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ATA DA REUNIÃO DO COLEGIADO Nº 19 DE 23.05.2023

Participantes

• JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTO – PRESIDENTE
• FLÁVIA MARTINS SANT'ANNA PERLINGEIRO – DIRETORA
• ALEXANDRE COSTA RANGEL – DIRETOR
• OTTO EDUARDO FONSECA DE ALBUQUERQUE LOBO – DIRETOR
• JOÃO CARLOS DE ANDRADE UZÊDA ACCIOLY – DIRETOR
(*)

(*) Por estar na CVM de Brasília, participou por videoconferência.

Outras Informações

Foi sorteado o seguinte processo:
 

PAS
Reg. 2860/23 - 19957.015734/2022-36 - DAR


Ata publicada no site em 22.06.2023, exceto decisão referente ao Proc. 19957.014576/2022-05 (Reg. nº 2859/23) divulgada em 26.05.2023.

APRECIAÇÃO DE PROPOSTA DE TERMO DE COMPROMISSO – PROC. 19957.004454/2021-11

Reg. nº 2862/23
Relator: SGE

Trata-se de proposta de termo de compromisso apresentada por Massao Fabio Oya (“Proponente”), na qualidade de administrador e membro do conselho fiscal do Banco do Estado do Rio Grande do Sul S.A. (“Companhia”), previamente à instauração de possível Processo Administrativo Sancionador (“PAS”) pela Superintendência de Relações com Empresas – SEP.

O processo foi instaurado pela SEP para apurar possível descumprimento, pelo Proponente, do dever de sigilo previsto no art. 155, § 1º, da Lei nº 6.404/1976, em relação a fatos associados à suposta divulgação de informações sigilosas, ainda não disponibilizadas ao mercado, às quais tivera acesso em razão do cargo ou posição que ocupava. Não há outros investigados no processo.

Após a solicitação de manifestação prévia pela SEP, o Proponente apresentou proposta de termo de compromisso, na qual propôs pagar à CVM o valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais).

Em razão do disposto no art. 83 da Resolução CVM nº 45/2021 (“RCVM 45”), a Procuradoria Federal Especializada junto à CVM – PFE/CVM apreciou, à luz do art. 11, § 5º, incisos I e II, da Lei nº 6.385/1976, os aspectos legais da proposta apresentada, tendo opinado pela inexistência de óbice jurídico à celebração de termo de compromisso.

O Comitê de Termo de Compromisso (“Comitê”), em 28.02.2023, tendo em vista (i) o disposto no art. 83 c/c o art. 86, caput, da RCVM 45; e (ii) o fato de a Autarquia já ter negociado termo de compromisso em casos de infração, em tese, ao art. 155, §1º, da Lei nº 6.404/1976, entendeu que seria possível discutir a viabilidade de um ajuste para o encerramento antecipado do caso.

Assim, considerando, em especial, (i) o disposto no art. 86, caput, da RCVM 45; (ii) as negociações realizadas pelo Comitê em casos similares com propostas de termo de compromisso aprovadas pelo Colegiado da CVM; (iii) a fase em que se encontrava o processo (pré-sancionadora); (iv) o fato de a conduta ter sido praticada após a entrada em vigor da Lei nº 13.506/2017, e de existirem novos parâmetros balizadores para negociação de solução consensual para esse tipo de conduta; (v) o porte e a dispersão acionária da Companhia; e (vi) o histórico do Proponente, o Comitê propôs o aprimoramento da proposta apresentada para assunção das seguintes obrigações (“Contraproposta”):

(i) obrigação pecuniária - pagar à CVM, em parcela única, o valor de R$ 331.500,00 (trezentos e trinta e um mil e quinhentos reais); e

(ii) obrigação de não fazer - deixar de exercer, pelo prazo de 1 (um) ano, contados a partir de 10 (dez) dias úteis da publicação do Termo de Compromisso na seção “Diário Eletrônico” da página da CVM na rede mundial de computadores, nos termos do art. 91 da Resolução CVM nº 45/2021, o cargo de administrador (Diretor ou membro de Conselho de Administração) ou de Conselheiro Fiscal de companhia aberta.

Diante disso, o Proponente aditou sua proposta de termo de compromisso, oferecendo o montante de R$ 331.500,00 (trezentos e trinta e um mil e quinhentos reais), para pagamento em 15 (quinze) parcelas mensais de R$ 22.100,00 (vinte e dois mil e cem reais), tendo discordado da obrigação de não fazer sugerida pelo Comitê.

Na sequência, o Comitê reiterou os termos da Contraproposta pelos seus próprios e jurídicos fundamentos.

Tempestivamente, o Proponente manifestou sua concordância com a Contraproposta do Comitê.

Ante o exposto, o Comitê entendeu que a celebração do termo de compromisso seria conveniente e oportuna, considerando a contrapartida adequada e suficiente para desestimular práticas semelhantes, em atendimento à finalidade preventiva do instituto, razão pela qual sugeriu ao Colegiado da CVM a aceitação da proposta.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando o parecer do Comitê, deliberou aceitar a proposta de Termo de Compromisso apresentada.

Na sequência, o Colegiado, determinando que o pagamento será condição do termo de compromisso, fixou os seguintes prazos: (i) dez dias úteis para a assinatura do termo de compromisso, contados da comunicação da presente decisão ao Proponente; e (ii) dez dias úteis para (a) o cumprimento da obrigação pecuniária assumida, e (b) o início do período de cumprimento da obrigação de não fazer, ambos a contar da publicação do termo de compromisso no “Diário Eletrônico” da CVM, nos termos do art. 91 da Resolução CVM nº 45/2021.

A Superintendência Administrativo-Financeira – SAD foi designada responsável por atestar o cumprimento da obrigação pecuniária assumida e a SEP, responsável por atestar o cumprimento da obrigação de não fazer. Por fim, o Colegiado determinou que, uma vez cumpridas as obrigações pactuadas, conforme atestado pela SAD e pela SEP, o processo seja definitivamente arquivado em relação ao Proponente.

CONSULTA SOBRE INTERPRETAÇÃO DO §1º DO ART. 204 DA LEI Nº 6.404/76 – DISTRIBUIÇÃO DE DIVIDENDOS – PROC. 19957.014576/2022-05

Reg. nº 2859/23
Relator: SEP

Trata-se de consulta apresentada pela Superintendência de Relações com Empresas – SEP ao Colegiado da CVM, nos termos do §8º do art. 4º da Resolução CVM nº 45/2021, sobre a interpretação do limite previsto no §1º do art. 204 da Lei nº 6.404/1976.

Originalmente, o Processo foi instaurado pela SEP à luz dos fatos relevantes publicados pela Petróleo Brasileiro S.A. (“Petrobras” ou “Companhia”) em 05.05.2022, 28.07.2022 e 03.11.2022, referentes a pagamentos de dividendos intercalares e intermediários da Companhia ao longo do exercício de 2022.

Em síntese, a SEP observou que: (i) a Petrobras possuía o valor de R$164 bilhões registrado em sua conta Reserva de Lucros em 31.12.2021; (ii) a Companhia teve resultado positivo ao longo dos trimestres de 2022 (R$44,8 bilhões no 1ºITR2022, R$54,5 bilhões no 2ºITR2022 e R$46,2 bilhões no 3ºITR2022), e, nos termos do art. 54 do Estatuto Social, é permitido ao Conselho de Administração aprovar a distribuição de dividendos intercalares e intermediários, não tendo estabelecido a mesma limitação disposta no art. 204, §1º da Lei nº 6.404/1976; (iii) embora a exigência de que o valor dos dividendos pagos em periodicidade inferior a seis meses sejam limitados ao valor da Reserva de Capital seja explícita no §1º do art. 204, os referidos dividendos foram pagos em montante superior a Reserva de Capital da Companhia ao longo de 2022; e (iv) de acordo com a Petrobras, os pagamentos foram realizados com base na Política de Remuneração aos Acionistas divulgada pela Companhia em 24.11.2021.

Instada a se manifestar, a Companhia destacou seu entendimento de que o parâmetro Reserva de Capital teria sido estabelecido como limite pela Lei tendo em vista a inexistência de reservas de lucros, situação na qual esta seria a única reserva protegendo o capital social da companhia. Assim, na visão da Companhia, a interpretação sobre a proteção almejada pelo legislador ao impor o limite de distribuição de dividendos intermediários ao montante da Reserva de Capital deveria ser feita de modo extensivo, ampliando-se seu significado e alcance para permitir que o limite seja estendido até o montante das reservas de lucros.

Consultada acerca do assunto pela SEP, a Procuradoria Federal Especializada junto à CVM – PFE/CVM se manifestou, nos termos do Parecer n. 00028/2023/GJU - 2/PFE-CVM/PGF/AGU, no sentido de que “não seria lógico proibir a distribuição de dividendos intercalares até o seu montante (da reserva de capital). (...) [L]evando em conta sua finalidade (pagamento de dividendos) e, ainda, a faculdade legal de distribuir tanto a reserva de lucro (art. 201) - formada por lucro apurado em exercícios anteriores - como o lucro verificado no curso do período - será possível a distribuição de dividendos intercalares apurados no curso do exercício, até o limite desses recursos (reserva de lucro).”.

Em suma, a Procuradoria Federal Especializada junto à CVM – PFE/CVM concluiu que “pode haver distribuição de dividendos intermediários à conta de lucros ou reservas de lucros apurados no último balanço anual ou semestral aprovado (art. 204, §2º), independentemente da existência de reserva de capital; (ii) a distribuição de dividendos intercalares apurados em balanço referente a período inferior ao semestre, atendidos os requisitos legais, será realizada até o limite da reserva de lucro ou da reserva de capital, o que for maior”.

Em análise consubstanciada no Parecer Técnico nº 47/2023-CVM/SEP/GEA-3, a SEP concordou parcialmente com a Companhia e com a PFE/CVM no sentido de que o objetivo principal da restrição prevista no §1º do art. 204 era assegurar a saúde financeira da companhia, e que não seria lógico proibir a distribuição da reserva de lucros como dividendos intercalares. No entanto, na visão da área técnica, a Lei nº 6.404/1976 teria sido taxativa ao impor, como limite para distribuição de dividendos intercalares, o montante da reserva de capital de que trata o § 1º do artigo 182, não cabendo, neste caso, outra interpretação da lei.

Assim, considerando, (i) a inexistência de decisões do colegiado sobre o tema, (ii) que tal prática vem sendo realizada também por outras companhias abertas, e (iii) a divergência entre a interpretação literal defendida pela SEP e a interpretação da PFE/CVM de que a Reserva de Lucros poderia ser considerada em conjunto com a Reserva de Capital, a SEP encaminhou consulta em tese ao Colegiado da CVM, nos termos do §8º do art. 4º da Resolução CVM nº 45/2021, para manifestação de seu entendimento sobre a adequada interpretação do §1º do art. 204 da Lei nº 6.404/1976.

A Diretora Flávia Perlingeiro acompanhou a conclusão da SEP trazida pelo Parecer Técnico nº 47/2023-CVM/SEP/GEA-3, quanto à interpretação do disposto no §1º do art. 204 da Lei nº 6.404/1976, que estabelece limite à distribuição de dividendos intercalares apurados em balanço referente a período inferior ao semestre.

Nesse sentido, a Diretora entendeu que, em que pese a razoabilidade, sob uma ótica econômica, dos argumentos lançados a favor do entendimento distinto, a lei societária expressamente impôs, como limite para tal distribuição, o montante da reserva de capital de que trata o § 1º do artigo 182. A seu ver, dada a clareza do referido dispositivo, não se trata de apego demasiado à literalidade, mas sim apenas de interpretar a lei de forma estrita (nem restritiva nem ampliativa) e, ainda assim, sistemática e funcionalmente alinhada aos fins perseguidos pelo respectivo diploma legal, de preservação do capital social.

Para a Diretora, o legislador estabeleceu, no referido art. 204, requisitos legais a serem observados a fim de que lucros possam ser distribuídos para os acionistas antes de apurado o resultado do exercício social. Pontuou que, na sistemática erigida por lei, quando o lucro é apurado em balanço de periodicidade inferior à semestral (em que se trata de resultado ainda em formação), não basta haver lucro apurado em tal balanço, tendo a lei exigido proteção adicional, qual seja, que o dividendo intercalar distribuído não exceda o montante da reserva de capital. Embora o legislador pudesse ter também se referido, no §1º do art. 204, ao montante das reservas de lucros existentes (ou, ao menos, de algumas delas), fato é que não o fez, tendo conferido tratamento distinto aos “lucros maduros” retidos no patrimônio da sociedade para atender às finalidades específicas que respaldaram a constituição de reservas de lucro. Com efeito, tão logo desapareça a finalidade que motivou a constituição de reserva de lucros, ao amparo do disposto no §2º do mesmo artigo 204 e desde que autorizado pelo estatuto, o legislador deixou clara a possibilidade de distribuição de dividendos intermediários à conta de reservas de lucros existentes no último balanço anual ou semestral, independentemente da existência de reserva de capital.

A propósito, a Diretora ressalvou que, caso admitida a interpretação de que seria possível a distribuição de dividendos intercalares mesmo sem que haja reserva de capital, desde que existentes reservas de lucros em montante suficiente para garantir a integridade do capital social, seria necessário, também, impor restrição a que tal montante tomado como referência de limite à distribuição de lucro em formação venha a ser posteriormente distribuído antes de tal resultado se tornar definitivo, sob pena de comprometer o próprio racional que teria ensejado tal interpretação, porém, mais uma vez inovando em relação à sistemática prevista em lei.

Para a Diretora, tal “interpretação dita sistemática” não se presta a conferir um sentido ao que foi previsto, mas sim, ao acrescentar referência genérica a reservas de lucros no §1º do art. 204, acaba por extrapolar o conteúdo da norma; ainda que não divirja do entendimento de que eventual prejuízo superveniente afetaria igualmente o lucro apurado ao longo do exercício ou as reservas de lucros, pelo sistema de compensação do art. 189. Fato é também que tal sistema de compensação também já era o estabelecido pelo legislador, que, não obstante, prescreveu regimes distintos para a distribuição de lucros com base em balanços semestrais e os com base em balanços de período inferior ao semestral.

O Diretor Otto Lobo apresentou manifestação de voto acompanhando o Parecer da PFE/CVM, com base em interpretação sistemática do art. 204, §1°, da Lei n° 6.404/1976.

Segundo o Diretor, ao dispor que o total dos dividendos intercalares não poderá exceder o montante das “reservas de capital” no §1° do art. 204, o legislador buscou compatibilizar a dinâmica do mercado de capitais com a garantia da intangibilidade do capital social, de modo a evitar que prejuízos acumulados em período posterior à distribuição de dividendos intercalares venham eventualmente a implicar a distribuição de capital social aos acionistas.

No entendimento do Diretor, o legislador vislumbrou não somente a possibilidade de distribuição de dividendos em períodos inferiores ao semestral — desde que assegurada a integridade do capital social —, mas também a importância de tal mecanismo para o desenvolvimento do mercado de capitais, na medida em que permite o aumento da rentabilidade das ações e sua consequente competitividade frente a títulos públicos e de renda fixa.

Assim, para o Diretor, o cerne da questão ora analisada está no fato de que o princípio da intangibilidade do capital social também será assegurado no caso de a companhia possuir reservas de lucros ou lucros retidos a períodos anteriores, considerando que o art. 189, parágrafo único, da LSA prevê uma regra de compensação “ex lege” pois “o prejuízo do exercício será obrigatoriamente absorvido pelos lucros acumulados, pelas reservas de lucros e pela reserva legal, nessa ordem”.

No mesmo sentido, o Diretor ressaltou que o art. 200, I, da Lei n° 6.404/1976 dispõe que as reservas de capital somente serão utilizadas para “absorção de prejuízos que ultrapassarem os lucros acumulados e as reservas de lucros”. Ou seja, conforme observou o Diretor, ainda que a companhia não possua reservas de capital em montante suficiente para fazer frente ao lucro a ser distribuído em período inferior ao semestral, a existência de reservas de lucros assegurará a compensação de eventuais prejuízos subsequentes do exercício social, garantindo-se a integridade do capital social.

Nesse contexto, tendo em vista que as companhias são criadas com o fim de geração de lucro e (uma vez observadas as regras de distribuição aplicáveis, principalmente a garantia da integridade do capital social) sua consequente distribuição entre os acionistas, o Diretor Otto Lobo entendeu que o art. 204, §1º deve ser interpretado em coerência com o sistema legal no qual está inserido, no sentido de se permitir a distribuição de dividendos intercalares quando houver a existência de reservas de lucros em montante suficiente para fazer frente ao lucro intercalar que se delibere distribuir, independentemente da existência de reserva de capital.

Isso porque, em seu entendimento, a interpretação literal do art. 204, §1º, não é, por si só, suficiente para afastar o verdadeiro propósito da norma, ignorando-se não apenas os princípios que a norteiam, mas também o ordenamento jurídico em que ela se insere A melhor interpretação de uma norma deve buscar a coerência com o sistema legal — compreendendo o seu alcance como um todo —, de forma que a sua aplicação esteja em conformidade com os fins para os quais foi editada, consoante denominado por Karl Larenz como “redução teleológica”.

O Diretor João Accioly acompanhou as conclusões do voto do Diretor Otto Lobo e do Parecer da nº 00028/2023/GJU-2/PFE-CVM/PGF/AGU (“Parecer da PFE”).

O Presidente João Pedro Nascimento e os Diretores Alexandre Rangel e João Accioly, em linha com as conclusões do Parecer da PFE, votaram no sentido de que: (i) pode haver distribuição de dividendos intermediários à conta de lucros ou reserva de lucros apurados no último balanço anual ou semestral aprovado (art. 204, §2º), independentemente da existência de reserva de capital; e (ii) é possível a distribuição de dividendos intercalares, apurados em balanço referente a período anterior ao semestre, com base em valores constantes da reserva de lucro ou da reserva de capital, atendidos os requisitos legais aplicáveis.

Para além da conclusão, o Presidente João Pedro Nascimento e os Diretores Alexandre Rangel e João Accioly fizeram referência aos seguintes trechos do Parecer da PFE:

“(...) o regular trâmite tendente à distribuição anual aos acionistas ‘compreende os seguintes atos, na sequência: (a) prévio levantamento do balanço; (b) verificação do lucro; (c) não destinação dos lucros para a formação de reserva legal, estatutária, para contingências, bem como retenção de lucros e reservas de lucros a realizar; (d) proposta de distribuição dos lucros pela administração da sociedade após o atendimento às normas sobre reservas e compatibilidade com a situação financeira da companhia; e (e) declaração ou homologação

(...)

No que diz respeito à distribuição em período inferior a um ano, vale dizer que o pagamento de dividendos por várias vezes no mesmo exercício incentiva a aquisição de mais ações pelos investidores, beneficiando a sociedade. No entanto, diante do princípio da intangibilidade do capital social, o benefício dos sócios ou acionistas não deve afetar o patrimônio da sociedade. Ou seja, não se admite redução patrimonial que afete o capital social.

Assim, a eventual distribuição de lucros durante o curso do exercício social deve ser feita com cautela, diante da possibilidade de existência de prejuízos ainda no mesmo período. A cautela se justifica, ainda, porque a percepção de valores pelos acionistas se torna perfeita e não enseja devolução, mesmo que haja prejuízo subsequente, conforme se conclui da leitura do artigo 201, §2º da LSA: “os acionistas não são obrigados a restituir os dividendos que em boa-fé tenham recebido. Presume-se a má-fé quando os dividendos forem distribuídos sem o levantamento do balanço ou em desacordo com os resultados deste”.”

Adicionalmente às transcrições dos trechos acima do Parecer da PFE, Presidente João Pedro Nascimento e os Diretores Alexandre Rangel e João Accioly ressaltaram que os administradores de companhias abertas devem ser diligentes e cautelosos ao realizarem eventuais distribuições de dividendos intercalares com base em lucro “ainda não maduro” de resultados do exercício corrente tendo em vista os potenciais impactos negativos caso a companhia venha a apresentar prejuízos subsequentes e/ou resultados adversos que modifiquem a situação contábil e financeira da companhia, de tal modo a tornar inadequada aquela distribuição de dividendos intercalares realizada com base em lucro ainda não maduro (e que não se comprovou como lucro).

Em conclusão, por maioria, vencida a Diretora Flávia Perlingeiro, o Colegiado entendeu, em linha com o Parecer da PFE/CVM, ser possível a distribuição de dividendos intercalares, apurados em balanço referente a período inferior ao semestre, com base em valores constantes da reserva de capital ou reserva de lucros, atendidos os requisitos legais aplicáveis.

PROPOSTA DE CELEBRAÇÃO DE ACORDO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA ENTRE A CVM E ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CRIPTOECONOMIA - ABCRIPTO – PROC. 19957.005460/2022-77

Reg. nº 2861/23
Relator: SOI

Trata-se de proposta de celebração de Acordo de Cooperação Técnica entre a CVM e a Associação Brasileira de Criptoeconomia - ABCripto, cujos principais objetivos são o desenvolvimento de ações educacionais para formação profissional e educação financeira, a idealização de campanhas e materiais educacionais destinados à população sobre as novas tecnologias financeiras, em especial as finanças descentralizadas (DeFi) e outras aplicações baseadas em tecnologia DLT (Distributed Ledger Technology), bem como a colaboração com o Comitê de Sandbox da CVM, nos termos do artigo 10 da Resolução CVM nº 29, de 11 de maio de 2021.

Em atenção ao referido no item 11.4 do Ofício Interno n° 30/2023/CVM/SOI, a Diretora Flávia Perlingeiro pontuou não ter identificado, no material submetido ao Colegiado, declaração assinada pela Associação acerca do seu não enquadramento em qualquer situação de impedimento prevista na legislação aplicável, em especial no art. 39 da Lei n° 13.019/2014, como sinalizado, quanto ao que foi informado pela Superintendência de Proteção e Orientação aos Investidores – SOI que a pendência seria sanada com a juntada aos autos.

Isto posto, o Colegiado aprovou, por unanimidade, a celebração de Acordo de Cooperação Técnica entre a CVM e a Associação Brasileira de Criptoeconomia - ABCripto.

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SEP – PEDIDO DE ACESSO AOS AUTOS – PROC. 19957.002055/2022-05

Reg. nº 2804/23
Relator: SEP/GEA-5

Trata-se de retomada da análise iniciada na Reunião do Colegiado de 28.02.2023, acerca de recurso interposto por R.F.G. e R.R. (“Recorrentes”) contra decisão da Superintendência de Relações com Empresas – SEP, que deferiu parcialmente o pedido dos Recorrentes de vista integral aos autos de processo administrativo, instaurado para analisar denúncia por eles apresentada em face de Cyrela Brazil Realty S.A. - Empreendimentos e Participações ("Companhia"), KPMG Auditores Independentes LTDA. (“KPMG”) e Deloitte Touche Tohmatsu Auditores Independentes LTDA. (“Deloitte” e, em conjunto com a KPMG, “Auditores Independentes”), referente a supostas irregularidades nas informações periódicas da Companhia.

Em resposta ao pedido de vista dos Recorrentes, a SEP concedeu cópia parcial dos autos, não tendo sido concedido acesso, entre outros documentos considerados restritos, às manifestações encaminhadas pela KPMG e pela Deloitte no âmbito do processo, com fundamento no sigilo profissional (art. 5°, inciso XIV, da Constituição Federal e art. 6°, inciso I, do Decreto nº 7.724/2012).

Nesse sentido, no âmbito da análise, a SEP observou que a KPMG e a Deloitte formularam pedidos de sigilo em relação ao teor de suas respectivas manifestações, os quais foram reiterados pela Companhia. Assim, a SEP deferiu o pedido de tratamento sigiloso em relação às manifestações dos Auditores Independentes, tendo como base os seguintes fundamentos: (i) art. 5º, inciso XIV, da Constituição Federal; (ii) art. 7°, inciso XIII, da Lei nº 8.906/1994; (iii) art. 22 da Lei nº 12.527/2011; (iv) art. 5º, § 2º e art. 6°, inciso I do Decreto nº 7.724/2012; (v) item 4, alínea c, da NBC PG 01, de 07.02.2019; (vi) art. 3º, inciso III, da Resolução CVM nº 48/2021; (vii) art. 3º, inciso III e art. 4º, inciso VI, da Resolução CVM nº 23/2021; e (viii) art. 61, §3º, da Resolução CVM nº 80/2022.

Em sede de recurso, conforme destacado no item 24 do Parecer Técnico nº 9/2023-CVM/SEP/GEA-5, os Recorrentes questionaram a decisão da SEP de indeferir o pedido de acesso às referidas manifestações dos Auditores Independentes. Em síntese, os Recorrentes argumentaram a necessidade de transparência e qualidade da informação contábil, tendo afirmado que "o acesso a essas manifestações não configura violação ao sigilo profissional das informações prestadas. Pelo contrário, trata-se de informações de inegável interesse público, cuja publicidade deve ser assegurada a todos.”. Ademais, alegaram que as manifestações dos auditores independentes "não devem ser interpretadas como dados acobertados por sigilo profissional na relação entre auditor e cliente, dado que se trata de auditoria realizada justamente para fins de informação ao público acionista, com inegável relevância e utilidade destas informações para os usuários das demonstrações financeiras, como disposto na Lei no 6.404/76, na NBC T 6 e na NBC TA 701".

Em análise consubstanciada no Parecer Técnico nº 9/2023-CVM/SEP/GEA-5, a SEP reafirmou os fundamentos que embasaram a decisão comunicada por meio do Ofício nº 2/2023/CVM/SEP/GEA-5, que reconheceu o sigilo em relação às manifestações dos Auditores Independentes da Companhia no âmbito do presente Processo.

Conforme destacado pela área técnica, o auditor independente é um profissional contábil, e como tal, deve respeitar o Código de Ética Profissional do Contador e as demais Normas Brasileiras de Contabilidade, observando o sigilo profissional na relação entre auditor e cliente, bem como preservar a confidencialidade das informações que obtiver no exercício de sua profissão, exceto nos casos previstos em lei ou quando solicitado por autoridades competentes.

A esse respeito, a SEP fez referência às seguintes disposições: (i) alínea "c" do item 4 da NBC PG 01 (“Código de Ética Profissional do Contador”); (ii) subseção 114 – Confidencialidade da NBC PG 100 (R1), que dispõe sobre o cumprimento do Código, dos princípios fundamentais e da estrutura conceitual; (iii) NBC PA 01, que estabelece o “Controle de Qualidade para Firmas (Pessoas Jurídicas e Físicas) de Auditores Independentes”; e (iv) item A17 da NBC TA 200 (R1), que trata de "Objetivos Gerais do Auditor Independente e a Condução da Auditoria em Conformidade com Normas de Auditoria".

No mesmo sentido, a SEP observou que o sigilo profissional foi assegurado no inciso XIV, do art. 5º da Constituição Federal, no art. 22º da Lei nº 12.527/2011 (“Lei de Acesso à Informação” ou “LAI”) e nos art. 5º, § 2º e art. 6°, inciso I, do Decreto nº 7.724/2012, que regulamenta a LAI.

Ademais, a SEP ressaltou que a garantia ao sigilo foi prevista nas normas da CVM, especialmente: (i) no art. 3º, inciso III, da Resolução CVM nº 48/2021, que dispõe sobre a concessão de vista de processos administrativos; (ii) nos art. 3º, inciso III e art. 4º, inciso VI, da Resolução CVM nº 23/2021, que dispõe sobre o registro e o exercício da atividade de auditoria independente no âmbito do mercado de valores mobiliários; e (iii) no art. 61, §3º, da Resolução CVM nº 80/2022, que dispõe sobre o registro e a prestação de informações periódicas e eventuais dos emissores de valores mobiliários admitidos à negociação em mercados regulamentados de valores mobiliários.

Diante do exposto, a SEP sugeriu o não provimento do recurso, por entender que as manifestações dos Auditores Independentes da Companhia apresentadas no âmbito do presente Processo atendem à hipótese de tratamento restrito.

Ao iniciar a apreciação do recurso em Reunião de 28.02.2023, o Colegiado decidiu encaminhar o processo à Procuradoria Federal Especializada junto à CVM – PFE/CVM, para que se manifestasse sobre o assunto.

Em resposta, nos termos do Parecer n. 00042/2023/GJU - 2/PFE-CVM/PGF/AGU, a PFE/CVM concluiu, em linha com o entendimento da SEP, que o indeferimento do recurso é medida que se impõe, uma vez que, cuidando-se de informações cobertas por sigilo profissional (conforme o disposto no item 4, alínea c, da NBC PG 01), sua divulgação a terceiro se encontra vedada pelo disposto nos (i) art. 5°, inciso XIV, da Constituição Federal; (ii) art. 7°, inciso XIII, da Lei n° 8.906/1994; (iii) art. 22 da Lei 12.527/2011; e (iv) art. 5º, § 2º e art. 6°, inciso I do Decreto 7.724/2012.

A propósito, a PFE/CVM destacou que, pelo que se depreende da análise da SEP, não se está diante de demonstrações financeiras ou notas explicativas cuja divulgação seria obrigatória nos termos do art. 176, §1º, Lei 6.404/1976, conforme alegam os Recorrentes, mas de opinião dos auditores independentes sobre os procedimentos contábeis específicos adotados pela Companhia.

Assim, na visão da PFE/CVM, não seria razoável que, pela via da reclamação os Recorrentes tenham acesso a documentos que ordinariamente não teriam, especialmente se considerado que o principal escopo do sigilo profissional é a proteção dos clientes, ao mesmo tempo em que constitui um dever do profissional; e, ainda, que os documentos foram juntados aos autos por determinação da CVM (e não espontaneamente pelos auditores independentes), com pedido expresso para que fosse resguardado o sigilo em relação ao teor de suas manifestações.

Em adendo, tendo em vista que os Recorrentes atuam no mesmo segmento da Companhia e, desde 2012, estão envolvidos em uma disputa judicial com os sócios majoritários de sociedade do Grupo Cyrela, na qual a Companhia possui participação no capital social desde dezembro de 2013; e considerando, ainda, a alegação da Companhia de que “abertura geral e irrestrita de todos os dados internos redundaria em perda de competitividade empresarial e benefício a concorrentes e aproveitadores. Por isso, as hipóteses de publicação obrigatória de documentos são sempre excepcionais e expressamente previstas em lei e na regulamentação da CVM”, a PFE/CVM também concluiu ser aplicável o disposto no art. 61, §3º, da Resolução CVM n° 80/2021, conforme invocado pela área técnica para indeferimento do pedido de vista.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando a manifestação da área técnica, deliberou pelo não provimento do recurso.

RECURSO EM PROCESSO DE MECANISMO DE RESSARCIMENTO DE PREJUÍZOS – M.L.C. / CLEAR CTVM S.A. – PROC. 19957.003825/2022-29

Reg. nº 2858/23
Relator: SMI

Trata-se de recurso interposto por M.L.C. (“Reclamante” ou “Recorrente”) contra decisão da BSM Supervisão de Mercados (“BSM”) que indeferiu seu pedido de ressarcimento de prejuízos, no âmbito do Mecanismo de Ressarcimento de Prejuízos (“MRP”), movido em face de Clear CTVM S.A. (“Reclamada” ou “Corretora”).

Em sua reclamação à BSM, a Reclamante relatou que, em 14.06.2021, teve seu nome inserido no Rol de Inadimplentes da B3 S.A. - Brasil, Bolsa, Balcão (“B3”), o que fez com que todas as suas contas fossem bloqueadas. Diante disso, pleiteou ressarcimento no montante de R$ 17.060,00 (dezessete mil e sessenta reais), decorrente do resultado obtido com suas negociações realizadas no pregão de 11.06.2021, sem conhecimento do referido bloqueio, e que deveria ter sido creditado em sua conta na Reclamante em 14.06.2021.

Em sua defesa, a Reclamada alegou que: (i) interagiu regularmente e tempestivamente com a Reclamante; (ii) embora a Reclamante tenha operado, em 11.06.2021, por meio da plataforma de negociação ProfitChart, e obtido o lucro bruto potencial de R$ 17.060,00, o CPF da investidora encontrava-se no Rol de Inadimplentes da B3 no momento das operações, em decorrência de pendências financeiras com outro Participante. Diante disso, as referidas operações foram incluídas na conta erro da Corretora, não sendo processado o resultado ou gerada nota de corretagem; e (iii) conforme havia sido informado à Reclamante, decorreria da B3 a decisão de não acatar as operações realizadas por cliente que conste do Rol de Inadimplentes, sendo a Reclamada apenas responsável pela intermediação no envio das ordens.

A Superintendência de Auditoria de Participantes da BSM (“SAN”) verificou que a Reclamante foi incluída no Rol de Comitentes Inadimplentes, conforme comunicado emitido em 10.06.2021, tendo saído da referida lista em 17.06.2021, de modo que as operações referidas na reclamação teriam ocorrido dentro do período de bloqueio. Assim, com base no Relatório de Auditoria da SAN, a Superintendência Jurídica da BSM (“SJUR”) concluiu que a Reclamada teria atuado em conformidade com as regras da B3, pois as operações foram corretamente lançadas na conta erro, devido à inclusão da Reclamante no Rol de Inadimplentes da B3, não sendo, portanto, processadas pelo administrador de mercado.

O Diretor de Autorregulação da BSM (“DAR”), em linha com as análises da SAN e da SJUR, entendeu que o procedimento adotado pela Reclamada estaria de acordo com o disposto no Manual de Administração de Risco da Câmara B3, quanto ao tratamento a ser dado a investidores incluídos no Rol de Inadimplentes da B3. Desse modo, o DAR julgou pela improcedência da reclamação, concluindo não ter sido configurada ação ou omissão da Reclamada que tenha dado causa ao prejuízo alegado, não incidindo hipótese de ressarcimento prevista no art. 77 da Instrução CVM nº 461/2007.

Em recurso à CVM, a Reclamante argumentou fundamentalmente que: (i) teve ciência da inclusão do nome no Rol de Inadimplentes da B3 somente no dia 14.06.2021, ao perceber que as operações do dia 11.06.2021 não foram creditadas na conta; (ii) não houve comunicação de nenhum bloqueio ou alerta por parte da plataforma ou da Reclamada em 11.06.2021, de modo que as operações foram realizadas normalmente; e (iii) a Instrução CVM n° 505/2011 determina, em seu art. 20, § 1º, incisos V, VII e VIII, que a corretora intermediária deve estabelecer regras, procedimentos e controles que possibilitem o cumprimento das ordens dos clientes investidores, dentre as quais deveriam estar os procedimentos de recusa, cancelamento, alteração das ordens e zeragem compulsória, bem como os critérios para o atendimento.

A Superintendência de Relações com o Mercado e Intermediários – SMI, em análise consubstanciada no Ofício Interno nº 44/2023/CVM/SMI/SEMER, observou que o Contrato de Intermediação e Custódia e Outras Avenças celebrado entre a Reclamante e a Reclamada, em seu item 2.43, dispõe que a Corretora não acatará ordens de operações de clientes que se encontrarem, por qualquer motivo, impedidos de operar no mercado de valores mobiliários.

Assim, no entendimento da área técnica, a Corretora teria falhado ao admitir as ordens da Reclamante em 11.06.2021 - data em que a investidora já constava na lista de investidores inadimplentes da B3 -, e, na sequência, incluir essas operações na denominada “conta erro”, não tendo processado o resultado em nome da Reclamante ou gerado nota de corretagem relacionada. Ademais, segundo a SMI, ao reespecificar os referidos negócios tendo como comitente a Corretora, a Reclamada teria auferido o ganho resultante das operações, beneficiando-se indevidamente do próprio erro.

Ante o exposto, a SMI concluiu que há relação direta entre a falha da Corretora em admitir as operações e o prejuízo da Reclamante em não receber o ganho resultante dos negócios, restando caracterizada, portanto, a hipótese prevista no art. 124 da Resolução CVM nº 135/2022.

Desse modo, a SMI opinou pelo provimento do recurso, de modo a ressarcir a Recorrente pelo valor de R$ 17.060,00 (dezessete mil e sessenta reais), devidamente corrigido monetariamente.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando a manifestação da área técnica, deliberou pelo provimento integral do recurso.

RECURSO EM PROCESSO DE MECANISMO DE RESSARCIMENTO DE PREJUÍZOS – M.S.A.O. / XP INVESTIMENTOS CCTVM S.A. – PROC. 19957.001989/2022-11

Reg. nº 2863/23
Relator: SMI

Trata-se de recurso interposto por M.S.A.O. (“Reclamante” ou “Recorrente”) contra decisão da BSM Supervisão de Mercados (“BSM”) que indeferiu seu pedido de ressarcimento de prejuízos, no âmbito do Mecanismo de Ressarcimento de Prejuízos (“MRP”), movido em face de XP Investimentos CCTVM S.A. (“Reclamada” ou “Corretora”).

Em sua reclamação à BSM, o Reclamante relatou que, em 27.02.2020, a área de risco da Corretora teria encerrado indevidamente suas posições, que contemplavam uma estrutura com travas de Call e de Put em opções da Petrobras, cuja exposição máxima era de R$ 240.000,00. Em síntese, segundo o Reclamante, após a intervenção do assessor da Corretora, que desmontou as estruturas de opções, o investidor ficou com uma posição em opções de Call (PETRC302) na quantidade de 120.000 comprada no strike de R$ 29,70 e uma posição em opções de Put (PETRO307) na quantidade de 120.000 vendida no strike de R$ 30,20. Assim, o Reclamante teria ficado vendido a descoberto em Put sem qualquer hedge ou limitação de perdas.

Nesse contexto, o Reclamante alegou que a nota de corretagem registrou um valor em débito de R$ 260.341,87 como custo para encerrar todas as posições em opções, sendo, portanto, um valor de R$ 20.341,87 além do risco máximo da estrutura por ele montada e garantida. Ademais, afirmou ter enfrentado dificuldades de acesso ao Home Broker da Corretora, tendo tomado conhecimento de que neste dia as plataformas da XP apresentaram problemas. Desse modo, o Reclamante solicitou ressarcimento do valor máximo permitido pelo MRP (R$ 120.000,00).

Em sua defesa, a Reclamada afirmou que, no pregão reclamado, todas as intervenções feitas pelo departamento de risco da Corretora foram devidas e ocorreram de acordo com seu Manual de Risco. Em resumo, a Reclamada observou que: (i) na abertura do pregão de 27.02.2020, o Reclamante estava com patrimônio líquido negativo; (ii) devido a condições de mercado, o Reclamante atingiu a perda máxima da estrutura; e (iii) não havia liquidez para o departamento de risco zerar a posição vendida na PETRO307, tendo em vista que apenas foram executadas cerca de 5% do total de ofertas alocadas no mercado naquele pregão.

A Superintendência Jurídica da BSM (“SJUR”), com base no Relatório de Auditoria da Superintendência de Auditoria de Participantes da BSM (“SAN”), elaborou Parecer destacando que o ponto controvertido da reclamação consiste em apurar se o Reclamante sofreu prejuízo passível de ressarcimento, decorrente da alegada irregularidade no procedimento de liquidação compulsória de PETRC285, PETRO285, PETRC302 e PETRO307 e a inexecução da ordem de PETRO307 encerrada pela Reclamada no pregão.

Em seu Parecer, a SJUR destacou as seguintes conclusões do Relatório de Auditoria: (i) diante das condições de mercado, não havia condições para executar ordem de compra inserida pelo Reclamante do ativo PETRO307. Assim, a referida ordem inserida pelo Reclamante foi posteriormente cancelada pela Reclamada quando se iniciou o processo de liquidação compulsória; e (ii) no momento da liquidação compulsória, o patrimônio líquido do Reclamante era inferior às garantias exigidas, de forma que o investidor não tinha garantias disponíveis suficientes para manutenção das posições.

Dessa forma, considerando as conclusões do Relatório de Auditoria, a SJUR entendeu que não houve conduta irregular da Corretora relacionada à liquidação compulsória das posições do Reclamante no pregão. Em linha com o Parecer da SJUR, o Diretor de Autorregulação da BSM julgou pela improcedência da reclamação, por entender que não restou configurada hipótese de ressarcimento prevista no art. 77 da Instrução CVM nº 461/2007.

Em recurso à CVM, o Recorrente reafirmou os argumentos apresentados na reclamação inicial e em manifestação posterior, no sentido de que a intervenção do sistema de gerenciamento de risco da Corretora não reduziu o risco, conforme alegado pela Reclamada, mas aumentou a exposição ao risco, em desacordo com o Manual de Risco da Corretora.

A Superintendência de Relações com o Mercado e Intermediários – SMI, em análise consubstanciada no Ofício Interno nº 45/2023/CVM/SMI/SEMER, entendeu que o departamento de risco da Reclamada não cumpriu, em essência, as determinações de seu Manual de Risco, que informa que possui sistemas de monitoramento de forma a garantir que o nível de exposição ao risco seja menor que o total de garantia alocado.

Nesse sentido, a área técnica observou que: (i) o Reclamante ficou vendido em 120.000 PETRO307, por 41 minutos e 43 segundos, sem a proteção da outra perna da trava (120.000 PETRO285), que foi vendida às 10h23min24s; (ii) o Manual de Risco informa que as opções que exigem maior garantia têm prioridade na liquidação. Entretanto, a ordem seguida pela Reclamada não cumpriu esta determinação, pois fez com que o Reclamante ficasse vendido à descoberto e as garantias exigidas nesta situação saltaram de R$ 8.870,00, às 10h23min, para R$ 321.170,00, às 11h05min; (iii) o Manual de Risco informa que a Reclamada pode reduzir total ou parcialmente as posições do cliente, com objetivo de reduzir o risco dentro dos padrões aceitáveis dos limites por ela exigidos. Porém, conforme mencionado acima, conclui-se que a ordem seguida na liquidação efetuada colocou o Recorrente em um padrão de risco maior; e (iv) ao liquidar as 120.000 PETRO285, desmontando uma “perna” da trava contida na estratégia de opções do Reclamante, a Reclamada fez com que o investidor ficasse exposto na venda de 120.000 PETRO307, por aproximadamente 42 minutos, com risco máximo de R$ 3.624.000,00.

Nesse contexto, a SMI considerou que a Reclamada somente deveria liquidar as 120.000 PETRO285, após liquidar as 120.000 PETRO307. Porém, como a Reclamada só conseguiu liquidar a opção PETRO307 às 11h05min07s, na visão da área técnica, a liquidação de 120.000 PETRO285 deveria começar a partir deste momento, ao invés de ser zerada às 10h43min24s.

Diante disso, a fim de avaliar se a referida ordem de liquidação compulsória causou prejuízo ao Recorrente, a área técnica comparou o preço de PETRO285 a partir de 11h05min07s com o preço real da efetiva execução de venda de 120.000 destas opções, pelo departamento de risco da Reclamada, a R$ 2,85 a unidade, às 10h43min07s. Nesse sentido, a área técnica apurou que, devido à baixa liquidez das opções Put em geral, a venda de 120.000 unidades de PETRO285 demoraria quase uma hora para ser executada, entre às 11h06min59 e 12h02min54, pois nesse período a negociação ultrapassou as 120.000 opções (negociou-se um total de 131.800 opções), ao preço médio de R$ 3,10.

Portanto, a SMI concluiu que a liquidação compulsória foi indevida, pois expôs o Recorrente a um risco desproporcional e, adicionalmente, lhe gerou uma perda de receita de R$ 30.000,00, obtido pelo seguinte cálculo: 120.000 x (3,10 – 2,85).

Ante o exposto, a SMI considerou que foi identificada uma ação da Reclamada que ocasionou o prejuízo de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), razão pela qual opinou pelo provimento parcial do recurso apresentado.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando a manifestação da área técnica, deliberou pelo provimento parcial do recurso.

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