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ATA DA REUNIÃO DO COLEGIADO Nº 8 DE 28.02.2023

Participantes

• JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTO – PRESIDENTE
• FLÁVIA MARTINS SANT'ANNA PERLINGEIRO – DIRETORA
• ALEXANDRE COSTA RANGEL – DIRETOR
• OTTO EDUARDO FONSECA DE ALBUQUERQUE LOBO – DIRETOR
• JOÃO CARLOS DE ANDRADE UZÊDA ACCIOLY – DIRETOR

Outras Informações

Foi sorteado o seguinte processo:
 

PAS
Reg. 2802/23 - 19957.005524/2022-30 - DOL


Ata divulgada no site em 19.04.2023, exceto:

- Decisão referente ao Processo 19957.007423/2021-12 (Reg. 2672/22) divulgada em 28.02.2023; e

- Decisão referente ao Processo 19957.009206/2018-61 (Reg. 2139/21) divulgada em 10.03.2023.

APRECIAÇÃO DE PROPOSTA DE TERMO DE COMPROMISSO – PAS 19957.008434/2019-03

Reg. nº 2200/21
Relator: SGE

A Diretora Flávia Perlingeiro se declarou impedida por ter sido consultada sobre fatos relacionados a aspecto tratado neste Processo Administrativo Sancionador (PAS) na época em que atuava como advogada do Sistema BNDES / BNDES Participações S.A., entidade que, na qualidade de acionista das companhias JBS e Bertin, é especificamente nomeada na descrição dos fatos subjacentes ao PAS, ainda que, no caso, não seja peticionante, recorrente ou acusada.

Trata-se de proposta conjunta de termo de compromisso apresentada por Joesley Mendonça Batista (“Joesley Batista”), Wesley Mendonça Batista (“Wesley Batista”), na qualidade de acionistas controladores da Blessed Holdings LLC (“Blessed Holdings”), e Gilberto de Souza Biojone Filho (“Gilberto Biojone” e, em conjunto com os demais, “Proponentes”), na qualidade de Representante Legal no Brasil da Blessed Holdings, no âmbito de Inquérito Administrativo instaurado pela Superintendência de Processos Sancionadores – SPS, no qual há outros acusados que não apresentaram propostas para celebração de termo de compromisso.

A SPS propôs a responsabilização dos Proponentes conforme abaixo:

(i) Joesley Batista e Wesley Batista, por terem ordenado a realização de operações caracterizadas, em tese, como fraudulentas, no âmbito das operações de incorporação da Bertin S.A. pela JBS S.A., com cotas do Bertin FIP, em possível infração ao item I da então vigente Instrução CVM n° 8/1979, nos termos descritos no item II, “c”, dessa Instrução; e

(ii) Gilberto Biojone, por ter participado na realização de operações caracterizadas, em tese, como fraudulentas, no âmbito das operações de incorporação da Bertin S.A. pela JBS S.A., com cotas do Bertin FIP, em nome da Blessed Holdings LLC, por ordem de Joesley Batista e Wesley Batista, em possível infração ao item I da então vigente Instrução CVM n° 8/1979, nos termos descritos no item II, “c”, dessa Instrução.

Após apresentarem suas razões de defesa e o processo ter sido distribuído ao Diretor Relator, os Proponentes apresentaram proposta conjunta para celebração de termo de compromisso na qual propuseram pagar à CVM o valor de R$ 3.000.000,00 (três milhões de reais) para Joesley Batista, R$ 3.000.000,00 (três milhões de reais) para Wesley Batista e R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) para Gilberto Biojone, a título de indenização referente aos danos difusos em tese causados na espécie.

O Diretor Relator, nos termos do art. 84, §2°, da Resolução CVM n° 45/2021 (“RCVM 45”), encaminhou a proposta para a Superintendência Geral para que fosse adotado o trâmite de que trata o art. 83 da RCVM 45.

Em razão do disposto no art. 83 da RCVM 45, a Procuradoria Federal Especializada junto à CVM – PFE/CVM apreciou, à luz do art. 11, §5º, incisos I e II, da Lei nº 6.385/1976, os aspectos legais da proposta apresentada, tendo opinado pela existência de óbice jurídico para celebração de termo de compromisso.

Nesse sentido, a PFE/CVM destacou que “a severa diluição imposta aos minoritários, resultante das operações tidas como ilegais investigadas pela CVM, bem como a gravidade das infrações (...) associada à ausência de qualquer proposta de desfazimento das operações e correção das irregularidades, comprometem a legalidade da celebração do Termo de Compromisso nas condições propostas, sendo certo que a correção das premissas adotadas pela acusação demanda revolver todo o conjunto fático-probatório, consistindo, portanto, em análise de mérito da acusação, incabível em sede de Termo de Compromisso”.

A PFE/CVM também observou que, “ainda que se considere que a questão poderia ser resolvida mediante indenização exclusivamente pela via dos danos difusos, caso comprovada a impossibilidade de indenização individual dos acionistas prejudicados, o [Relatório da SPS] aponta que a vantagem econômica auferida pelas operações fraudulentas seria da ordem de quase dois bilhões de reais, (...) valor que sequer se aproxima do montante ofertado a título de indenização pelos proponentes.”.

Ademais, a PFE/CVM registrou que a proposta foi apresentada fora do prazo constante do art. 82, §2º, da Resolução CVM nº 45/2021, tendo destacado, entretanto, que o Colegiado da CVM poderia, em casos excepcionais, analisar a proposta de celebração do ajuste, conforme previsto no art. 84 da mesma Resolução. Diante disso, o Comitê de Termo de Compromisso (“Comitê”), à luz das circunstâncias do caso concreto, entendeu que seria oportuno e conveniente propor ao Colegiado a superação da preliminar de intempestividade.

O Comitê, em 31.01.2023, considerando (i) o óbice jurídico apontado pela PFE/CVM; e (ii) a gravidade, em tese, do caso, que envolve possíveis operações fraudulentas, que inclusive teriam ocasionado, em tese, diluição indevida de participações de acionistas minoritários, entendeu não ser conveniente e nem oportuna a celebração de termo de compromisso proposta e que a melhor saída para o caso em tela seria um pronunciamento do Colegiado em sede de julgamento. Desse modo, o Comitê sugeriu ao Colegiado a rejeição da proposta conjunta apresentada pelos Proponentes.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando a conclusão do parecer do Comitê, deliberou rejeitar a proposta de termo de compromisso apresentada tendo em vista o óbice jurídico apontado pela PFE/CVM.

APRECIAÇÃO DE PROPOSTAS DE TERMO DE COMPROMISSO – PAS 19957.009206/2018-61

Reg. nº 2139/21
Relator: DFP

Trata-se de novas propostas de termo de compromisso (“TC”) apresentadas, em 05.12.2022, conjuntamente por Nelson Sequeiros Rodriguez Tanure (“Nelson Tanure”) e Nelson de Queiroz Sequeiros Tanure (“Nelson de Queiroz”) e, em 06.12.2022, por Blener Braga Cardoso Mayhew (“Blener Mayhew” e, em conjunto com os demais, “Proponentes”), no âmbito de Processo Administrativo Sancionador (“PAS”) instaurado pela Superintendência de Processos Sancionadores – SPS.

No âmbito do PAS, apuram-se responsabilidades por alegadas infrações (i) aos arts. 10 e 12 da Instrução CVM (“ICVM”) nº 358/2002; (ii) ao art. 116, p.ú., da Lei nº 6.404/1976 (“LSA”); (iii) ao art. 1º, inciso III, e p.ú., inciso I, da ICVM n° 491/2011; (iv) ao item 15.1 ou, alternativamente, ao item 15.2, e ao item 12.5, do Anexo 24 da ICVM nº 480/2009; e (v) ao art. 154 da LSA.

Os Proponentes já haviam apresentado propostas de TC no PAS (“Propostas Originais”), as quais foram submetidas à apreciação da Procuradoria Federal Especializada junto à CVM – PFE/CVM e do Comitê de Termo de Compromisso (“CTC” ou “Comitê”). À época, durante as tratativas de negociação, perante o CTC, das contrapartidas inicialmente ofertadas, Blener Mayhew desistiu de sua proposta. As negociações tiveram prosseguimento com os demais Proponentes, os quais, porém, também desistiram posteriormente de suas respectivas propostas, ao lhes ser comunicado que o CTC proporia ao Colegiado a rejeição das propostas finais de contrapartidas oferecidas.

As novas propostas apresentadas contemplaram o oferecimento de contrapartidas financeiras nos montantes de R$ 3.000.000,00 (três milhões de reais) por Nelson Tanure, R$ 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil reais) por Nelson de Queiroz e R$ 850.000,00 (oitocentos e cinquenta mil reais) por Blener Mayhew (em conjunto, “Novas Propostas”).

Ao apresentarem sua nova proposta, Nelson Tanure e Nelson de Queiroz argumentaram, em suma, que as contrapartidas aventadas pelo CTC anteriormente para composição com os Proponentes foram desproporcionais e irrazoáveis. Além disso, encaminharam (i) estudo de jurimetria; (ii) análise de jurisprudência da CVM em casos de embaraço à fiscalização; e (iii) levantamento de TCs celebrados pela CVM entre 01.01.2011 e 02.06.2021 (em conjunto, “Estudos de Precedentes”).

Blener Mayhew, a seu turno, alegou, em síntese: (i) que, no âmbito da negociação anterior, entendeu que as obrigações sugeridas pelo CTC onerá-lo-iam para além das finalidades educativa e preventiva do instrumento; (ii) vislumbra economia processual na aceitação dessa nova proposta; e (iii) considerando as peculiaridades do caso concreto, o valor ora proposto está em linha com o aceito pelo Colegiado da CVM em casos envolvendo as infrações imputadas.

As Novas Propostas foram submetidas à manifestação da PFE/CVM, quanto aos aspectos de legalidade, nos termos do art. 84, caput e §1º, da Resolução CVM (“RCVM”) nº 45/2021. Em síntese, em sua nova manifestação, concluiu que, no caso concreto, ao ver da PFE/CVM, não se mostram presentes os pressupostos que autorizam a adoção de solução consensual pela Administração Pública, haja vista que: (i) não há direito subjetivo à celebração de acordo; (ii) não se vislumbra pacificação social com a celebração do acordo; e (iii) não há ganhos de celeridade e eficiência, tratando-se de proposta extemporânea, apresentada poucos dias antes da data originalmente designada para o julgamento do PAS.

Nesse contexto, a Diretora Relatora Flávia Perlingeiro submeteu as Novas Propostas apresentadas pelos Proponentes à apreciação do Colegiado, nos termos do art. 84, caput e §1º, da RCVM nº 45/2021.

Em seu voto, a Relatora destacou que, embora seja em tese possível, excepcionalmente, o recebimento e processamento de propostas de TC apresentadas fora do prazo ordinário, no seu entendimento, “numa fase processual tão avançada como a presente, eventual negociação de novas propostas de TC se justificaria somente diante da presença de inequívoco interesse público, como, por exemplo, num caso em que a acusação tivesse quantificado danos a investidores decorrentes da infração imputada aos acusados e a proposta contemplasse a oferta de indenização integral aos lesados, como exemplifica o próprio caput do art. 84 da RCVM nº 45/2021”. Isto posto, a Relatora ressaltou não vislumbrar, no caso concreto, em que medida a negociação das Novas Propostas atenderia ao interesse público.

No mesmo sentido, a Relatora observou que a PFE/CVM, ainda que não tenha apontado óbice jurídico quando se manifestou acerca das Propostas Originais, ao opinar sobre as Novas Propostas, não vislumbrou a existência de interesse público a legitimar o seu recebimento nessa fase processual, com a consequente (re)abertura de negociações com os Proponentes.

Além da questão acima apontada, a Relatora considerou que as Novas Propostas deveriam ser igualmente rejeitadas por ausência de oportunidade e conveniência.

Sobre esse ponto, a Relatora ressaltou primeiramente que “não restou evidenciado qualquer ganho processual que justifique a celebração de TC com os Proponentes, nesta etapa processual. O caso está maduro para julgamento e se encontrava, inclusive, pautado para a sessão de 16.12.2022, tendo sido retirado de pauta justamente porque houve a apresentação das Novas Propostas, às vésperas da data então designada para o julgamento”.

Ademais, independentemente do fator temporal, a Relatora entendeu que o presente caso, por suas especificidades, não é vocacionado para encerramento por meio de TC, devendo o seu mérito ser levado a julgamento pelo Colegiado.

Segundo a Relatora, este PAS envolve discussão acerca do descumprimento dos arts. 10 e 12 da então vigente ICVM nº 358/2002, envolvendo a negociação de ações de emissão da Petro Rio S.A. (“Companhia”), em circunstâncias com potencial repercussão orientadora relevante e, ainda, sob uma ótica distinta da vasta maioria de precedentes levados até o momento a julgamento, os quais trataram de situações em que a demonstração das infrações se dava de forma basicamente objetiva, confrontando-se as posições acionárias de um único acionista ou um único gestor de diversos fundos (ou clube de investimentos).

Como explicitado no voto da Relatora, imputa-se responsabilidade a detentor de participação indireta na Companhia, pela omissão na divulgação de negociações de participações acionárias relevantes efetuadas por meio de veículos de investimento que, alegadamente sob seu controle, atuavam, conjuntamente, representando um mesmo interesse. No que tange à infração ao art. 10 da ICVM nº 358/2002, discute-se, ainda, segundo a Relatora, a aplicabilidade da referida norma à hipótese de aquisição indireta de controle, inclusive de modo originário, além do que as infrações teriam sido praticadas num contexto em que supostamente se buscava, de forma premeditada, ocultar a existência de acionista controlador da Companhia e, ainda, de acionistas que atuavam sob um mesmo interesse, envolvendo, notadamente, o exame de indícios, a trazer igualmente contornos distintos ao PAS.

O mesmo racional, segundo a Relatora, se aplica às alegadas infrações a dispositivos da ICVM nº 480/2009 e aos arts. 116, p.ú., e 154 da LSA, que teriam se dado em contexto em que, segundo a acusação, o acionista controlador teria exercido poder de controle fora do âmbito das deliberações assembleares, mediante influência preponderante sobre administrador da companhia, que conhecia a sua condição.

Desse modo, considerando os contornos específicos do caso destacados no voto, que o diferenciam da maioria dos precedentes levados a julgamento, a Relatora ressaltou que “o presente caso configura importante precedente, em que tais aspectos das infrações imputadas aos Proponentes poderão ser analisadas quanto ao mérito dos argumentos da acusação e da defesa, razão pela qual o efeito paradigmático da resposta estatal exigível perante a sociedade em geral e, mais especificamente, os participantes do mercado de valores mobiliários como um todo, dar-se-á, mais adequadamente, por meio de um posicionamento do Colegiado da Autarquia em sede de julgamento”.

Adicionalmente, tendo em vista a ausência de interesse público na reabertura de negociações com os Proponentes e de oportunidade e conveniência no encerramento deste PAS pela via consensual, a Relatora destacou que não caberia avaliar a suficiência ou não das contrapartidas atualmente ofertadas, no âmbito das Novas Propostas.

Não obstante, a Relatora entendeu oportuno esclarecer que, diferentemente do que parecem defender os Proponentes, a avaliação das contrapartidas ofertadas à CVM, em sede de negociações de propostas de TC, não se dá com base em penalidades administrativas (pecuniárias ou não) aplicadas pelo Colegiado em casos assemelhados que tenham sido levados a julgamento, uma vez que não se está diante de um juízo de dosimetria, para fins condenatórios.

Assim, na visão da Relatora, seriam inservíveis para os fins a que se propuseram, as comparações, constantes dos Estudos de Precedentes que instruíram a Nova Proposta apresentada conjuntamente por Nelson Tanure e Nelson de Queiroz, entre penalidades aplicadas em precedentes da CVM e as contrapartidas que, na visão do CTC, seriam suficientes para embasar uma recomendação ao Colegiado de aceitação das Propostas Originais.

Em relação à comparação com anteriores negociações de TC propriamente ditas, igualmente contida nos referidos Estudos de Precedentes, a Relatora salientou que tais negociações conduzidas pelo CTC (ou, por relatores, quando for o caso), ainda que possam ter como ponto de partida exemplos de negociações anteriores bem sucedidas sobre casos análogos, também levam sempre em consideração as particularidades de cada caso concreto.

Por fim, ainda que esse aspecto não seja determinante para fins da referida análise de ausência de conveniência e oportunidade, que se aplica a todos os três Proponentes, a Relatora registrou que “as contrapartidas apresentadas com as Novas Propostas não somente se encontram muito aquém das que o CTC, ao apreciar as Propostas Originais, havia sugerido como aprimoramento, no âmbito da negociação então realizada com os Proponentes, como, especificamente no caso das contrapartidas ora ofertadas pelos proponentes Nelson Tanure e Nelson de Queiroz, representam reduções muito significativas em relação aos valores que tais proponentes haviam oferecido como contrapartida financeira na proposta que apresentaram nos autos deste PAS, durante a referida negociação com o CTC, em substituição às Propostas Originais”.

Diante de todo o exposto, a Relatora votou pela rejeição das Novas Propostas, à luz da ausência de interesse público em sua análise e negociação e, ainda, dada a inexistência de conveniência e oportunidade na solução consensual do PAS.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando o voto da Relatora, deliberou rejeitar as propostas de termo de compromisso apresentadas.

NOVA PROPOSTA DE CELEBRAÇÃO DE ACORDO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA ENTRE A CVM E A FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS - FGV – PROC. 19957.012127/2022-14

Reg. nº 2803/23
Relator: SMI

O Colegiado aprovou, por unanimidade, a celebração de Acordo de Cooperação Técnica entre a CVM e a Fundação Getulio Vargas - FGV, cujo principal objetivo é estabelecer e disciplinar o desenvolvimento de projetos de pesquisa que versem sobre temas relativos ao desenvolvimento do mercado de valores mobiliários, acompanhando a proposta da Área Técnica trazida no Ofício Interno n° 6/2023/CVM/SMI/GMA-2.

PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO DE DECISÃO DO COLEGIADO – CANCELAMENTO DE CREDENCIAMENTO COMO ADMINISTRADOR DE CARTEIRA – MDL TRUST SERVIÇOS FIDUCIÁRIOS LTDA. – PROC. 19957.010091/2022-34

Reg. nº 2692/22
Relator: SIN/GAIN

Trata-se de pedido de reconsideração apresentado por MDL Trust Serviços Fiduciários Ltda. ("MDL") contra a decisão do Colegiado da CVM, de 27.09.2022, que manteve a decisão da Superintendência de Relações com Investidores Institucionais – SIN de cancelamento do credenciamento da MDL como administrador de carteiras de valores mobiliários, com fundamento no art. 9°, IV, § 1º, da Resolução CVM nº 21/2021.

Em resumo, a SIN decidiu pelo cancelamento do registro da MDL como administrador de carteiras de valores mobiliários, tendo em vista (i) a não entrega do relatório sobre a efetividade da manutenção do capital mínimo emitido por auditor independente, exigido para o registro na categoria administrador fiduciário nos termos do § 2º, inciso II, do art. 1º da Resolução CVM nº 21/2021; e (ii) que o saldo apresentado nas contas de patrimônio líquido e de disponibilidades registrados no Balanço Patrimonial de 31/12/2021 eram inferiores aos exigidos pelo referido dispositivo.

Após a referida decisão do Colegiado, a MDL apresentou em 09/11/2022 petição alegando que o descumprimento por parte da instituição ao art. 1°, § 2º, inciso II, da Resolução CVM nº 21/2021, não deveria levar ao cancelamento integral do registro da instituição como prestador do serviço de administração de carteiras de valores mobiliários, e sim apenas a restrição de que a atuação da instituição como prestador do serviço de administração de carteiras de valores mobiliários, na categoria de administrador fiduciário, fique restrita aos tipos de fundos listados no art. 1°, § 2º, inciso III, da Resolução CVM nº 21/2021.

Ao analisar o pedido, nos termos do Ofício Interno nº 6/2023/CVM/SIN/GAIN, a SIN destacou inicialmente que, apesar de a petição apresentada pela MDL não ter as características formais de um pedido de reconsideração, a área técnica entendeu que caberia levar o assunto ao Colegiado, tendo em vista os novos argumentos apresentados.

Nesse sentido, a SIN ressaltou que, de acordo com a Resolução CVM nº 21/2021, a instituição que deseje atuar somente com a administração dos fundos listados no art. 1°, § 2º, inciso III, da referida norma, de fato, não precisa observar a regra de capital mínimo, o que seria o caso da MDL para esses específicos tipos de fundos, por cumprir os demais requisitos exigidos pela norma para prestar o serviço de administração fiduciária para tais fundos.

Desse modo, a SIN opinou pelo deferimento do pedido de reconsideração, de forma a permitir que a MDL continue a prestar o serviço de administração de carteiras de valores mobiliários, na categoria de administrador fiduciário, exclusivamente para os fundos listados no art. 1°, § 2º, inciso III, da Resolução CVM nº 21/2021.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando a manifestação da área técnica, deliberou pelo deferimento do pedido de reconsideração apresentado.

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SEP – IRREGULARIDADE DAS CONDIÇÕES DO AUMENTO DE CAPITAL – GAFISA S.A. – PROC. 19957.004478/2019-56

Reg. nº 1439/19
Relator: DFP

Trata-se de recurso com pedido de concessão de efeito suspensivo (“Recurso”), interposto por Gafisa S.A. (“Gafisa”, “Companhia” ou “Recorrente”) contra manifestação da Superintendência de Relações com Empresas – SEP” (“Área Técnica”) que concluiu pela irregularidade das condições do aumento de capital da Companhia por subscrição privada (“Operação” ou “Aumento de Capital”), deliberado pelo conselho de administração (“CA”) da Companhia em reuniões de 09 e 15.04.2019, e que foi objeto de aviso aos acionistas divulgado em 16.04.2019 (“Aviso Original”).

Em resumo, o Aviso Original informava que o CA da Gafisa havia aprovado o aumento do capital social da Companhia, divulgando as condições da Operação e procedimento a serem adotados pelos acionistas que desejassem subscrever as novas ações.

Ao analisar o Aviso Original, a SEP considerou (i) que havia inconsistências em sua redação, além da falta de informações e documentos exigidos pela Lei nº 6.404/1976 (“LSA”) e pela Instrução CVM (“ICVM”) n° 480/2009, quanto a operações dessa natureza e (ii) que o Aumento de Capital previa a aplicação de dois deságios escalonados sobre o preço de emissão, de maneira que, na prática, a Operação teria três preços de emissão distintos. Ademais, não restou claro para a SEP que critério foi utilizado para a fixação do preço de emissão ou dos bônus sobre ele incidentes.

As falhas e inconsistências identificadas pela Área Técnica foram comunicadas à Companhia, por meio do Ofício nº 86/2019/CVM/SEP/GEA-3, de 18.04.2019 (“Ofício SEP 86”), tendo sido solicitado o refazimento do Aviso Original de forma a que fossem divulgadas ao mercado as informações faltantes e os devidos esclarecimentos.

Na mesma ocasião, a SEP também solicitou que a Gafisa informasse a cronologia dos eventos que culminaram na propositura da Operação, bem como se manifestasse quanto aos dispositivos legais em que se apoiava para a proposição da estrutura de preço de emissão contida no Aviso Original, evidenciando, ainda, a manifestação de comitês e outros órgãos internos acerca da Operação, incluindo os cálculos que ampararam o preço de emissão e bônus.

A Companhia atendeu às referidas solicitações, reapresentando, em 26.04.2019, novo aviso aos acionistas com as informações solicitadas pela SEP (“Aviso Republicado”), e encaminhando, em 03.05.2019, resposta aos demais questionamentos feitos pela Área Técnica. No Aviso Republicado, a Companhia informou que o preço de emissão por ação seguiu a seguinte lógica:

O preço base da emissão será de R$ 6,02 (seis reais e dois centavos) por ação, fixado com base no artigo 170, §1º, incisos I e III, da Lei nº 6.404/76, sendo-lhe aplicado um bônus escalonado: (i) 15% (quinze por cento) aplicado sobre o preço base da emissão no exercício do direito de preferência, a um preço de R$ 5,12 (cinco reais e doze centavos) por ação ON; e (ii) adicional de 3% (três por cento), no valor de R$ 4,96 (quatro reais e noventa e seis centavos) por ação ON, na subscrição das sobras.

A Companhia afirmou no Aviso Republicado que “dentre os critérios de determinação do preço, aqueles que refletem de forma mais adequada o preço das ações da companhia, ou seja, que representam o valor mais próximo da realidade de mercado, são o da perspectiva de rentabilidade futura e o da cotação em bolsa”. Ademais, justificou que “os 15% (quinze por cento) iniciais de deságio têm como objetivo (i) conferir vantagem adicional para os subscritores de ações no Aumento de Capital; (ii) reforçar a estrutura de capital da Companhia para fazer frente aos desafios objetivos de curto e médio prazo para a recuperação das atividades da Companhia; e (iii) reforçar o comprometimento dos subscritores que participarem da capitalização da Companhia. Os 3% (três por cento) adicionais de deságio, quando do rateio das sobras, além de reafirmar os objetivos acima delineados, teriam como justificativa reverter em benefício dos acionistas participantes do aumento, eventual comissão para os agentes autônomos que atuariam na intermediação das ações da Companhia com potenciais investidores”.

Com base no Aviso Republicado e nas informações enviadas à Área Técnica, a SEP manifestou seu entendimento quanto à Operação, consubstanciado no Ofício nº 110/2019/CVM/SEP/GEA-3 (“Ofício SEP 110), nos seguintes termos principais:

(i) ”Não é possível, (...) com base nas comunicações da Companhia, concluir de que forma os critérios elencados no artigo 170, §1º da Lei 6.404/76 (“LSA”) foram utilizados para a definição do preço de emissão das ações no (...) aumento de capital.”;

(ii) “A Companhia afirma que `tomou como base principal para a fixação do preço de emissão das ações a perspectiva de rentabilidade futura, cujo intervalo de preço é o de R$ 6,31 e R$ 5,73, sendo seu ponto médio o de R$ 6,02, o qual foi aceito como referência para o caso´, tendo aplicado sobre esse preço um deságio de 15%, que levou o preço de emissão para R$ 5,12, fora, portanto, da faixa de valores informada como resultado do estudo de perspectiva de rentabilidade futura, constante do laudo de avaliação elaborado (...)”.

(iii) “(...) cabe ressaltar que a aplicação de deságio, nos termos do artigo 170, §1º, só é prevista nos casos em que o preço de emissão é determinado pela (...) cotação de suas ações em Bolsa de Valores ou no mercado de balcão organizado, e (...) somente em função de condições de mercado, não havendo previsão legal para aplicação de deságio sobre preço de emissão definido por perspectiva de rentabilidade futura.”; e

(iv) “Por fim, verifica-se a ocorrência de três diferentes preços de emissão (...): o preço de R$6,02 por ação, a ser aplicado como referência em eventual leilão, o preço de R$ 5,12 por ação, (...) a ser aplicado no exercício do direito de preferência dos acionistas e R$ 4,96 por ação, (...) na rodada de distribuição de sobras não subscritas pelos atuais acionistas. A nosso ver, a definição de preços diferentes para uma mesma espécie de ações em um aumento de capital não encontra previsão legal ou regulamentar.”.

Em 17.05.2019, a Companhia se manifestou acerca do entendimento da SEP, informando que (i) prosseguiria com a Operação em curso, de modo que o Aumento de Capital foi efetivado nos moldes estabelecidos pela Companhia; e (ii) apresentaria recurso ao Colegiado da CVM. Em seu recurso, com pedido de efeito suspensivo, a Companhia apresentou argumentação conforme resumo a seguir, tendo encaminhado pareceres jurídicos sobre o caso:

(i) A Gafisa alegou ter estipulado um único preço de emissão de ações no Aumento de Capital, de R$ 5,12, utilizando-se conjuntamente dos critérios previstos nos incisos I e III do art. 170, §1°, da LSA;

(ii) Inicialmente, a Companhia destacou que o CA tomou como base para a fixação do preço de emissão a perspectiva de rentabilidade futura da Gafisa. E, nesse sentido, o intervalo de preço da análise de rentabilidade futura apresentada por consultoria especializada, em seu relatório de análise e avaliação para fins de fixação do preço de emissão (“Laudo de Avaliação”), era de R$ 6,31 e R$ 5,73, sendo que o ponto médio desse intervalo (R$ 6,02) foi tomado como base;

(iii) No entanto, de acordo com a Gafisa, a simples estipulação do valor de R$ 6,02, sem a aplicação de deságios, não representaria opção economicamente viável para a Companhia, haja vista a importância e necessidade de a administração exercer seus melhores esforços para que o Aumento de Capital fosse bem-sucedido e de ampla adesão pelos acionistas. Considerando-se as circunstâncias econômicas e financeiras da Gafisa, havia receio de que utilizar apenas o critério de rentabilidade futura poderia não estimular tal adesão;

(iv) Por sua vez, a elevada oscilação do preço das ações da Gafisa em bolsa que vinha sendo observado teria limitado a eficácia da utilização do critério das cotações das ações isoladamente, nos termos do inciso III, do §1º, do referido art. 170, conforme destacado pelo Laudo de Avaliação, ao mesmo tempo em que a utilização exclusiva deste critério, ainda, implicaria a fixação de preço de emissão superior àquele baseado na perspectiva de rentabilidade futura, representando dificuldade ainda maior para a captação de recursos e um potencial de risco de diluição injustificada dos atuais acionistas;

(v) Sendo assim, a Companhia realizou estudos internos – de modo a capturar a volatilidade no período de 09.03.2019 (após a dissipação dos efeitos do leilão ocorrido no dia 14.02.2019) a 09.04.2019 (data da divulgação do Fato Relevante referente ao Aumento de Capital), e expurgar a sazonalidade conjuntural havida, os quais apontaram oscilação negativa do valor de mercado das ações no período analisado de -19,75% (“Taxa de Desvalorização”);

(vi) No mesmo sentido, a Companhia argumentou que, dada a necessidade de capitalização e de estipulação de preço que atendesse aos requisitos legais, sem causar diluição injustificada de seus acionistas, a solução encontrada pela Gafisa foi a aplicação de dois deságios sobre o valor base, tendo em vista a Taxa de Desvalorização. De início, a Gafisa decidiu estipular deságio de 15% sobre o valor base para o exercício do direito de preferência pelos acionistas interessados, perfazendo o preço de emissão no valor de R$5,12, de modo a estimular a participação de seus acionistas. Em seguida, visando a evitar diluição injustificada, e, ao mesmo tempo, estimular a subscrição de sobras ao prestigiar os acionistas que o fizessem, a Companhia decidiu pela aplicação de um novo deságio para o valor de subscrição de sobras. O deságio máximo foi calculado pela aplicação de deságio equivalente aos 3% de remuneração dos agentes autônomos/backstop investor sobre o valor de exercício do direito de preferência. Desse modo, a Companhia estipulou o deságio máximo de 17,55% para a subscrição das sobras, perfazendo o valor de R$ 4,96;

(vii) Nos termos do recurso, tendo em vista a indispensabilidade da subscrição integral do Aumento de Capital, a faculdade legal de determinar os critérios do §1° do art. 170 de maneira alternada ou cumulativa, e a desvantagem financeira de aplicar isoladamente um dos critérios do §1° do art. 170 para atingimento desse objetivo, a Companhia decidiu pela combinação de dois desses critérios, no exercício de sua discricionariedade para delimitação da cumulação dos critérios. Para tanto, aplicou, em menor proporção, o comportamento da cotação em bolsa e, em maior proporção, a perspectiva de rentabilidade futura, e entendeu que a combinação destes seria fundamental para o estabelecimento de um preço justo e condizente com a visão da administração sobre a Companhia;

(viii) Haja vista a exposição do cálculo pelo qual foi delimitado o preço de emissão feita acima e em resposta apresentada pela Gafisa ao Ofício SEP 86, e com base em precedente da CVM, a Companhia defendeu que teria restado claro, também, o cumprimento do disposto no parágrafo 7° do art. 170 da LSA;

(ix) Na visão da Companhia, o fato de não haver previsão legal ou regulamentar expressa que regule operação de aumento de capital mediante pagamento de mais de um valor não afetaria a legalidade da estrutura do Aumento de Capital, em operação eminentemente privada, à qual deveria ser aplicada a lógica de direito privado. Ou seja, segundo a Gafisa, não havendo vedação legal, não haveria que se falar que a estipulação de dois deságios na operação do Aumento de Capital representa, por si só, uma irregularidade, prevalecendo a autonomia privada; e

(x) A Companhia também argumentou que não houve prejuízo aos acionistas, na medida em que a Gafisa conduziu o Aumento de Capital com transparência e boa-fé, divulgando amplamente as informações da Operação aos seus acionistas e ao mercado, a saber: a) premissas da Operação; b) termos e condições gerais; c) parecer favorável do Conselho Fiscal; e d) laudo de avaliação econômica da Companhia utilizado para o cálculo do preço de emissão, restando claro que a operação visava tão somente à capitalização de recursos pela Gafisa, e não a diluição da participação de acionistas não controladores.

Ao receber o Recurso, a SEP se manifestou contrariamente ao pedido de efeito suspensivo, entendendo que tal providência não seria aplicável sobre um entendimento manifestado pela Superintendência, mas esclarecendo, na mesma oportunidade, que não apuraria responsabilidades relacionadas à Operação, enquanto o Colegiado não se manifestasse sobre o Recurso interposto.

Quanto ao mérito, a SEP analisou detalhadamente os pontos levantados pela Recorrente por meio do Relatório nº 63/2019-CVM/SEP/GEA-3, tendo concluído que as razões recursais não foram relevantes para alterar o entendimento exarado no Ofício SEP 110. Em síntese, a SEP destacou que:

(i) o critério adotado pela Gafisa para determinação do preço de emissão não encontra respaldo na LSA, visto que essa norteou a definição do preço de emissão na atratividade e no estímulo a adesão dos acionistas, deliberadamente estipulando um preço fora dos parâmetros definidos pelos critérios previstos no §1º do art. 170 da LSA;

(ii) nenhum dos critérios previstos no §1º do art. 170 da LSA justifica a existência de preços diferentes de emissão para a mesma classe de ações, ou mesmo, outros valores;

(iii) a estrutura proposta, com diferentes preços de emissão, privilegia um grupo de acionistas em detrimento de outro, ensejando a diluição injustificada dos acionistas que decidirem por não aderir à Operação;

(iv) a aplicação de deságio a um preço definido por perspectiva de rentabilidade não é admitida pela Lei; e

(v) ainda que não haja vedação expressa, a utilização de preços diferentes para uma mesma espécie de ação, em diferentes etapas da mesma operação de aumento de capital, vai de encontro a princípios e disposições da LSA, conflitando, ainda, com os Pareceres de Orientação da CVM para operações dessa natureza, uma vez que não trata todos os acionistas da mesma forma, privilegiando, de um lado, desproporcionalmente os acionistas que desejarem exercer seu direito de preferência, e causando, de outra parte, a diluição injustificada dos acionistas que decidirem não exercer seu direito de preferência.

Em seu voto, a Diretora Relatora Flávia Perlingeiro ressaltou inicialmente que, embora a SEP tenha manifestado o seu entendimento acerca dos preços de emissão adotados na Operação, a área técnica ainda não formou sua convicção quanto à lavratura, ou não, de termo de acusação. Assim, o Recurso de que se trata enquadrou-se no item X da Deliberação CVM nº 463/2003, então vigente, aplicável “às opiniões, manifestações de entendimentos e pareceres das áreas técnicas da CVM”. Nesse contexto, a Relatora observou que a análise recursal do Colegiado “é limitada e não abrange aspectos casuísticos, que demandam a instrução e o exame de todo o conjunto fático-probatório em relação à Operação e às condutas apuradas, a fim de formar a convicção acusatória quanto a reunião de elementos suficientes de materialidade e autoria, o que se insere nas atribuições da Área Técnica (...)”.

Não obstante, a Relatora ressalvou que essa limitação em sede recursal não impede o Colegiado de tecer considerações sobre a adequada interpretação dos dispositivos legais aplicáveis ao caso e recomendações quanto a aspectos que não tenham sido considerados pela Área Técnica ou que mereçam maior aprofundamento, sendo este o escopo da análise em tela. Ademais, a Relatora observou que tal exame é “especialmente oportuno considerando que a matéria tratada nos autos consubstancia questão inédita, relevante para orientação do mercado, em benefício da eficiência da atuação administrativa”.

Em relação ao interesse recursal da Recorrente, a Relatora destacou que não estaria presente quanto às inconsistências inicialmente apontadas pela SEP à luz do disposto no art. 170, §7º, da LSA, uma vez que tal entendimento foi revisto pela área técnica após análise do Aviso Republicado e das informações enviadas pela Companhia.

Passando a analisar o mérito, a Relatora afastou a alegação da Companhia de que teria estabelecido, no plano fático, um único preço de emissão para as novas ações ordinárias que seriam emitidas, de R$5,12. De acordo com a Companhia, para chegar a esse preço de emissão teria apurado um valor base de R$6,02 por ação, mediante avaliação realizada por empresa de consultoria independente, mas fez incidir, sobre esse “valor base”, um deságio de 15%, considerando a desvalorização das ações em bolsa. A Companhia também afirmou que concedeu um desconto adicional (ou bônus) de 3% para os subscritores de eventuais sobras, para estimular a adesão ao Aumento de Capital, atingindo-se, no caso, o valor de R$4,96 por ação, com um deságio de 17,55% sobre o valor base.

A esse respeito, a Relatora destacou que sob o ponto de vista conceitual, o preço de emissão corresponde a valor a ser pago, em dinheiro ou bens, pelo subscritor, em troca do recebimento das ações, no aumento de capital. É a contraprestação devida para a obtenção da titularidade da ação. Logo, para a Diretora, “se esse valor sofre variação durante o procedimento de aumento de capital”, é “forçoso reconhecer que há, substancialmente, mais de um preço de subscrição, independentemente das denominações que se lhes atribuam nos avisos, comunicados e demais atos societários emanados da companhia (...). Como se observa pela leitura das atas de reunião do CA, do fato relevante e dos avisos aos acionistas divulgados pela Companhia, todos os valores acima mencionados foram considerados como “preços de emissão” das ações, ainda que de forma e em momentos distintos.”.

Nesse contexto, a Relatora pontuou que a primeira das principais controvérsias que aqui se coloca, ainda não enfrentada em precedentes, diz respeito à possibilidade de se fixar, em um mesmo aumento de capital, preços de emissão diferenciados para ações da mesma espécie e classe.

Por um lado, a Relatora concordou que a LSA não contém, de fato, um dispositivo que vede expressamente a emissão de ações por preços diversos numa mesma operação de aumento de capital. E destacou que, inclusive, a própria CVM já se manifestou acerca dessa possibilidade, por meio do Parecer de Orientação CVM nº 5/1979. Não obstante, observou que o citado Parecer admite que a companhia emissora estabeleça preços específicos para diferentes classes ou espécies de ações apenas excepcionalmente, quando suas cotações forem muito díspares e justificadas por volume e liquidez no mercado, de modo que a adoção de preços diversos para ações ordinárias e preferenciais tem como pressuposto a disparidade nos valores econômicos dessas ações.

Todavia, a Relatora observou que, no presente caso, as ações são da mesma espécie e classe (ações ordinárias). Assim, conceitualmente, têm as mesmas características intrínsecas, de modo que a mensuração de seu valor econômico, para fins de aumento de capital, é a mesma. Em outras palavras, tais ações têm idêntico valor econômico, uma vez que o resultado da avaliação das mesmas ações seguindo critérios diversos é o mesmo.

Nessa direção, a Relatora ressaltou que tanto a doutrina quanto a jurisprudência da CVM têm reconhecido que os critérios legais constantes dos incisos do §1º do art. 170 da LSA são referenciais, balizas de orientação e elementos indicativos, que devem ser levados em consideração para a fixação do preço de emissão “sempre que possível”, não sendo raro que a adoção objetiva dos critérios elencados na LSA seja, na prática, inviável, a depender da situação da companhia. Nesse particular, a Relatora observou que essa inviabilidade, quando real e consistente, permite uma maior flexibilidade na determinação do preço de emissão, justamente a fim de não impedir que as companhias venham a se capitalizar no mercado.

Assim, segundo a Relatora, admite-se que os administradores tenham uma margem de discricionariedade para decidir quanto ao critério mais adequado para a determinação do preço de emissão, que pode inclusive consistir em critério diverso daqueles previstos na lei, desde que a escolha seja tomada a partir daqueles parâmetros e mediante o sopesamento dos elementos do caso concreto de forma consistente e verdadeira, orientado sempre pelo interesse social de modo a não provocar a diluição injustificada dos antigos acionistas. O juízo de ponderação, portanto, deve ser feito pelos administradores em consonância com o objetivo da norma de evitar a diluição injustificada dos antigos acionistas, o que, na visão da Relatora, implica que as variáveis estejam associadas ao valor econômico das ações. Afinal, a liberdade conferida aos administradores não é arbitrária, razão pela qual a definição do preço deve estar fundamentada economicamente, em termos objetivos e em função de interesses legítimos da companhia emissora.

No caso concreto, conforme observado, o aumento, mediante subscrição particular, envolveu apenas a emissão de ações ordinárias, que foram oferecidas aos acionistas por dois preços distintos, de acordo com o momento da subscrição: (i) durante o período do exercício do direito de preferência, o valor para a subscrição foi de R$ 5,12 por ação; e (ii) no período de subscrição de sobras, o preço foi de R$ 4,96 por ação. Foi, ainda, estabelecido que, para eventual leilão das sobras em Bolsa, o preço de emissão para os novos investidores seria de R$ 6,02 por ação.

Ao analisar a legalidade dessa estratégia, a Relatora ressaltou dois aspectos. O primeiro é o de que o Aumento de Capital se deu mediante subscrição particular. O segundo refere-se ao fato de que a distinção de preços foi feita à luz de destinatários considerados em duas dimensões: (i) entre acionistas; e (ii) entre acionistas e novos investidores.

Nessa perspectiva, a Relatora ressaltou que, de acordo com a redação constante do art. 23 da antiga Instrução CVM nº 400/2003, a CVM poderia autorizar a diversidade de preços em duas situações: (i) no caso de ações de espécie e classe distintas (na linha do já mencionado Parecer de Orientação CVM nº 5/1979); ou (ii) no caso de destinatários distintos. Registrou, ainda, que a diferenciação entre destinatários já havia sido referendada pela antiga Superintendência Jurídica da CVM no Parecer CVM/SJU/N° 068/1980 que admitiu a possibilidade de o preço de emissão ser fixado em valores diferentes entre os novos e os antigos acionistas, mesmo no caso de ações do mesmo tipo (espécie e classe), assegurado, porém, que o preço de venda ao público não seja inferior ao pago pelos acionistas por ocasião do exercício do direito de preferência.

Naquele contexto, na visão da Relatora, o racional por trás do tratamento diferenciado entre destinatários de uma mesma oferta estava amparado nas seguintes premissas: (i) a distinção não seria tida entre os antigos acionistas, e sim entre esses e novos investidores; (ii) a variação no preço de emissão estaria estritamente correlacionada à modificação do valor econômico da ação ao longo do tempo; e (iii) a variação não poderia implicar na diluição injustificada dos antigos acionistas. Na prática, contudo, não havia muito espaço para essa diferenciação, uma vez que é praxe no mercado que as ofertas públicas sejam realizadas com exclusão do direito de preferência e a precificação das ações é definida por meio de procedimento de coleta de intenções de investimento (bookbuilding) realizado pouco antes do registro da oferta e início da negociação.

Ademais, a Relatora registrou que a nova Resolução CVM nº 160/2022, por sua vez, passou a ter uma redação mais restritiva, acolhendo a diversidade de preços apenas no caso de ações de espécie e classe distintas, embora a alteração tenha pouco efeito prático, pelos motivos acima mencionados.

A par disso, a Relatora assinalou que os princípios do tratamento equitativo entre os destinatários da oferta e da unicidade do preço de emissão foram reafirmados pela CVM no âmbito do Processo CVM nº 19957.006485/2021-15 (em Reunião de 05.10.2021), no qual o Colegiado admitiu a realização de ofertas públicas com estruturas de investimento âncora associadas à celebração de contratos de opção, na premissa de que tais contratos eram exercíveis contra os acionistas (e não contra a companhia emissora), e, por isso, não se alteraria a relação entre a companhia ofertante e os demais destinatários, inclusive no que tange ao preço da oferta.

Além disso, de acordo com a Relatora, a possibilidade de serem estabelecidos preços de emissão diferenciados entre os atuais acionistas e os novos investidores que vierem a subscrever as sobras das sobras (ações que não encontraram tomador na colocação junto aos acionistas) é matéria controversa. Se por um lado a estratégia poderia facilitar a colocação do aumento nos casos excepcionais em que ocorressem alterações substanciais no valor econômico da ação no decurso do período de exercício do direito de preferência, na linha do já mencionado Parecer CVM/SJU/N° 068/1980, por outro lado, não encontra respaldo na doutrina e em decisões do Superior Tribunal de Justiça.

No entanto, tendo em vista que o Aumento de Capital foi integralmente subscrito pelos acionistas da Companhia, como informado no Aviso aos Acionistas publicado pela Gafisa em 24.06.2019, a Relatora restringiu sua análise à verificação da conformidade da fixação de preços de emissão diversos entre os próprios acionistas.

A esse respeito, a Diretora asseverou que a lei societária assegura tratamento isonômico entre os acionistas da mesma classe, o que implica reconhecer ser vedado fixar preços que impliquem em tratamento não equitativo entre eles. Nesse sentido, entendeu que a fixação de um preço mais vantajoso para os acionistas que subscreverem as sobras, por meio de um desconto adicional, parece contrariar os objetivos da lei, porquanto lhes assegura uma menor diluição de suas participações acionárias em relação aos demais acionistas, ainda que todas as ações tenham o mesmo valor econômico.

Ademais, a Relatora destacou que a flexibilidade aplicável à fixação do preço de emissão já permite que a companhia tenha mecanismos para se proteger dos efeitos de uma eventual variação do valor econômico da ação ao longo do procedimento. Afinal, é conferida aos administradores legitimidade para ajustarem o valor encontrado a partir de qualquer dos critérios elencados no art. 170, §1º, da LSA, mediante o sopesamento dos elementos do caso concreto de forma consistente e verdadeira, e desde que orientados pelo interesse social.

Nesse ponto, a Relatora ressaltou que a estratégia de descontos escalonados abre espaço para eventuais abusos e dificulta sobremaneira a fiscalização da conformidade da diluição suportada pelos antigos acionistas, por meio da variação no preço, ao disposto na normal legal, em especial considerando a flexibilidade conferida à fixação do preço de emissão.

Além disso, a Relatora destacou que, em termos práticos, o acionista pode exercer o seu direito de preferência até o trigésimo dia (ou até o último dia caso tenha sido fixado prazo maior), e, portanto, até pouco antes do início do período de subscrição das sobras, quando as condições vigentes serão basicamente as mesmas. Na visão da Relatora, esse ponto reforça a percepção de que não subsiste razão econômica para a adoção de preços diversos entre os próprios acionistas, demonstrando que o mecanismo promove um tratamento desigual, diluindo injustificadamente aqueles que não participarem do rateio das sobras, em contrariedade ao disposto no art. 170, §1º, da LSA.

No que tange ao racional econômico do escalonamento, e observando a justificativa apresentada pela Gafisa acerca da aplicação do desconto adicional de 3% para o rateio das sobras, a Relatora ressaltou que “o escalonamento sequer teria correlação com a modificação do valor econômico da ação ao longo do tempo, o que evidencia que o real objetivo da concessão do desconto adicional para o rateio das sobras parece ter sido unicamente garantir a atratividade do preço para incentivar a participação dos acionistas na subscrição do aumento”.

Nessa linha, a Diretora destacou ser estratégia legítima e bastante usual a concessão de desconto no preço de emissão como forma de permitir a colocação do aumento, porquanto, do contrário, o acionista poderia realizar a aquisição de ações diretamente no mercado secundário. Porém, registrou que o desconto deve ser concedido indiscriminadamente a todas as ações do mesmo tipo, as quais têm idêntico valor econômico, a fim de não conduzir à diluição injustificada de parcela da base acionária e ao tratamento desigual entre acionistas.

Segundo a Relatora, a necessidade de conferir atratividade ao aumento de capital não pode ser usada como justificativa para promover um tratamento não igualitário entre os subscritores de ações de mesma espécie e classe. Afinal, o preço deve ser economicamente justificado, não sendo suficiente que esteja embasado no pretexto genérico de uma maior atratividade ou aceitação do mercado, a fim de evitar que seja fixado de forma descompromissada com o valor econômico da ação, na contramão do que pretendeu o legislador societário.

Por fim, a Diretora afastou o argumento constante nos pareceres jurídicos apresentados pela Recorrente de que o deságio adicional seria uma faculdade oferecida a todos os acionistas que subscrevessem o direito de preferência e, por esse motivo, não consubstanciaria favorecimento de alguns acionistas em detrimento de outros. Com efeito, na visão da Relatora, a lógica é a mesma do direito de preferência, faculdade também oferecida a todos os acionistas, e que por si só não resolve o efeito diluidor que decorre de uma incorreta precificação das ações, à luz do disposto no §1º do art. 170 da LSA. Diante do exposto, concluiu que a concessão de um bônus adicional para o rateio das sobras não encontra respaldo legal.

Prosseguindo a análise a Relatora também rejeitou a alegação da Recorrente de que decidiu pela combinação dos critérios previstos no §1° do art. 170, aplicando, em menor proporção, o comportamento da cotação em bolsa e, em maior proporção, a perspectiva de rentabilidade futura. Nesse ponto, além de fazer referência à análise exposta acima, a Diretora pontuou, inicialmente, que a verificação do cumprimento do art. 170, §1º, da LSA não se esgota em uma análise acerca da escolha do critério para a fixação do preço de emissão (i.e., se o preço de emissão foi fixado tendo em vista, alternativa ou conjuntamente, os critérios legais), sob uma perspectiva formal. Abrange, também, uma perspectiva procedimental, voltada ao exame da diligência dos administradores no processo de tomada de decisão para a definição do preço de emissão, conforme estabelecido nos arts. 153 a 156 da LSA.

Do ponto de vista formal, a Relatora reiterou ter prevalecido historicamente na CVM uma interpretação mais flexível do art. 170, §1º, da LSA, uma vez que o referido dispositivo faculta à companhia estabelecer o preço de emissão das ações em aumento de capital “tendo em vista” os critérios previstos nos incisos I a III, o que não significa que esse deva coincidir com um dos valores apurados segundo os referidos critérios, nem deva ser uma média entre tais montantes. Existe, de fato, um juízo de discricionariedade da administração da companhia emissora quanto à conveniência e à oportunidade de aplicar um único critério ou uma ponderação entre mais de um deles. Esse juízo sofrerá a influência de diversas circunstâncias, caso a caso, e deverá ser economicamente fundamentado, em termos objetivos e em função de interesses legítimos da companhia emissora.

No entanto, a Diretora ressaltou que, embora não caiba à CVM ditar o mérito da decisão quanto à fixação do preço de emissão em si, cabe ao órgão regulador analisar se a escolha da administração foi embasada em fundamentos verdadeiros e consistentes, sem diluição injustificada dos antigos acionistas. Em outras palavras, não basta que a proposta faça referência a algum (ou alguns) dos critérios previstos na lei, sendo também necessário que a escolha seja fundamentada em dados consistentes e informações verdadeiras para não acarretar a diluição injustificada dos antigos acionistas.

Ainda sobre o argumento apresentado pela companhia acerca da combinação dos critérios previstos no §1° do art. 170, a Relatora destacou seu entendimento de que o “inciso III supracitado dispõe que o preço de emissão pode ser fixado tendo em vista a cotação das ações da companhia em bolsa de valores ou no mercado de balcão organizado, admitido ágio ou deságio em função das condições do mercado. (...) o critério a que esse preceito se refere, a ser utilizado alternativa ou conjuntamente com os demais (previstos nos incisos I e II), é o “valor de mercado” das ações – determinado, na exata dicção da lei, pela “cotação” dos referidos papéis – e não uma suposta “taxa de desconto”, ainda que referenciada no percentual de valorização ou desvalorização das ações em Bolsa durante certo tempo (i.e., no “comportamento da cotação”)”.

Para a Relatora, no presente caso, não parece ter havido uma “combinação” propriamente dita dos critérios legais, porquanto o preço de emissão se encontrava fora do intervalo de valores apurado com base nos critérios de perspectiva de rentabilidade e cotação da ação (R$ 6,02 e R$ 12,51, respectivamente), ainda quando considerados os menores daqueles valores (R$ 5,73 e 7,74, respectivamente) ou mesmo quando considerado o menor preço ponderado de mercado do laudo ajustado pelos percentuais de desvalorização.

Não obstante, a Relatora destacou que os valores encontrados a partir de qualquer dos critérios elencados no art. 170, §1º, da LSA, podem ser ajustados de acordo com as circunstâncias do caso concreto. Nessa dinâmica, no seu entendimento, o fato de o preço de emissão ter sido estabelecido fora da faixa de valores informada no Laudo de Avaliação, que avaliou o valor econômico segundo o critério da perspectiva de rentabilidade, não é, por si só, sinônimo de irregularidade, devendo ser consideradas, em cada caso, as demais circunstâncias envolvidas no aumento de capital. Desse modo, “a análise de um eventual descumprimento ao disposto na norma requer também o exame da conformidade da conduta dos administradores na fixação do preço de emissão das ações, isto é, perquirir se eles atuaram com observância dos deveres fiduciários, também sob a ótica procedimental.”.

No caso em análise, observou-se que a solução adotada não seguiu a opinião do assessor refletida no Laudo de Avaliação, que recomendou a precificação das ações com base na perspectiva de rentabilidade e ressalvou que a cotação das ações em bolsa não seria critério adequado em razão da elevada oscilação no valor das ações, que comprometeria a assertividade da metodologia.

Nesse contexto, a Diretora destacou que, conforme a jurisprudência da CVM, o laudo de avaliação não é necessário – nem vinculante – na definição do preço das ações a serem emitidas em um aumento de capital, mas trata-se de “um passo importante para a tomada de uma decisão diligente, sobretudo diante de um assunto complexo e que demanda certo grau de especialização, como a definição do preço por ação pelo método da perspectiva de rentabilidade futura da companhia”.

Além disso, a Relatora aduziu que, se os administradores entenderam adequado buscar o assessoramento técnico de consultoria especializada para a fixação do preço de emissão, ao tomarem uma decisão diversa daquela que lhes foi indicada, devem agir com diligência e fundamentadamente. Assim, embora não precisem seguir as recomendações constantes do laudo para a fixação do preço de emissão, devem adotar cuidados e providências concretas com vistas a que a decisão em relação ao preço seja justificada economicamente, de forma verdadeira e consistente, para evitar a diluição injustificada dos antigos acionistas.

No entendimento da Relatora, “[a]o que parece, o desconto aplicado sobre o valor de perspectiva de rentabilidade apurado no Laudo de Avaliação não estava correlacionado com o valor econômico da ação, e sim com a maior atratividade do preço para incentivar a participação dos acionistas na subscrição do aumento, o que, como dito, não seria suficiente para o atendimento do art. 170, §1º, da LSA.”.

Nesse ponto, a Relatora reiterou que todo o conjunto fático-probatório deverá ser analisado pela Área Técnica, no âmbito dos trabalhos de supervisão e fiscalização, para apuração de eventuais responsabilidades.

De todo modo, considerando a presença de indícios de que a decisão do CA que fixou o preço de emissão das ações no Aumento de Capital pode não ter atendido com suficiência adequada o disposto no art. 170, §1º, c/c art. 153, da LSA, caberá à SEP retomar e complementar a sua análise do caso para formar sua convicção quanto à conduta dos administradores da Companhia no âmbito do Aumento de Capital.

Diante de todo o exposto, a Diretora votou por conhecer do recurso e negar-lhe provimento, tendo recomendado a devolução do processo à SEP para que analise as questões destacadas pelo Colegiado e avalie a adoção de eventuais medidas adicionais.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando o voto da Relatora, deliberou (i) pelo não provimento do recurso; e (ii) pela devolução do processo à área técnica para que analise as questões destacadas no voto e avalie a adoção de eventuais medidas adicionais.

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SEP – PEDIDO DE ACESSO AOS AUTOS – PROC. 19957.002055/2022-05

Reg. nº 2804/23
Relator: SEP/GEA-5

O Colegiado deu início à discussão da matéria, e, ao final, decidiu encaminhar o processo à Procuradoria Federal Especializada junto à CVM – PFE/CVM para manifestar-se sobre o assunto, apresentado pela Superintendência de Relações com Empresas – SEP por meio do Parecer Técnico nº 9/2023-CVM/SEP/GEA-5.

RECURSO CONTRA ENTENDIMENTO DA SEP EM PROCESSO DE RECLAMAÇÃO – SPS I FUNDO DE INVESTIMENTO DE AÇÕES - INVESTIMENTO NO EXTERIOR – PROC. 19957.007423/2021-12

Reg. nº 2672/22
Relator: DJA

A Diretora Flávia Perlingeiro se declarou impedida por ter sido consultada sobre fatos relacionados a aspecto tratado neste Processo Administrativo não sancionador (PA) na época em que atuava como advogada do Sistema BNDES / BNDES Participações S.A., entidade que, na qualidade de acionista da companhia JBS, é especificamente nomeada na descrição dos fatos subjacentes ao PA, ainda que, no caso, não seja peticionante, recorrente ou acusada.

Trata-se de recurso protocolado por SPS I Fundo de Investimento de Ações - Investimento no Exterior ("Fundo SPS” ou “Recorrente”) contra o entendimento manifestado pela Superintendência de Relações com Empresas – SEP no Parecer Técnico nº 34/2022-CVM/SEP/GEA-4 ("Parecer Técnico nº 34") e no Parecer Técnico nº 72/2022- CVM/SEP/GEA-4 ("Parecer Técnico nº 72"), no âmbito de reclamação ("Reclamação") apresentada pelo Fundo SPS, em face de administradores e acionistas controladores da JBS S.A. (“JBS” ou “Companhia”). No expediente, o Fundo SPS solicitou que o Colegiado também recebesse o recurso na forma de consulta, a fim “orient[ar] o mercado acerca da correta interpretação da legislação societária sobre a ação de responsabilidade civil contra o controlador”.

Na Reclamação, o Fundo SPS, na qualidade de acionista da JBS, denunciou eventuais ilícitos que teriam sido praticados pelos administradores e acionistas controladores da Companhia, no contexto dos Procedimentos Arbitrais nº s 93/17 e 110/18, instaurados pelos acionistas minoritários ("Arbitragem dos Minoritários") e do Procedimento Arbitral nº 186/21, instaurado pela JBS (“Nova Arbitragem”).

Após análise, consubstanciada nos referidos Pareceres Técnicos, a SEP concluiu pela inexistência de elementos a ensejar a formulação de acusação em face dos administradores e acionistas controladores da JBS por infração à Lei nº 6.404/1976.

Em sede de recurso, em linhas gerais, o Fundo SPS reproduziu as alegações contidas em sua Reclamação, no sentido de que: (i) a JBS estaria “sendo prejudicada pela prática reiterada de atos irregulares por seus acionistas controladores e administradores, que visam a frustrar o procedimento arbitral movido pelo Fundo SPS contra os Irmãos Batista, com fundamento no art. 246 da Lei das S.A., no qual se pleiteia o ressarcimento da Companhia pelos prejuízos que lhe foram causados pelos controladores”; e (ii) “os administradores da JBS, orientados pelos acionistas controladores, deram início a um novo procedimento arbitral, aparentemente simulado (“Nova Arbitragem”), que visa a extinguir o Procedimento Arbitral movido pelo Fundo SPS”. No entendimento do Fundo SPS, diante de sua Reclamação, competiria à CVM: (i) a formulação de acusação em face de Wesley Batista, por violação ao art. 156 da Lei nº 6.404/1976; e (ii) a apuração de responsabilidade dos administradores e acionistas controladores da Companhia por sua conduta em relação à Arbitragem dos Minoritários, com a consequente formulação de acusação por infração à Lei nº 6.404/1976.

Preliminarmente, o Recorrente defendeu que estariam preenchidos os requisitos alternativos de admissibilidade para o recurso: a ausência de fundamentação da decisão da área técnica e a violação a posicionamento prevalecente do Colegiado, de que tratam a Resolução CVM nº 45/2021.

Quanto ao primeiro requisito, o Recorrente arguiu que a SEP não fundamentou sua conclusão de que a assembleia geral teria determinado o ingresso de Nova Arbitragem e a extinção da Arbitragem dos Minoritários, afastando a possibilidade de os administradores aderirem a esta última. Quanto ao segundo requisito, o Fundo SPS alegou que a SEP restringiu sua análise acerca da conduta dos administradores tão somente ao cumprimento de aspectos procedimentais, sob a ótica da regra de decisão empresarial, o que, no entendimento do Recorrente, de acordo com os precedentes do Colegiado da CVM, não se aplica a situações envolvendo dever de atuar no interesse da companhia (art. 154 da Lei das S.A.) e dever de lealdade (art. 155, II da Lei).

O Fundo SPS concluiu, portanto, que não seria “adequadamente fundamentada a conclusão da SEP de que o ajuizamento da Nova Arbitragem e a extinção do Procedimento Arbitral foram medidas adotadas pela administração em prol do interesse social e em proteção aos direitos da Companhia.”. Além disso, a seu ver, a SEP “violou o entendimento prevalecente do Colegiado dessa Autarquia de que tal padrão de revisão é inaplicável a casos relativos ao dever de lealdade e ao dever de atuar no interesse da companhia.”.

Nesse sentido, o Recorrente reiterou o entendimento de que seria inequívoca a violação aos arts. 154 e 155, II, da Lei das S.A. pelos administradores da Companhia, bem como aos arts. 116, parágrafo único, e 117 da Lei das S.A. pelos acionistas controladores, “que claramente têm orientado a Companhia a obstruir o curso regular do Procedimento Arbitral, inviabilizando o adequado ressarcimento da JBS”. Deste modo, requereu que fosse conhecido e acolhido seu recurso pelo Colegiado para que a SEP “possa aprofundar as investigações dos fatos narrados na Reclamação e formular acusação contra os administradores e controladores da Companhia por violações à Lei das S.A.”.

Em seu expediente, o Fundo SPS solicitou que o Colegiado, independentemente da decisão proferida, também recebesse o recurso na forma de consulta, e requereu a confirmação da CVM acerca do seguinte entendimento: "i. Nos termos do art. 246 da Lei das S.A., não há necessidade de prévia deliberação da assembleia geral para propositura, pelo acionista minoritário, de ação de responsabilidade civil em face de acionista controlador por danos causados à companhia controlada; e ii. A propositura, pela companhia, de ação de responsabilidade contra o seu acionista controlador após a propositura de ação de responsabilidade promovida pelos acionistas minoritários, com base e nos estritos termos do art. 246 da Lei nº 6.404/1976, não acarreta a automática extinção da ação de responsabilidade movida e conduzida pelos minoritários.".

A SEP analisou o recurso por meio do parecer técnico nº 81/2022-CVM/SEP/GEA-4, e reiterou o entendimento exarado no Parecer Técnico nº 34, no sentido de que a deliberação tomada na Assembleia Geral Extraordinária (“AGE”) de 30.10.2020 retirou da Administração da JBS a discricionariedade quanto à eventual adesão à Arbitragem dos Minoritários, alternativamente à instauração de novo procedimento arbitral, em linha com o defendido pelo Fundo SPS e também aventado pela própria Administração da Companhia, entre outras alternativas, consoante refletido no item (viii) da ordem do dia, retirado de pauta por decisão da maioria dos acionistas.

Conforme destacado pela área técnica, o Parecer Técnico nº 34 não adentrou na questão de ordem jurídica referente à necessidade ou não de realização de assembleia geral para o ajuizamento de ação contra o controlador de que trata o art. 246 da Lei nº 6.404/1976. Nos termos do Parecer Técnico nº 34, a SEP concluiu que os administradores da JBS, em verdade, atuaram de forma a cumprir a deliberação tomada pela maioria dos acionistas da Companhia na AGE de 30.10.2020.

Além disso, a SEP destacou que, por ocasião da análise da Reclamação, foram avaliadas possíveis violações ao dever de diligência previsto no art. 153 da Lei nº 6.404/1976, mas também eventuais infrações aos arts. 154 e 155, II, da Lei nº 6.404/1976, não tendo sido possível “concluir que a conduta dos administradores da Companhia tenha sido contrária à lei ou aos interesses da Companhia, por todas as razões já expostas, que, como visto, não se limitam ao aspecto procedimental, como interpretado pelo SPS para fins de embasar o recurso interposto em face do entendimento exarado por esta área técnica”.

Ademais, a SEP ressaltou que “especificamente quanto às eventuais irregularidades envolvendo a JBS, seus controladores e administradores, a atuação sancionadora da CVM pode ser constatada a partir da instauração de diversos processos administrativos sancionadores”.

Nesse contexto, a SEP sugeriu o não conhecimento do recurso, considerando a ausência dos requisitos de admissibilidade exigidos pelo §4° do art. 4° da Resolução CVM nº 45/2021, uma vez que, na visão da área técnica, a decisão recorrida (i) não se encontra em dissonância com entendimento prevalecente no Colegiado e (ii) apresentou fundamentação adequada.

Em relação ao item (i) da consulta formulada, a SEP destacou seu entendimento de que não há necessidade de prévia deliberação da assembleia geral para propositura, pelo acionista minoritário, de ação de responsabilidade civil em face de acionista controlador por danos causados à companhia controlada de que trata o art. 246 da Lei nº 6.404/1976.

Quanto ao item (ii) da consulta, a área técnica entendeu que a análise da situação ali descrita não incumbe à CVM, e sim ao Juízo em que tramitarem as ações de responsabilidade propostas, seja Arbitral ou Judicial, a partir da avaliação de todos os aspectos concretamente apresentados. Isto porque, conforme ressaltou a SEP, tal análise abrange a normativa processual, perpassando por questões de caráter instrumental, tal qual a existência ou não de litispendência, conexão ou continência, entre outros, às quais não compete à Autarquia imiscuir-se.

Por fim, a SEP reiterou o disposto no Parecer Técnico nº 34, no sentido de que "há que se ponderar os impactos relacionados à decisão em tela, diante do objetivo almejado pelo legislador ao autorizar os acionistas minoritários a ingressarem com ação de responsabilidade em face da sociedade controladora, atuando como substitutos processuais, no interesse da companhia. Afinal, a eventual extinção de ação de responsabilidade promovida pelos acionistas minoritários, com base e nos estritos termos do art. 246 da Lei nº 6.404/1976, ante a interposição posterior de ação de responsabilidade pela própria Companhia (titular do direito substancial), sem qualquer ponderação de valores, poderia fragilizar tal instrumento legal ou mesmo torná-lo infrutífero.".

Em seu voto, o Diretor Relator João Accioly rejeitou o argumento do Recorrente de que a SEP não fundamentou sua conclusão de que a assembleia da JBS teria determinado ingresso da nova arbitragem e extinção da arbitragem proposta pelos minoritários. Conforme destacou o Relator, ainda que se possa divergir no mérito desta conclusão da área técnica, tal entendimento foi sustentado de maneira consistente e com fundamentação claramente apresentada nos §§57 a 61 do Parecer Técnico nº 34. Desse modo, o Diretor João Accioly votou pelo não conhecimento do recurso com base na ausência de fundamentação, e nos termos declarados no voto, em caso de deliberação pelo conhecimento nesse ponto, o Relator registrou voto por seu desprovimento.

Por outro lado, João Accioly entendeu satisfeita a exigência do §5º do art. 4º da Resolução CVM nº 45/2021, considerando que o Recorrente demonstrou que uma parte da fundamentação da SEP, ao decidir não instaurar processo administrativo sancionador, contrariou entendimento consolidado do Colegiado, razão pela qual o Relator votou por conhecer do recurso.

Nesse sentido, o Relator concordou com a argumentação do Recorrente de que não se aplica a business judgment rule em casos de dever de lealdade, e que a fundamentação da decisão recorrida contém afirmação incompatível com este preceito consolidado no Colegiado, conforme se depreende dos precedentes apresentados no recurso. Nestes casos, segundo o Relator, como há potencial conflito de interesses - o tomador da decisão pode beneficiar-se em detrimento dos destinatários de seus deveres fiduciários – não cabendo a exceção da análise do mérito.

Conforme destacou o Relator, apesar de a SEP não limitar sua fundamentação a este ponto, os §§4º e 5º do art. 4º da Resolução CVM nº 45/2021 fazem referência ampla à fundamentação, sem exigir que toda ela esteja em desacordo/dissonância com posicionamento prevalecente no Colegiado. Assim, para o Diretor João Accioly, a leitura de tais dispositivos deve ser ampliativa, consentânea com o direito de petição, com a possibilidade de revisão dos próprios atos pela administração pública, e também com o dever da CVM de transmitir clareza e segurança aos cidadãos sobre o direito aplicável ao mercado de capitais. Por isso, na visão do Relator, havendo mesmo apenas um ponto que contrarie entendimento do Colegiado, dentre vários, seria apropriado considerar preenchido esse requisito de admissibilidade.

No mérito, o Relator entendeu que a SEP chegou a uma conclusão que não admite revisão pelo Colegiado. De acordo com o Relator, o ponto nevrálgico da discussão envolveria a seguinte questão: para a Recorrente, não é aplicável a regra da decisão negocial, pois a hipótese é de alegação de quebra do dever de lealdade. Para a SEP, contudo, o que não estaria presente nos autos é a demonstração suficientemente robusta de que os atos foram praticados de maneira “interessada”, a ponto de justificar a revisão do mérito.

Conforme destacado no voto, "houve na prática uma série de juízos feitos pela área técnica sobre suficiência ou insuficiência dos elementos constantes dos autos para justificar a apresentação de uma acusação.", os quais levaram a SEP a concluir pela insuficiência. Desse modo, na visão do Relator, a revisão de tais juízos pelo Colegiado seria imprópria, pois resultaria em atividade acusatória, “um juízo de matéria que cabe neste momento processual a quem opta por formular ou não a acusação, que são exclusiva e autonomamente as Superintendências, nos termos do art. 3º da Resolução 45”.

Ademais, o Relator destacou seu entendimento de que, "em âmbito societário, (...) a diretoria ainda mantinha sua discricionariedade para escolher a melhor forma de cumprir a deliberação. Mas em âmbito de direito punitivo, seria descabido punir o administrador que entendeu tê-la perdido diante de tais manifestações e da votação que retirou o item de pauta".

Ante o exposto, João Accioly votou por (i) afastar o argumento de falta de fundamentação da conclusão de que a assembleia da JBS teria determinado ingresso da nova arbitragem e extinção da arbitragem proposta pelos minoritários; (ii) acatar o argumento de contrariedade a entendimento consolidado do Colegiado, de modo a conhecer do recurso; e (iii) não dar provimento ao recurso em ambos os seus fundamentos.

Com relação ao item (i) da consulta, o Relator concluiu que, em linha com o entendimento prevalente na doutrina e na jurisprudência, "há uma interpretação sistemática no sentido de que não é necessária deliberação prévia da assembleia-geral para que os acionistas referidos no §1º do art. 246 tenham direito de ingressar com a ação, em nome da companhia, contra o controlador".

Quanto ao item (ii) da consulta, o Relator apresentou análise acerca dos sistemas de incentivos decorrentes de três diferentes interpretações da lei, no que tange às consequências de uma propositura de ação indenizatória quando já em curso uma ação derivada: não extinção automática, extinção completa, e extinção da ação com preservação do prêmio de 5% (e de parte ou totalidade dos honorários de 20%). De acordo com o Relator, desses três sistemas de normas, ”as análises empreendidas indicam que o que organiza os incentivos econômicos com as perspectivas mais eficientes de reparação é o que não acarreta a extinção da ação derivada, mantendo-a em curso em paralelo com a proposta pela companhia”.

Por fim, o Diretor João Accioly ressaltou não ter identificado em sua análise “solução parecida em precedentes ou dispositivos legais, que autorizasse o preenchimento da lacuna normativa por uma regra que extinga uma ação que tenha sido regularmente iniciada, junto com direitos patrimoniais dela decorrentes, por livre deliberação de interessados distintos do titular desses direitos. (...) Pelo contrário, como demonstrado nos [temos do voto], há uma série de características pelas quais tal solução se revela inadequada: ela é oposta às finalidades da lei (de buscar efetiva responsabilização por eventuais abusos), prejudicial aos interesses da coletividade dos acionistas (e portanto incompatível com a interpretação pela negociação ideal – CC, art. 113, §1º, V), vedada pela lei societária ainda que estabelecida em cláusula estatutária (por elidir de instrumento assecuratório de direito, LSA, art. 109, §2º), e reputada nula pelo direito das obrigações ainda que expressamente prevista em qualquer contrato (por sujeitar direito subjetivo a condição puramente potestativa, CC, art. 122); tantas e tamanhas incompatibilidades parecem explicar a ausência de paralelo a tal regra no direito positivo, por mais remota que seja a analogia.".

Ante o exposto, o Relator propôs ao Colegiado o entendimento de que a propositura, pela companhia, de ação de responsabilidade contra o seu acionista controlador após a propositura de ação de responsabilidade promovida pelos acionistas minoritários não acarreta a automática extinção da ação de responsabilidade movida e conduzida pelos minoritários.

O Presidente João Pedro Nascimento apresentou Manifestação de Voto na qual acompanhou o Diretor Relator em relação ao conhecimento e indeferimento do recurso.

Em relação às consultas, primeiramente, o Presidente apresentou considerações sobre o sistema de freios e contrapesos que orientou a elaboração da Lei nº 6.404/1976.

Adentrando no primeiro ponto objeto da Consulta, o Presidente destacou que “as ações sociais previstas na Lei nº 6.404/1976 requerem o preenchimento de requisitos distintos para o seu ajuizamento. Essas diferenças devem ser respeitadas. Não se deve estender os requisitos necessários ao ajuizamento de uma dessas ações a outra, não só porque os dispositivos em questão não autorizam tal procedimento, mas também porque essa extensão pode acabar por prejudicar o delicado equilíbrio de incentivos e desincentivos que o legislador teve em mente ao criar um sistema de responsabilidade efetivo”. Assim, concluiu que “a propositura, pelos acionistas minoritários, de ação de responsabilidade contra os controladores, nos termos do art. 246 da Lei nº 6.404/1976, prescinde da realização de assembleia geral”.

Quanto ao segundo ponto, o Presidente ressaltou que “[t]rata-se de discussão bastante complexa, cuja resposta depende da análise de diversas variáveis, inclusive de cunho processual civil e arbitral, que escapam à competência desta CVM. Entretanto, considerando a relevância do tema para o mercado de capitais e o dever da CVM de zelar pelo seu funcionamento eficiente, nos termos do art. 4º, inciso II, Lei nº 6.385/1976, parte da discussão inegavelmente perpassa por temas afeitos à competência desta Autarquia”.

Feitas essas considerações, no entendimento do Presidente, “analisando a questão que se coloca estritamente sob a ótica da lei societária e dos interesses por ela tutelados, me parece que uma solução que implique na extinção automática de ação de responsabilidade anterior ajuizada por acionistas minoritários desafia os próprios incentivos e desincentivos que o legislador teve em mente ao buscar criar um sistema de responsabilidade eficiente”.

O Diretor Alexandre Rangel, acompanhando as conclusões do Diretor Relator e do Presidente João Pedro Nascimento, (i) manifestou-se pelo conhecimento e indeferimento do recurso, nos termos dos §§4º e 5º do art. 4º da Resolução CVM nº 45/2021; e (ii) sobre a consulta, observada a competência da Autarquia estabelecida pela Lei n° 6.385/1976 de se manifestar sobre questões da Lei n° 6.404/1976 relativas a companhias abertas, votou no sentido de que (a) não é necessária deliberação prévia da assembleia geral para que os acionistas referidos no §1º do art. 246 da lei do anonimato ingressem com a ação judicial em questão, em nome da companhia, contra o controlador, em linha com a doutrina nacional; e (b) a eventual propositura pela companhia de ação de responsabilidade em face do acionista controlador, após a propositura de ação de responsabilidade movida pelos acionistas minoritários, não acarreta a automática extinção da ação de responsabilidade movida e conduzida pelos minoritários.

O Diretor Otto Lobo acompanhou o voto proferido pelo Diretor Relator João Accioly. O Diretor considerou importante ressaltar, todavia, que a conclusão referente ao segundo item da consulta formulada pelo Recorrente não perpassa por uma análise processual cível e arbitral da questão, cuja competência é do Superior Tribunal de Justiça, mas tão somente que a extinção automática da ação de responsabilidade movida e conduzida pelos minoritários em razão de posterior ajuizamento de ação pelo legitimado ordinário não se coaduna com uma interpretação sistemática da Lei n° 6.404/76.

Sendo assim, o Colegiado, por unanimidade, deliberou pelo conhecimento e não provimento do recurso, nos termos dos §§4º e 5º do art. 4º da Resolução CVM nº 45/2021. Quanto à consulta, observada a competência da Autarquia estabelecida pela Lei n° 6.385/1976, o Colegiado, nos temos dos votos apresentados, entendeu que (i) não é necessária deliberação prévia da assembleia geral para que os acionistas referidos no §1º do art. 246 da Lei nº 6.404/76 ingressem com a ação judicial em questão, em nome da companhia, contra o controlador; e (ii) a eventual propositura pela companhia de ação de responsabilidade em face do acionista controlador, após a propositura de ação de responsabilidade movida pelos acionistas minoritários, não acarreta a automática extinção da ação de responsabilidade movida e conduzida pelos minoritários.

 

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