar os impactos operacionais para a Requerente e para os demais administradores de FII, em linha com o segundo pedido subsidiário da Administradora.

Inicialmente, a SSE afirmou não enxergar contradição no Voto Condutor, observando, neste sentido, que o Diretor procurou, em seu voto, desvincular a obrigatoriedade de distribuição prevista na Lei nº 8.668/1993 da existência do "lucro passível de distribuição", como requerido pela SSE no Ofício 06/2021. Contudo, concordou com a SSE ao afirmar que os valores distribuídos que excedem os lucros contábeis do exercício e acumulados devem ser reconhecidos como amortização de capital.

Com relação à alegação da Requerente de que a Instrução CVM nº 516/2011 não faz qualquer menção ao registro de saídas de caixa a título de pagamento semestral de rendimentos e é sintética no que tange à rubrica do patrimônio líquido, a área técnica ressaltou que o art. 2º da mesma Instrução remete às normas aplicáveis às companhias abertas, notadamente os pronunciamentos aprovados pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis – CPC. Seria relevante, nesse sentido, o Pronunciamento Técnico CPC 00, que disciplina a estrutura conceitual para relatório financeiro, e, na tabela 4.1, dispõe que as distribuições aos detentores de direitos sobre o patrimônio, no caso dos FII os seus cotistas, não podem ser consideradas como despesas.

Ademais, a alegação de que não haveria, formalmente, “capital social” reconhecido nas demonstrações financeiras dos FII, também não desqualificaria, na visão da SSE, o entendimento de que a distribuição de valores em excesso ao lucro contábil implica em devolução do montante integralizado pelos investidores, uma vez que referido saldo é reconhecido contabilmente na rubrica de cotas integralizadas, que se equipara ao capital social das companhias, para fins contábeis. Embora reconheça que há diferenças jurídicas relevantes entre o capital social de companhias e as cotas integralizadas pelos cotistas, a área técnica entende que a equiparação entre capital social e cotas integralizadas para o fim proposto não compromete ou altera o entendimento da Decisão.

A SSE sustentou, ainda, que não houve alteração no entendimento da Autarquia, já que a Decisão complementa, mas não altera, os entendimentos manifestados nos Ofícios-Circulares CVM/SIN/SNC 01/2014 e 01/2015 (“Ofícios Circulares” ou “Ofícios Circulares de 2014 e 2015”). Ao disciplinar a distribuição obrigatória de rendimentos nos Ofícios Circulares, a CVM teria considerado como premissa básica que haveria resultado contábil no FII passível de ser distribuído como renda. Nesse sentido, infere a SSE que tal premissa tenha ficado clara para a Requerente, visto que, em 2016, a própria Requerente apresentou consulta à SIN, superintendência responsável pelos FII à época, sobre qual seria o procedimento correto se o fundo não apresentasse lucro contábil, demonstrando dúvidas e manifestando o entendimento de que os Ofícios Circulares não abordavam o tema.

Em resposta, foi comunicado à Requerente, por meio do Ofício nº 148/2018/CVM/SIN/GIES, enviado ao BTG em 2018 no âmbito do Processo SEI nº 19957.009730/2016-71, que “na interpretação desta área técnica para a norma aplicável, entendemos como indevida a distribuição de rendimentos em caso de existência de prejuízos contábeis acumulados, na medida em que a contabilização pelo regime de competência consiste em uma inferência sobre o caixa futuro a ser auferido pelo Fundo, o qual é previamente evidenciado pelo lucro ou prejuízo contábil acumulado. Assim, qualquer distribuição de recursos aos cotistas, em fundo que possua prejuízo acumulado, representa uma amortização do capital investido e não uma distribuição de rendimentos, o que afasta a aplicação do disposto no art. 10, § único, da Lei 8.668/93 no caso”, sem ter havido qualquer questionamento ou recurso da Requerente sobre tal entendimento.

Nesse contexto, a SSE concluiu que a Decisão de Colegiado de 21.12.2021 não contraria qualquer disposição anterior, uma vez que (i) em 2014 o objetivo foi o de buscar a padronização da metodologia de cálculo, deixando claro, inclusive, que os ganhos e perdas não realizados deveriam ser expurgados do cálculo dos lucros apurados pelo regime de caixa; (ii) em decisão do Colegiado de 2015, que analisou recurso da ANBIMA, o Colegiado da Autarquia confirmou aquele entendimento e deliberou pela possibilidade de haver retenção/reinvestimento da distribuição obrigatória, desde que aprovado em assembleia de cotistas; (iii) os Ofícios Circulares de 2014 e 2015 consideravam, como premissa, a ausência de distribuição mínima obrigatória e uma disparidade de métodos para o cálculo do lucro, sendo que jamais foi debatido o fato de o FII apresentar “lucro caixa”, mas não ter lucro contábil por competência suficiente para fazer frente à distribuição; e (iv) a Decisão de 2021 complementa, mas não altera as decisões e orientações anteriores, ou seja, uma vez apurado o “lucro caixa”, conforme metodologia disciplinada naqueles Ofícios Circulares, continua válida a exigência de aprovação em assembleia para a não distribuição, restando claro que, no momento em que um FII não possui lucros pelo regime de competência, não há que se falar em distribuir a “renda”. Por esse motivo foi necessário complementar aquelas orientações de 2014 e 2015 e, por isso, o próprio BTG efetuou consulta a área técnica, respondida em 2018.

Na visão da SSE, também não se sustentaria o argumento de que os fundos devem repassar diretamente aos seus cotistas os rendimentos recebidos dos imóveis ou títulos investidos, tais como aluguéis e juros, independentemente dos resultados contábeis. A Lei nº 8.668/1993 disciplina uma dinâmica de distribuição de resultados do FII, considerando o lucro apurado pelo caixa com base em balanço ou balancete semestral. Os resultados não realizados não fazem parte da apuração do lucro caixa, porém, fazem parte da apuração do resultado por competência e, assim, do balancete semestral.

A área técnica defendeu, ainda, que a Decisão do Colegiado tratou do caso específico e concreto, ou seja, de um recurso contra o entendimento da SSE, sem abordar as consequências e desdobramentos no âmbito de sanção administrativa, jurídica ou tributária, pois tais consequências também não estariam presentes na decisão original da SSE objeto de recurso.

Quanto à alegação da Requerente de que não há qualquer justificativa para a Decisão proferida pelo Colegiado, que simplesmente exige o reconhecimento contábil de parte dos valores distribuídos como redução de capital, para concluir que essa informação seria irrelevante para o investidor, a SSE defendeu que a informação é extremamente relevante para que o investidor esteja apto a identificar se está recebendo de volta o valor do principal aportado ou a renda advinda da geração de riqueza desse principal, visto que se relaciona aos aspectos financeiros que envolvem a formação do valor de mercado de valores mobiliários negociados, como o fato de que o preço de mercado das cotas, como de uma ação, é percebido pelos investidores como o valor presente dos fluxos de caixa futuros advindos de distribuição de renda, e não de capital.

Nesse contexto, a SSE destacou que, nos casos em que não se verifique lucro contábil, entende ser desnecessária a realização de assembleia a fim de deliberar a retenção dos recursos, uma vez que a Lei dispõe que o lucro caixa deve ter base em balanço ou balancete semestral, ou seja, deve ter base na contabilidade por competência para ser entendido como lucro ou renda efetiva. Nesse sentido, para a SSE, a ausência do lucro contábil autorizaria o administrador a não amortizar as cotas integralizadas automaticamente, restringindo a distribuição obrigatória de que trata a Lei somente à parcela que se caracteriza como renda.

Ademais, a área técnica pontuou que, considerando que a Decisão corresponde a orientação complementar aos Ofícios Circulares de 2014 e 2015 acerca da melhor interpretação do disposto na Lei nº 8.668/1993, a área técnica não espera que os administradores e gestores de FII sejam obrigados a retroagir os registros contábeis e informações já divulgadas, sem prejuízo de eventual atuação da Autarquia, em casos concretos, se detectada a necessidade de aprimoramento da transparência da informação relevante e a adequada proteção dos investidores.

Diante disso, a área técnica sugeriu a manutenção da Decisão do Colegiado de 21.12.2021, adicionado que a Requerente, e os demais administradores de FII, não estariam obrigados a amortizar os valores que superem os lucros contábeis por competência. Esse entendimento, na visão da SSE, acabaria por atender, quase na íntegra, o segundo pedido subsidiário da Requerente, no sentido de que "sejam então modulados os efeitos da Decisão para se dar adequado tratamento às diversas consequências jurídicas, práticas e operacionais para administradores, investidores e outros stakeholders da indústria de FII, solução que poderia contar com prévia audiência pública antes de se editar a competente regulação".

Primeiramente, o Colegiado entendeu, por unanimidade, que o pedido de reconsideração da Requerente deve ser conhecido.

Nesse sentido, considerou pertinente examinar as hipóteses de obscuridade e contradição no Voto Condutor e, consequentemente, na própria Decisão. No entendimento do Colegiado, a Decisão, consoante externada, não esclareceu a divergência em relação às áreas técnicas que justificou o provimento parcial do recurso, bem como pareceu reconhecer o limite de atuação da CVM, à luz de sua esfera de competência, ao mesmo tempo em que corroborou a análise quanto à essência econômica da distribuição de resultado sem qualquer limitação quanto aos contornos de sua repercussão estar restrita ao aspecto contábil/informacional. Isso porque, de um lado, o Voto Condutor afirma que a área técnica “ao requerer que a distribuição de resultados do Fundo seja limitada ao lucro passível de distribuição (...) avança indevidamente em aspectos regimentais e jurídicos consolidados nessa indústria” e, de outro, concorda com o PARECER TÉCNICO Nº 13/2021- CVM/SNC/GNC no sentido de que “qualquer valor distribuído acima do valor apurado pelo lucro contábil acumulado, a bem da essência econômica da transação, deve ser apresentado como amortização de cotas”.

À primeira vista, a leitura desse último trecho poderia indicar que o Voto Condutor acompanha integralmente a posição das áreas técnicas, pois o Ofício Interno nº 4/2021/CVM/SSE/SSE-Assessoria não visava vedar a distribuição aos cotistas de valores superiores ao lucro contábil acumulado. A SSE, contudo, determinara que tais distribuições fossem consideradas como operações de amortização (devolução de capital) e não tratadas como distribuição de “renda” ou “rendimentos” aos cotistas, em linha com o trecho do parecer da SNC citado acima, o que, de certo modo, parece coincidir com o apontado pelo Voto Condutor.

Assim, o Colegiado, por unanimidade, reconheceu a existência de obscuridade e contradição a serem tratadas no mérito, e, portanto, estarem presentes hipóteses previstas no art. 10 da Resolução CVM nº 46/2021, e decidiu conhecer e apreciar o Pedido de Reconsideração.

Ao mesmo tempo, o Colegiado enfatizou que o conhecimento do Pedido de Reconsideração se deu única e exclusivamente em razão do reconhecimento das referidas obscuridade e contradição, deixando claro que as hipóteses de reconsideração de decisão do Colegiado restringem-se àquelas exaustivamente previstas no art. 10 da Resolução CVM nº 46/2021. Assim, frisou a impertinência dos demais fundamentos apresentados pela Requerente, notadamente a tentativa de configurar hipótese de poder-dever de revisão pela CVM. Nesse sentido, destacou, ainda, que, conforme bem pontuado pela SSE no Ofício Interno nº 1/2022: (i) “[a] alegação de que não há instâncias para recurso desta decisão, e que por isso o Colegiado deve apreciar a reconsideração como se um novo pedido de Recurso fosse, não encontra amparo nos normativos da CVM, haja vista que o próprio Colegiado já figura como instância recursal para as decisões da área técnica” e o recurso do BTG já foi apreciado por este Colegiado; e (ii) “a dinâmica do sancionador é de aplicação de penalidades ao regulado. No âmbito de um recurso à decisão da área técnica, se discute somente o entendimento e interpretação dos procedimentos adotados pelo administrador sobre determinada matéria”.

O Diretor Alexandre Rangel acrescentou que entende estarem presentes na Decisão, além da obscuridade e contradição reconhecidas acima por unanimidade pelo Colegiado, os demais requisitos previstos no art. 10 da Resolução CVM nº 46/2021, a saber, omissão e erro material. A omissão na Decisão foi identificada, primeiramente, a partir do momento em que o Voto Condutor deixou de indicar se o entendimento que prevaleceu na oportunidade, relativo ao tratamento que deveria ser conferido ao lucro caixa superior ao lucro contábil, geraria efeitos retroativamente, como parecem ter sugerido as áreas técnicas ao longo do processo ao afirmarem que não se tratava de mudança de entendimento. Nesse sentido, não foi esclarecido se, por exemplo, o Fundo e os fundos de investimento imobiliário que tivessem características similares ao do caso deveriam promover a republicação de demonstrações financeiras passadas; ou se deveriam corrigir os informes de rendimentos previamente enviados aos seus milhares de cotistas para que estes pudessem promover os ajustes devidos em suas respectivas situações patrimoniais e de renda; ou se seria exigida qualquer outra medida de cumprimento igualmente desafiador em decorrência do entendimento firmado pelo Voto Condutor. Em complemento, a Decisão também foi omissa porque não apontou de que forma o entendimento poderia ser operacionalizado, ignorando o fato de que diversas informações necessárias ao tratamento do montante de lucro caixa como amortização de cotas não são disponibilizadas à Requerente e que a amortização consubstancia matéria de competência do gestor (nos termos do regulamento do Fundo) e de assembleia geral de cotistas, sendo tema estranho às atribuições do administrador fiduciário. As omissões listadas acima, segundo o Diretor, conduzem à conclusão de que se faz presente uma impossibilidade objetiva e prática de cumprimento da Decisão nos contornos em que foi proferida. Já o erro material, na visão do Diretor, fica demonstrado a partir da constatação de que a Decisão viola frontalmente o comando inscrito no art. 10, parágrafo único, da Lei n° 8.668/1993, que obriga a distribuição do lucro caixa de acordo com os parâmetros ali estabelecidos, o que não se confunde com qualquer modalidade de amortização de cotas. O Diretor Otto Lobo acompanhou os fundamentos do Diretor Alexandre Rangel acima.

Após a reanálise das questões de mérito, à luz da obscuridade e da contradição suscitadas, o Colegiado, ainda que com visões distintas sobre alguns dos fundamentos, convergiu, por unanimidade, em relação à reconsideração da Decisão no sentido de deixar de impor que a distribuição do chamado “lucro caixa” em montante superior ao lucro contábil do exercício adicionado dos lucros acumulados do exercício anterior ou, na hipótese de prejuízo contábil, todo o lucro caixa distribuído (em ambas hipóteses doravante referido como “Lucro Caixa Excedente”) seja contabilizada como amortização de cotas ou devolução de capital, conforme o Voto Condutor, bem como quanto à necessidade de aprimoramento sob o aspecto informacional.

Nesse contexto, o Colegiado observou, primeiramente, que a análise do presente caso por esta CVM deve se restringir às matérias circunscritas ao seu âmbito de competência.

Ao reexaminarem a questão, o Presidente Marcelo Barbosa e a Diretora Flávia Perlingeiro consideraram que o cerne da controvérsia a respeito da interpretação do comando legal sob análise reflete, de certo modo, uma lacuna no próprio parágrafo único do art. 10 da Lei nº 8.668/1993, incluído pela Lei nº 9.779/1999, que, como apontado no Voto Condutor, “emprega terminologia imprecisa, com potencial de gerar tratamentos significativamente distintos” quando se refere aos “lucros auferidos, apurados segundo o regime de caixa, com base em balanço ou balancete semestral”, sem deixar claro como a distribuição desse “lucro caixa” deve ser tratada contabilmente.

Pontuaram que o art. 10, parágrafo único, da Lei nº 8.668/1993, ao dispor que “[o] fundo deverá distribuir a seus quotistas, no mínimo, noventa e cinco por cento dos lucros auferidos, apurados segundo o regime de caixa, com base em balanço ou balancete semestral encerrado em 30 de junho e 31 de dezembro de cada ano”, disciplinou apenas o regime de apuração (regime de caixa) e o montante mínimo (95%) do “lucro caixa” a ser distribuído aos cotistas.

Anteriormente, ao interpretar o dispositivo legal em questão, por meio do Ofício Circular/CVM/SIN/SNC/Nº 01/2014 (“Ofício Circular 01/2014”), as área técnicas se manifestaram no sentido de que a determinação da “base de distribuição prevista no art. 10º, p.u., da Lei 8.668/93 [...] deverá partir do resultado contábil (lucro ou prejuízo) apurado pelo regime de competência em um determinado período e ajustá-lo pelos efeitos das receitas/despesas contabilizadas e ainda não recebidas/pagas no mesmo período de apuração” (grifos aditados).

Nessa linha, ao se referir a “com base em balanço ou balancete”, a lei determinou que o cálculo do lucro a ser distribuído deveria partir de balanço ou balancete elaborado pelo regime de competência e expurgar os lançamentos que não tivessem efeito caixa, conforme orientado no Ofício Circular 01/2014. Além disso, como pontuado pelas áreas técnicas, bem como refletido nos Ofícios CVM de 2014 e 2015, restou claro que os ajustes positivos ou negativos ao valor justo dos ativos integrantes da carteira do Fundo não impactam o cálculo do “lucro caixa”. Entretanto, ao ver do Presidente Marcelo Barbosa e da Diretora Flávia Perlingeiro, na oportunidade, não foi abordada, nas demonstrações financeiras do fundo, a questão do tratamento contábil da distribuição de Lucro Caixa Excedente.

A esse respeito, conquanto eventual Lucro Caixa Excedente distribuído não reflita “lucro contábil”, reconhecem que, para tanto, se está considerando o resultado contábil apurado pelo regime de competência, na data de corte, em relação ao mesmo período. Entretanto, a seu ver, ao cuidar do adequado tratamento nas demonstrações financeiras do Fundo, o objetivo da Decisão voltava-se à proteção dos investidores, sob o prisma informacional e, nesse sentido, a Decisão não tencionava repercutir em procedimentos do Fundo que interferissem ou restringissem a aplicação do tratamento fiscal conferido por lei à distribuição do “lucro caixa”. Ao contrário, como reconhecido, desde o início, pelas áreas técnicas, pelo Voto Condutor e, assim, também na Decisão, não cabe à CVM interpretar nem aplicar as disposições legais para fins tributários.

Para ambos, isso, contudo, não quer dizer que, após todo o detalhamento trazido aos autos a respeito das possíveis repercussões operacionais e tributárias que o tratamento contábil referido no Voto Condutor poderia vir a implicar e, ainda, diante da ausência de um regime legal que estabeleça de modo inequívoco tratamentos apartados para os referidos conceitos e suas repercussões (como ocorre, por exemplo, no âmbito das companhias, em relação aos conceitos de lucro líquido e de lucro real), a CVM não possa reexaminar o referido tratamento contábil para assegurar que o regime informacional cumpra sua função, tanto sob o prisma contábil quanto pela forma de divulgação da informação aos investidores.

Nesse contexto, sopesando todos os relevantes aspectos envolvidos, o Presidente Marcelo Barbosa e a Diretora Flávia Perlingeiro concluíram que não deve ser imposto o reconhecimento contábil de amortização de cotas ou devolução de capital, mas deve ser assegurada divulgação adequada às distribuições de Lucro Caixa Excedente, por tratar-se de informação sobre a realidade econômica do fundo útil para a tomada de decisão pelos investidores.

Quanto aos fundamentos de mérito para deferimento do Pedido de Reconsideração, o Diretor Alexandre Rangel fez referência integral ao seu voto proferido em oposição ao Voto Condutor quando da Decisão. Na oportunidade, registrou seu entendimento, em suma, de que (i) o Fundo seguiu a determinação que consta expressamente da Lei n° 8.668/1993, diploma que não apresenta qualquer ressalva que condicione a distribuição obrigatória do lucro ali previsto ao resultado positivo de regime contábil diverso daquele previsto no texto legal; (ii) o procedimento adotado pela Requerente no âmbito do Fundo, de distribuição obrigatória do lucro caixa calculado de acordo com a Lei n° 8.668/1993 ainda que em montante superior ao lucro contábil, observou, literalmente, o entendimento divulgado pelas áreas técnicas da CVM por meio do Ofício Circular 01/2014, como confirmado pelos auditores independentes que analisaram o tema como um dos principais pontos de auditoria; e (iii) a sinalização pela Autarquia de que valores já distribuídos por fundos de investimento imobiliário como lucro, na verdade, somente poderiam ter sido distribuídos sob outra rubrica – além de equivocada, pois confronta o texto legal, o ofício circular supracitado e a prática consolidada na indústria – gera insegurança jurídica, com possíveis implicações sistêmicas.

Em complemento, como desdobramentos mais específicos e pormenorizados dos fundamentos adotados em seu voto proferido anteriormente, em sentido contrário à Decisão, o Diretor Alexandre Rangel acrescentou que a natureza jurídica dos fundos de investimento imobiliário é distinta das sociedades anônimas, por expressa disposição legal, o que não pode ser relativizado ou ignorado pela ciência contábil. Como condomínios, seguindo um arcabouço legal e regulatório próprio, os fundos de investimento imobiliários não possuem capital social, personalidade jurídica, credores, nem diversas outras características típicas das sociedades anônimas. Desse modo, os regimes jurídico e contábil aplicáveis a este tipo societário, principalmente no que se refere à distribuição de lucros e intangibilidade do capital social, não podem ser transpostos para os fundos de investimento imobiliário. Na visão do Diretor, parece ter sido essa a premissa adotada pelo Ofício Circular 01/2014, quando previu que a base de distribuição do art. 10, parágrafo único, da Lei n° 8.668/1993 “deverá partir do resultado contábil (lucro ou prejuízo) apurado pelo regime de competência”, admitindo – literal e expressamente – que também o prejuízo contábil apurado pelo regime de competência pode ser o ponto de partida para fins de cálculo do lucro caixa.

Ademais, prosseguiu o Diretor Alexandre Rangel, no cenário perfeitamente possível em que (i) o lucro contábil jamais se reestabeleça em níveis superiores ao lucro caixa, algo que pode ocorrer por diversos motivos, inclusive se as avaliações a valor justo dos ativos integrantes da carteira do fundo não retornarem aos seus valores de precificação originalmente contratados; e (ii) o fundo continue a apurar o lucro caixa de acordo com a imposição legal, estaríamos diante da situação em que o tratamento do lucro caixa como amortização de cotas, tal como proposto pela Decisão ora reconsiderada, conduziria a uma inusitada rubrica zerada de cotas integralizadas nas demonstrações financeiras dos fundos. Considerando que todo o principal do investimento realizado pelos cotistas teria sido devolvido, com suas cotas integralmente amortizadas (resgatadas, no caso), haveria a situação inconcebível de um veículo de investimento sem investidores; um condomínio sem condôminos; uma entidade auditada pelo regime de competência cujas cotas integralizadas seriam contabilizadas a zero; ou, então, um investimento avaliado a zero do ponto de vista do cotista, que, no entanto, após o resgate de suas cotas, não apenas permaneceria como cotista, como também voltaria a receber lucro caixa, já que esse montante previsto na Lei n° 8.668/1993 não mais poderia ser definido como amortização de algo que já se devolveu por completo.

Encerrando suas ponderações de mérito sobre o caso, o Diretor Alexandre Rangel posicionou-se no sentido de que a ciência contábil não pode desconsiderar uma realidade jurídica mandatória imposta pela legislação especificamente aplicável aos fundos de investimento imobiliários, não existindo qualquer hierarquia ou sobreposição entre os regimes contábeis de caixa e de competência. Naturalmente, compreende-se a predileção pelo regime de competência para retratar a situação econômico-financeira e patrimonial das entidades auditadas em geral, promovendo o casamento entre receitas e despesas, sob um aspecto temporal, de forma mais precisa e fidedigna. Não se questiona a relevância do regime de competência, inclusive com relação aos fundos de investimento, cujas demonstrações financeiras são elaboradas e auditadas, por exigência legal e regulatória, de acordo com o referido regime contábil. De todo modo, não existe qualquer embasamento jurídico para que tal postura se materialize em detrimento ou em contraposição daquilo que se resume a uma questão definida propriamente em lei, de interpretação literal, histórica e sistêmica de um texto legal. Lembrou o Diretor, nesse sentido, que a Lei n° 8.668/1993 escolheu, pelas razões abertamente declaradas em sua exposição de motivos, o regime de caixa como aquele que seria utilizado para fins de cálculo e distribuição do lucro ali previsto. Trata-se de opção, além de clara, também coerente com o histórico de criação dos fundos de investimento imobiliários, que surgiram como forma de emular, no âmbito do mercado de valores mobiliários, os efeitos dos investimentos diretos em ativos imobiliários, sendo justamente a renda um dos principais fatores que explicam o até agora bem-sucedido progresso dessa indústria.

O Diretor Otto Lobo acompanhou os fundamentos da manifestação do Diretor Alexandre Rangel.

O Diretor Otto Lobo manifestou seu entendimento de que os fundos de investimento imobiliário possuem características especiais com relação aos demais. Tanto assim que a Lei nº 8.668/1993 estabeleceu que estes seriam: (i) fechados; (ii) com patrimônio de afetação, pois os seus bens são adquiridos pelo administrador do fundo em caráter fiduciário; (iii) com a obrigação de distribuir aos cotistas no mínimo, 95% (noventa e cinco por cento) dos lucros auferidos pelo Fundo; (iv) os cotistas não respondem por quaisquer obrigações legais ou contratuais relativamente ao imóveis e/ou empreendimento do Fundo, salvo a obrigação de integralizar as cotas subscritas; e (v) com um regime fiscal mais benéfico para incentivar o investimento por pequenos investidores pessoa física. Tais características especiais tinham por objetivo (i) garantir aos cotistas o recebimento de rendimentos de forma perene; (ii) a proteção do patrimônio dos cotistas, o que não ocorria nas demais modalidades de fundos de investimento; e (iii) a criação de um regime fiscal mais favorável de forma a incentivar os investimentos. Especificamente com relação à garantia de recebimento de rendimentos de forma perene, a lei estabeleceu que os lucros auferidos pelo fundo deveriam ser apurados com base no regime de caixa. Ao optar pelo regime de caixa, o legislador afastou da apuração dos lucros do fundo de investimento imobiliário todas as perdas contábeis que transitam pelo resultado e que não tem efeito caixa. Tal entendimento foi refletido no Ofício Circular 01/2014. Assim, mesmo que a contabilidade dos fundos de investimento imobiliários seja feita com base no regime de competência para fins de informação aos cotistas, a apuração do lucro para efeito de distribuição dos rendimentos aos cotistas deve ser feita com base no regime de caixa, devendo o resultado contábil ser ajustado para excluir da sua apuração os lucros ou prejuízos contábeis sem efeito caixa, tais como o resultado das reavaliações dos ativos a valor justo, sejam eles positivos ou negativos de modo que os resultados sejam distribuídos como lucro e não como amortização de cotas.

Em relação aos aspectos informacionais, o Colegiado, por unanimidade, considerou necessário orientar o administrador fiduciário no sentido de que promova, prospectivamente, aprimoramentos que assegurem aos investidores clareza quanto a que tal parcela da distribuição de Lucro Caixa Excedente (se houver), calculada de acordo com a Lei n° 8.668/1993, foi superior ao lucro contábil, de modo a evitar a falta de conteúdo informacional mínimo, necessário e suficiente para a tomada de decisão pelos investidores.

Nessa linha, reconheceu que esse objetivo pode ser alcançado por meio de divulgação de subcontas na linha do Patrimônio Líquido (PL) relativa a lucro/prejuízo acumulado segregando (i) a distribuição de lucro que correspondeu a lucro contábil distribuído e (ii) a distribuição do Lucro Caixa Excedente (se houver) distribuído ao amparo da Lei nº 8.668/1993, acrescentando, em nota explicativa às demonstrações financeiras do Fundo, informações elucidativas acerca de tais valores.

E, ainda, com o objetivo de complementar o regime informacional e conferir ampla transparência aos investidores, dentro das competências atribuídas a esta CVM nos termos da Lei nº 6.385/1976, entendeu o Colegiado que esclarecimentos devem ser divulgados pelo administrador fiduciário do Fundo, nos avisos ou informes enviados aos cotistas, de modo a possibilitar fácil compreensão no sentido de que os valores de Lucro Caixa Excedente distribuídos (se houver) superam o lucro contábil, que pode ser impactado por avaliações a valor justo, dentre outros eventos contábeis, bem como esclarecimentos quanto aos riscos envolvidos.

Por fim, o Colegiado sinalizou que essa questão informacional deverá entrar oportunamente na pauta regulatória da Autarquia, para fins de padronização e aprimoramento das regras aplicáveis, dentro de uma revisão mais ampla da Instrução CVM n° 516/2011, no âmbito de audiência pública.

Ante o exposto, o Colegiado, por unanimidade, deu provimento ao pedido de reconsideração da Requerente, e, reconsiderando entendimento da Decisão anterior, decidiu reconhecer a regularidade do tratamento contábil dado à distribuição de Lucro Caixa Excedente em prejuízos/lucros acumulados, e não como amortização de cotas integralizadas, observadas, prospectivamente, as considerações feitas a respeito dos aspectos informacionais necessários à adequada proteção dos investidores, dada a coexistência de elementos pertinentes a regimes distintos de apuração e distribuição de lucros pelo Fundo.

PROPOSTA DE CELEBRAÇÃO DE ACORDO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA ENTRE A CVM E A ASSOCIAÇÃO BM&F – PROC. SEI 19957.008560/2019-50

Reg. nº 2585/22
Relator: SOI

O Colegiado aprovou, por unanimidade, a celebração de Acordo de Cooperação Técnica entre a CVM e a Associação BM&F, com o objetivo de estabelecer mecanismos de cooperação e de organização de atividades conjuntas de educação e inclusão financeiras, no âmbito de suas competências, podendo abranger, entre outros, eventos, cursos, palestras, conferências, seminários, oficinas, concursos, premiações acadêmicas, estudos, pesquisas e projetos de natureza técnica que fortaleçam as capacidades de diagnóstico, formulação, implementação e avaliação de políticas públicas educacionais e de proteção de investidores.

