Decisão do colegiado de 07/03/2023
Participantes
• JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTO – PRESIDENTE (*)
• FLÁVIA MARTINS SANT'ANNA PERLINGEIRO – DIRETORA (**)
• ALEXANDRE COSTA RANGEL – DIRETOR
• OTTO EDUARDO FONSECA DE ALBUQUERQUE LOBO – DIRETOR
• JOÃO CARLOS DE ANDRADE UZÊDA ACCIOLY – DIRETOR (**)
(*) Por estar na CVM de Brasília, participou por videoconferência.
(**) Participou por videoconferência.
PEDIDO DE DISPENSA DE REQUISITOS NORMATIVOS – BBCE - BALCÃO BRASILEIRO DE COMERCIALIZAÇÃO DE ENERGIA S.A. – PROC. 19957.012631/2022-14
Reg. nº 2809/23Relator: SMI
Trata-se de pedido de dispensa de cumprimento de requisitos da Resolução CVM nº 135/2022 (“RCVM 135”), apresentado por BBCE - Balcão Brasileiro de Comercialização de Energia S.A. (“BBCE” ou “Requerente”), entidade autorizada, conforme decisões do Colegiado de 17.03.2020 e 16.06.2020, a atuar como administradora de mercado organizado de valores mobiliários e para o funcionamento do referido mercado organizado de valores mobiliários, nos termos dos arts. 109 e 110 da então vigente Instrução CVM nº 461/2007 (“ICVM 461”).
Nos termos do pedido, a Requerente destacou ter mapeado as adequações necessárias para o cumprimento da RCVM 135, em relação às quais foram solicitadas dispensas. Além disso, na visão da BBCE, os volumes negociados em sua plataforma ou as operações registradas em seu ambiente justificariam a manutenção das dispensas de cumprimento de requisitos regulatórios que lhe foram concedidas quando da autorização pela CVM. Tais dispensas concentram-se na estrutura da autorregulação da entidade que foi constituída para atender às necessidades de um mercado nascente e que não suportaria o ônus do investimento imposto pela regulação.
A Superintendência de Relações com o Mercado e Intermediários - SMI analisou o pedido nos termos do Ofício Interno nº 7/2023/CVM/SMI. Em síntese, foram analisadas dispensas referentes a: (i) Autorregulação; (ii) Dados de mercado; e (iii) Auditoria Interna e Gerenciamento de Riscos.
Em relação ao item (i) acima, à época da autorização, com fundamento no disposto no art. 106 da ICVM 461, a CVM entendeu razoável que a BBCE constituísse uma estrutura reduzida para sua autorregulação composta por uma área denominada Supervisão e Monitoramento de Mercado (“SMM”), responsável pela supervisão, monitoramento e enforcement no mercado de derivativos administrados pela BBCE.
A BBCE destacou que, dado o volume operado, sua estrutura de autorregulação permite o monitoramento, online e pós-negociação, de 100% das ofertas e dos contratos negociados e/ou registrados na plataforma BBCE. Além disso, ressaltou que a estrutura de autorregulação também realiza auditorias em participantes, de acordo com plano de trabalho previamente pactuado com a SMI.
Em sua análise do pedido, a SMI entendeu que as dispensas de cumprimento de requisitos regulatórios conferidas à BBCE quando da concessão de autorização para funcionar como entidade administradora de mercado organizado ainda se justificariam por duas razões principais: (i) a estrutura de autorregulação se mostra compatível com o número de negócios realizados e os volumes negociados/registrados na BBCE; e (ii) a autorregulação da BBCE tem realizado suas atividades de maneira adequada, tendo cumprido o plano de trabalho pactuado com a SMI e realizado reuniões periódicas com esta Superintendência, por meio das quais tem sido possível acompanhar as atividades da área e do conselho de supervisão.
Da mesma forma, quanto ao item (ii) acima, a SMI entendeu ser possível atender o pedido de dispensa para o cumprimento do disposto no art. 39, inciso IV da RCVM 135, de acordo com o qual a entidade administradora de mercado organizado deve divulgar em sua página na rede mundial de computadores informações sobre cada negócio realizado ou registrado, incluindo intermediários, valor mobiliário, preço, quantidade e horário, ao longo das sessões diárias, de forma contínua e pública, com no máximo 15 minutos de atraso.
Nesse sentido, a SMI observou que, atualmente, a divulgação de informações sobre negócios realizados por meio da plataforma da BBCE obedece a critérios estabelecidos na política de divulgação de informações aprovada pela CVM e disponível publicamente na página da BBCE na internet. Essa política prevê a divulgação agrupada das operações com derivativos ao final de cada sessão de negociação.