PROPOSTA DE CELEBRAÇÃO DE ACORDO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA ENTRE A CVM E A BSM SUPERVISÃO DE MERCADOS – PROC. SEI 19957.000464/2022-69

Reg. nº 2579/22
Relator: SIN

O Colegiado aprovou, por unanimidade, a celebração de Acordo de Cooperação Técnica entre a CVM e a BSM Supervisão de Mercados, cujo objetivo é o estabelecimento de mecanismos de cooperação e de organização das atividades de fiscalização exercidas entre os partícipes, no âmbito de suas competências, relativamente às informações sobre as carteiras dos fundos de investimentos enviadas por estes para a CVM, conciliadas com as informações sobre os valores mobiliários, as posições em derivativos e os demais instrumentos financeiros registrados e depositados junto à B3 S.A. – Brasil, Bolsa, Balcão.

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SNC EM PROCESSO DE MULTA COMINATÓRIA – DOMINUS AUDITORIA, CONSULTORIA E TREINAMENTO S/S – EPP – PROC. SEI 19957.004259/2022-72

Reg. nº 2583/22
Relator: SNC

Trata-se de recurso interposto por Dominus Auditoria, Consultoria e Treinamento contra decisão da Superintendência de Normas Contábeis e de Auditoria – SNC de aplicação de multa cominatória no valor de R$ 3.400,00 (três mil e quatrocentos reais), em decorrência do não envio no prazo regulamentar, estabelecido no art. 1º, inciso II, da Instrução CVM nº 510/2011, vigente à época, da Declaração de Conformidade referente ao ano de 2021.

O Colegiado, com base na manifestação da área técnica, consubstanciada no Parecer Técnico nº 76/2022-CVM/SNC/GNA, deliberou, por unanimidade, pelo não provimento do recurso e a consequente manutenção da multa aplicada.

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SNC EM PROCESSO DE MULTA COMINATÓRIA – M.L.C. – PROC. SEI 19957.003961/2022-19

Reg. nº 2581/22
Relator: SNC

Trata-se de recurso interposto por M.L.C. contra decisão da Superintendência de Normas Contábeis e de Auditoria – SNC de aplicação de multa cominatória no valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais), em decorrência do não envio no prazo regulamentar, estabelecido no art. 1º, inciso II, da Instrução CVM nº 510/2011, vigente à época, da Declaração de Conformidade referente ao ano de 2021.

O Colegiado, com base na manifestação da área técnica, consubstanciada no Parecer Técnico nº 74/2022-CVM/SNC/GNA, deliberou, por unanimidade, pelo não provimento do recurso e a consequente manutenção da multa aplicada.

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SNC EM PROCESSO DE MULTA COMINATÓRIA – M.L.C. – PROC. SEI 19957.003978/2022-76

Reg. nº 2582/22
Relator: SNC

Trata-se de recurso interposto por M.L.C. contra decisão da Superintendência de Normas Contábeis e de Auditoria – SNC de aplicação de multa cominatória no valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais), em decorrência do não envio no prazo regulamentar, estabelecido no art. 16 da Instrução CVM nº 308/1999, vigente à época, das Informações Periódicas Anuais de 2021 (ano-base 2020).

O Colegiado, com base na manifestação da área técnica, consubstanciada no Parecer Técnico nº 75/2022-CVM/SNC/GNA, deliberou, por unanimidade, pelo não provimento do recurso e a consequente manutenção da multa aplicada.

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SNC EM PROCESSO DE MULTA COMINATÓRIA – REIS CONSULTORIA, AUDITORIA AUDITORES INDEPENDENTES – PROC. SEI 19957.003752/2022-75

Reg. nº 2584/22
Relator: SNC

Trata-se de recurso interposto por Reis Consultoria, Auditoria Auditores Independentes contra decisão da Superintendência de Normas Contábeis e de Auditoria – SNC de aplicação de multa cominatória no valor de R$ 5.700,00 (cinco mil e setecentos reais), em decorrência do não envio no prazo regulamentar, estabelecido no art. 16 da Instrução CVM nº 308/1999, vigente à época, das Informações Periódicas Anuais de 2021 (ano-base 2020).

O Colegiado, com base na manifestação da área técnica, consubstanciada no Parecer Técnico nº 61/2022-CVM/SNC/GNA, deliberou, por unanimidade, pelo não provimento do recurso e a consequente manutenção da multa aplicada.

RECURSO EM PROCESSO DE MECANISMO DE RESSARCIMENTO DE PREJUÍZOS – S.R.P.V.N.F. / XP INVESTIMENTOS CCTVM S.A. – PROC. SEI 19957.006697/2020-11

Reg. nº 2580/22
Relator: SMI/GME

 Trata-se de recurso interposto por S.R.P.V.N.F. ("Reclamante " ou "Recorrente") contra decisão da BSM Supervisão de Mercados ("BSM") que indeferiu seu pedido de ressarcimento de prejuízos, no âmbito do Mecanismo de Ressarcimento de Prejuízos ("MRP"), movido em face da XP Investimentos CCTVM S.A. ("Corretora" ou "Reclamada").

Em sua reclamação inicial, o Reclamante alegou, em síntese, que teria ocorrido erro em execução de ordem por parte da Corretora envolvendo 3 contratos WINJ19, tendo apontado duas hipóteses para tal erro: (i) um atraso de 19 horas na execução de uma ordem TakeProfit encaminhada no dia anterior, 16.04.2019; ou (ii) a Reclamada teria criado uma ordem em seu nome sem sua autorização. Assim, requereu ressarcimento no valor estimado de R$ 1.136,48 (mil cento e trinta e seis reais e quarenta e oito centavos).

Após receber a defesa da Reclamada, a BSM elaborou Relatório de Auditoria, que concluiu que: (i) quanto à não execução da ordem TakeProfit no dia 16.04.2019, tendo em vista que as informações disponibilizadas pela Corretora atenderam apenas parcialmente à solicitação da BSM, não foi possível reconstruir com precisão o que ocorreu com tal ordem. Contudo, observou que após o disparo do gatilho da ordem, a plataforma registrou sucessivas falhas de processamento; (ii) com relação às condições de mercado, caso a ordem de compra de 3 WINJ19 por 94.445 pontos tivesse sido enviada à B3, teria sido executada no pregão de 16.04.2019 e , nessa hipótese, o resultado obtido pelo Reclamante teria sido um prejuízo de R$ 123,60 (cento e vinte e três reais e sessenta centavos); e (iii) em relação à ordem de compra executada no dia 17.04.2019, a trilha disponibilizada demonstraria que a inserção da ordem teria sido feita pelo próprio Reclamante.

Com base nessas conclusões, a Superintendência Jurídica da BSM – SJUR analisou o mérito do caso sob duas perspectivas: (i) inexecução da ordem de compra de 3 WINJ19 no pregão de 16.04.2019 ("Ordem 1"); e (ii) execução da ordem de compra de 3 WINJ19 no pregão de 17.04.2019 ("Ordem 2"). A esse respeito, a SJUR entendeu que: (i) em relação à Ordem 1, tratou-se de hipótese de inexecução indevida, mas que, pelo fato de tal falha ter prevenido um prejuízo do investidor, não haveria ressarcimento a ser determinado; e (ii) em relação à Ordem 2, não haveria vício de origem, visto que a Ordem 2 teria sido gerada pelo próprio Reclamante, via sessão DMA - a qual exige login e senha do cliente -, o que afastaria a hipótese de execução de operação sem o comando do cliente.

Dessa forma, o Diretor de Autorregulação da BSM – DAR, acompanhando a opinião da SJUR, julgou improcedente o pedido do Reclamante, nos termos do art. 77 da Instrução CVM nº 461/2007.

Em seu recurso à CVM, o Recorrente sustentou que, ao enfrentar problemas na plataforma de negociação, acompanhou sua posição no restante do pregão por meio do Home Broker, tendo seu problema sido aparentemente resolvido e que, assim, não haveria necessidade de entrar em contato com canais alternativos. Ademais, defendeu que, provavelmente, a Ordem 2 teria sido um atraso de 19 horas na execução da Ordem 1.

Em análise consubstanciada no Ofício Interno nº 20/2022/CVM/SMI/GME, a Superintendência de Relações com o Mercado e Intermediários – SMI destacou, de início, que apesar de a Reclamada ter sido solicitada pela BSM a apresentar os logs que contivessem os registros do andamento da ordem após a sua inserção em seu OMS, ela não produziu tal informação.

Ademais, conforme indicado no Relatório de Auditoria, a ordem objeto da reclamação que não foi executada no dia 16.04.2019 possuía o mesmo número daquela constante dos logs da plataforma Metatrader 5 e que identifica a ordem executada no início do dia 17.04.2019, cuja origem é disputada pelo Recorrente. Desse modo, a SMI entendeu que assistiria razão ao Recorrente em sua afirmação de que a "Ordem 2" não deveria ter sido considerada como um evento independente da "Ordem 1", mas sim como uma execução tardia desta, visto que a ordem gerada por ele em 16.04.2019 somente foi processada na manhã do dia 17.04.2019.

Por fim, a área técnica ressaltou que, apesar de a Reclamada afirmar em sua defesa que o Recorrente teria deixado de acessar os canais de contingência, tal dimensão não se mostraria relevante no caso concreto, visto que, nos termos do contrato de uso da plataforma, a Reclamada orienta os investidores a, em caso de divergências, considerar as informações do Home Broker. Assim, o Recorrente, ao verificar que a ordem não estava no Home Broker ao final do dia, estava legitimado a presumir que ela não retornaria no dia seguinte.

Ante o exposto, a SMI propôs o provimento parcial do pedido apresentado, para que fosse determinado o ressarcimento ao Recorrente no valor de 872,88 (oitocentos e setenta e dois reais e oitenta e oito centavos), conforme explicitado nos itens 25 e 26 do Ofício Interno nº 20/2022/CVM/SMI/GME, sobre o qual deverão ser acrescidos juros e atualização monetária, na forma prevista no Regulamento de MRP à época dos fatos.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando a manifestação da área técnica, deliberou pelo provimento parcial do recurso, com a consequente reforma da decisão da BSM.

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