De acordo com a SMI, justificaria a manutenção da política a baixa liquidez dos contratos negociados/registrados na plataforma. Além disso, visto que o mercado administrado pela BBCE é desintermediado, ou seja, cada participante realiza os negócios em nome próprio, a SMI destacou que a divulgação individualizada dos negócios no prazo determinado pela RCVM 135 poderia colocar em risco o sigilo das operações determinado pela Lei Complementar nº 105/2001.
Em acréscimo, a SMI ressaltou que a RCVM 135 permite a divulgação diferida ou agrupada das informações, desde que constante da política de divulgação de dados regulatórios previamente aprovada pela CVM, a depender da forma de operação do mercado de balcão organizado e do tipo de investidor que tenha acesso ao segmento ou ao mercado (art. 40, incisos I e IV), hipóteses às quais, no entendimento da área técnica, a BBCE se amolda e que amparam a concessão o tratamento proposto à entidade.
Sobre esse ponto, a SMI observou que a BBCE não pleiteou uma dispensa permanente de cumprimento do inciso IV do art. 39. A Requerente propôs que a política de divulgação de dados regulatórios continue a ser válida até que os volumes transacionados no mercado de derivativos por ela administrado superem a média de R$ 500 milhões em valores nocionais (apuração em base móvel de 6 meses). A esse respeito, a área técnica entendeu mais conveniente, no atual cenário, manter o acompanhamento dos negócios efetuados por meio da plataforma da BBCE também com vistas a estabelecer o momento a partir do qual a política de divulgação de dados regulatórios da entidade administradora terá de ser alterada.
Em relação ao item (iii) acima, a SMI ressaltou que a área de compliance, controles internos e riscos da BBCE também é responsável pelas atividades atribuídas pela RCVM 135 à auditoria interna, quais sejam, o monitoramento, avaliação e recomendações sobre a qualidade e a efetividade das políticas e procedimentos de gerenciamento de riscos, bem como dos controles internos utilizados pela entidade administradora (art. 33, parágrafo único, inciso I). Para tanto, a área conta com o auxílio de auditores externos que avaliam de maneira independente a aderência dos procedimentos e controles internos da entidade elaborando relatório que é disponibilizado ao Comitê de Governança e ao Conselho de Administração da companhia.
No âmbito da análise, em dezembro de 2022, o Conselho de Administração da BBCE elegeu um diretor para compor a Diretoria Estatutária da companhia, e atuar como Chief Operating Officer (COO) a partir de janeiro de 2023. No entender da Requerente, a contratação de um diretor estatutário atenderia ao requisito de que a responsabilidade pela atividade de gerenciamento de riscos seja atribuída a um diretor estatutário (art. 103 da RCVM 135). Dessa forma, segundo a BBCE, deixaria de ser necessário o pedido de dispensa inicialmente formulado para que a área de gerenciamento de riscos e controles internos não estivesse sob a responsabilidade de um diretor estatutário.
Não obstante, a SMI considerou que a contratação de um diretor estatutário que acumula responsabilidades sobre a área operacional e de gerenciamento de riscos não atende ao disposto na norma. Conforme observou a área técnica, “ao determinar que o gerenciamento de riscos seja atribuído a um diretor estatutário ou a um comitê estatutário, o regulador não apenas reconheceu a importância dessa atividade para o mercado organizado de valores mobiliários, como também quis apartar as responsabilidades pelas áreas operacionais e de gerenciamento de riscos, cujos interesses imediatos nem sempre são coincidentes”.
Além disso, a SMI destacou a previsão da RCVM 135 de que as entidades administradoras de mercado organizado de bolsa e de balcão mantenham área de Auditoria Interna cuja responsabilidade seja atribuída a um diretor estatutário ou a um comitê de auditoria estatutário (art. 33, caput). Assim, de acordo com a SMI, estando as entidades administradoras de mercado de balcão organizado, como é o caso da BBCE, dispensadas da obrigatoriedade de existência do comitê de auditoria (art. 152, inciso III), o cumprimento das disposições da RCVM 135, no que tange à auditoria interna, se daria com a criação de uma área de auditoria interna e com a nomeação de um diretor estatutário por ela responsável.
Nesse contexto, a BBCE solicitou dispensa de cumprimento de requisitos regulatórios relacionados às atividades da auditoria interna para permitir que um profissional contratado realizasse a auditoria interna da companhia e se reportasse diretamente ao Conselho de Administração da BBCE. Esse profissional seria contratado em regime da CLT e não seria um diretor estatutário.
Nesse ponto, a SMI entendeu que a contratação de um auditor interno acrescenta expertise ao quadro de BBCE sem onerar excessivamente a companhia neste momento de constituição do mercado, razão pela qual se mostra adequada e condizente com os volumes transacionados no mercado da BBCE e com os riscos a eles associados.
Em síntese, e tendo em vista que a BBCE está em funcionamento há menos de 24 (vinte e quatro) meses e que está estruturando um mercado antes inexistente, cujos números em termos de volume, participantes, operações ainda são incipientes, a SMI entendeu que poderia ser atendido o pedido de dispensa da existência de diretor estatutário responsável pela auditoria interna (art. 33 da RCVM 135), em face da contratação de auditor interno que responderá diretamente ao Conselho de Administração da companhia.
Por outro lado, a SMI considerou que a submissão da área operacional e do controle de riscos ao mesmo diretor não estaria em conformidade com a estrutura preconizada pela RCVM 135 para as entidades administradoras de mercado organizado. Nesse sentido, e considerando que a estrutura organizacional da BBCE estaria apropriada ao mercado por ela administrado, a SMI entendeu que deveria ser concedida uma dispensa de cumprimento de requisito regulatório para que o diretor operacional também seja o responsável pela área de risco da entidade, enquanto o tamanho do mercado administrado pela BBCE e as condições de liquidez nele existentes assim o justificarem. Nesse cenário, a SMI entendeu ser necessária a concessão de duas novas dispensas para a BBCE, em relação aos artigos 33 e 103, ambos da RCVM 135.
Quanto às dispensas concedidas quando da autorização para que a BBCE funcionasse como entidade administradora de mercado organizado de valores mobiliários, a SMI destacou que a RCVM 135 não contém dispositivo semelhante ao art. 106 da ICVM 461 (vigente quando da concessão da mencionada autorização), segundo o qual a entidade administradora do mercado de balcão organizado poderia adotar uma estrutura de autorregulação diversa da estabelecida na norma desde que cumprisse os requisitos elencados no artigo.
Em face do exposto, a SMI entendeu que a manutenção da estrutura proposta pela BBCE dependeria de concessão de uma dispensa de cumprimento de requisito regulatório nos termos do § 4º do artigo 9º da RCVM 135. A estrutura proposta se refere à manutenção da Superintendência de Supervisão e Monitoramento de Mercado (acompanhamento em tempo real das operações + supervisão das operações e dos participantes da BBCE), com apoio jurídico provido pela área jurídica da entidade administradora e Superintendente de Supervisão (contratado no regime CLT) com as competências atribuídas pela norma ao Diretor de Autorregulação.
Nesse contexto, à luz da regulamentação vigente, a SMI considerou em princípio que a concessão de tal dispensa poderia ser temporária, enquanto perdurassem as condições de liquidez relatadas pela BBCE. Assim, recomendou que a CVM determine que a BBCE apresente, no prazo de 30 (trinta) meses a contar da decisão quanto à solicitação em análise, dados relativos ao desempenho do mercado por ela administrado e, se necessário, justificativas para a manutenção das dispensas que venham a ser concedidas. Ademais, de acordo com a SMI, o prazo sugerido poderá ser reduzido mediante prévio aviso à BBCE se, durante a supervisão de rotina a que está submetida enquanto entidade administradora de mercado de balcão organizado, a SMI constatar que o mercado administrado pela BBCE exige o incremento da estrutura de autorregulação.
Em conclusão, a SMI entendeu que podem ser mantidas as dispensas concedidas quando da autorização para que a BBCE funcionasse como entidade administradora de mercado organizado de valores mobiliários quanto à estrutura de autorregulação e a política de divulgação de dados regulatórios, sendo, portanto, dispensados enquanto ausentes as condições de liquidez que justifiquem o incremento da atividade de autorregulação: (i) o cumprimento do disposto no inciso III do art. 34 da RCVM 135, uma vez que o monitoramento em tempo real das operações compete à área de supervisão e monitoramento de mercado; (ii) o cumprimento do disposto no §2º do art. 53 da RCVM 135 admitindo-se o compartilhamento da estrutura da área jurídica corporativa da BBCE com a estrutura de supervisão e monitoramento de mercado; (iii) o cumprimento do disposto no art. 20, inciso VII, e do disposto no art. 61, ambos da RCVM 135, haja vista a autorregulação da BBCE estar sob a responsabilidade de um superintendente e não de um diretor de autorregulação; e (iv) o cumprimento do disposto no art. 39, inciso IV, da RCVM 135, permitindo-se divulgação agregada de informações relativas aos negócios realizados ou registrados no mercado administrado pela BBCE.
Além disso, a SMI entendeu ser necessária a concessão temporária (i) de uma dispensa de cumprimento de requisito regulatório nos termos do § 4º do artigo 9º da RCVM 135, a fim de manter a estrutura proposta pela BBCE, conforme supramencionado; e (ii) de duas novas dispensas para a BBCE, em relação aos artigos 33 e 103, ambos da RCVM 135.
O Colegiado, por unanimidade, acompanhando a manifestação da área técnica, deliberou conceder temporariamente as dispensas pleiteadas.
- Anexos
- Consulte a Ata da Reunião em que esta decisão foi proferida: