CVM agora é GOV.BR/CVM

 
Você está aqui:

Decisão do colegiado de 30/05/2023

Participantes

· JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTO – PRESIDENTE
· FLÁVIA MARTINS SANT'ANNA PERLINGEIRO – DIRETORA
· ALEXANDRE COSTA RANGEL – DIRETOR
· OTTO EDUARDO FONSECA DE ALBUQUERQUE LOBO – DIRETOR
· JOÃO CARLOS DE ANDRADE UZÊDA ACCIOLY – DIRETOR
(*)

(*) justificadamente, por motivo de força maior, participou somente das deliberações referentes aos itens 1 e 3 (Processos 19957.004687/2020-33 e 19957.004971/2022-71) da ordem do dia (considerando a inversão de pauta ocorrida), pois teve que se ausentar antecipadamente para atender à demanda de saúde de seu familiar, em regime de urgência.

NOVA DEFINIÇÃO JURÍDICA DOS FATOS – PAS 19957.008434/2019-03

Reg. nº 2200/21
Relator: DAR

A Diretora Flávia Perlingeiro se declarou impedida por ter sido consultada sobre fatos relacionados a aspecto tratado neste Processo Administrativo Sancionador (PAS) na época em que atuava como advogada do Sistema BNDES / BNDES Participações S.A., entidade que, na qualidade de acionista das companhias JBS e Bertin, é especificamente nomeada na descrição dos fatos subjacentes ao PAS, ainda que, no caso, não seja peticionante, recorrente ou acusada. Por essa razão, não participou do exame do item da ordem do dia.

Trata-se de proposta de nova definição jurídica dos fatos, nos termos do art. 47 da Resolução CVM n° 45/2021, no âmbito do Processo Administrativo Sancionador 19957.008434/2019-03 (“Processo”) instaurado pela Superintendência de Processos Sancionadores – SPS (“Área Técnica”) para apuração “de eventuais irregularidades relacionadas a questão informacional envolvendo a Blessed Holdings, e sobre a operação de incorporação da Bertin S.A pela JBS S.A., com a participação do BNDESPar”.

Concluída a fase de instrução do respectivo inquérito, a SPS apresentou peça de acusação (“Acusação”) em face de (i) Joesley Mendonça Batista (“Joesley Batista”), Wesley Mendonça Batista (“Wesley Batista”), acionistas controladores da JBS S.A. (“JBS” ou “Companhia”); (ii) Natalino Bertin, Silmar Roberto Bertin (“Silmar Bertin”), acionistas controladores da Bertin S.A. (“Bertin”); e (iii) Gilberto de Souza Biojone Filho (“Gilberto Biojone”), representante legal no Brasil da Blessed Holdings LLC (“Blessed”).

O Processo situa-se no contexto da operação de incorporação da Bertin pela JBS (“Incorporação”), anunciada ao mercado por meio de fatos relevantes publicados em 16.09.2009, 22.10.2009 e 12.12.2009. De acordo com a Acusação, a Incorporação contou com a participação da Blessed, veículo de investimento constituído nos Estados Unidos e de titularidade de Joesley Batista e Wesley Batista. A participação detida por Joesley Batista e Wesley Batista na Blessed, porém, não seria de conhecimento público.

Em 24.12.2009, no contexto da Incorporação, segundo a Acusação, foram alienadas por Natalino Bertin e Silmar Bertin para a Blessed cotas de emissão do Bertin Fundo de Investimento em Participações (“Bertin FIP”), por valores alegadamente irrisórios. O Bertin FIP era um dos acionistas da Bertin à época (“Transferência de Cotas”). Com a Transferência de Cotas, (i) a Blessed teria passado a deter 85,3% do Bertin FIP; e (ii) Joesley Batista e Wesley Batista teriam passado a deter 54,91% do capital social da JBS.

No âmbito da Incorporação, os acionistas minoritários da JBS tiveram a sua participação diluída em 39,25% (“Diluição dos Minoritários”), que deveria também ser o percentual de diluição dos acionistas controladores. Contudo, por meio da Transferência de Cotas, Joesley Batista e Wesley Batista teriam tido, ao invés de diluição, um acréscimo de 9,58% em suas participações acionárias na Companhia.

Ao final, a Acusação propôs a responsabilização de Joesley Batista, Wesley Batista, Natalino Bertin, Silmar Bertin e Gilberto Biojone pela prática de operação fraudulenta com cotas de emissão do Bertin FIP, conforme definida no item II e vedada no item I da Instrução CVM n° 8/1979, então vigente.

O Relator do processo, Diretor Alexandre Rangel, discordou da capitulação regulamentar proposta pela Área Técnica e da definição jurídica dos fatos constantes da Acusação, especificamente com relação a Joesley Batista e Wesley Batista.
Na visão do Relator, sem adentrar o mérito sobre as imputações, o conjunto fático-probatório demonstrado nos autos pela Área Técnica demanda a análise da conduta de Joesley Batista e Wesley Batista sob a perspectiva de potencial ocorrência, ou não, de abuso do poder de controle, em violação, em tese, ao art. 117, caput, da Lei n° 6.404/1976, conforme modalidades exemplificativas previstas nas alíneas “a” e “c” do §1° do referido art. 117.

Nesse sentido, o Relator destacou seu entendimento de que seria equivocada a tentativa de se caracterizar a Transferência de Cotas discutida neste caso como o núcleo central mais relevante da suposta infração praticada por Joesley Batista e Wesley Batista. Para o Relator, não é na Transferência de Cotas que se encontra o cerne jurídico da suposta atuação ilícita dos referidos acusados. A seu ver, eventual irregularidade por eles praticada estaria relacionada, de forma mais clara e precisa, com (i) o fato de que o verdadeiro valor atribuído à Bertin seria diferente daquele divulgado e praticado na Incorporação; e (ii) as condutas praticadas por Joesley Batista e Wesley Batista nesse contexto, para fins de implementação da Incorporação e da prática de todos os atos necessários para tanto, em prejuízo da participação dos acionistas minoritários da JBS.

Nessa linha, o Relator ressaltou que o art. 117, caput, da Lei n° 6.404/1976 prevê que o acionista controlador responderá pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder, dentre os quais (i) a orientação da companhia para fim estranho ao objeto social ou o favorecimento de outra sociedade em prejuízo da participação dos acionistas minoritários; e (ii) a adoção de decisões que não tenham por fim o interesse da companhia e visem a causar prejuízo a acionistas minoritários, aos que trabalham na empresa ou aos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia.

Segundo o relator, nesses termos, restaria claro que os fatos descritos pela Acusação sobre Joesley Batista e Wesley Batista se relacionam de forma mais correta, precisa e adequada à eventual irregularidade de abuso de poder de controle.

Nesse contexto, na visão do Relator, a descrição dos fatos pela Acusação sinaliza que a operação de Transferência de Cotas seria, na verdade, apenas um meio para a conclusão de outro delito maior, a saber, o abuso de poder de controle. Desse modo, no caso de Joesley Batista e Wesley Batista, as demais condutas praticadas ficariam incorporadas, em verdadeira consunção, à imputação de abuso de poder de controle.

Assim, o Relator concluiu que eventual fraude praticada por Joesley Batista e Wesley Batista mediante a Transferência de Cotas, em termos de definição jurídica dos fatos descritos no Processo, representa apenas uma etapa englobada por uma possível prática de abuso de poder de controle, cuja ocorrência, ou não, será apreciada pelo Colegiado quando do julgamento deste Processo.

Ante o exposto, com base no art. 47, caput, da Resolução CVM n° 45/2021, o Relator propôs (i) nova definição jurídica aos fatos averiguados pela SPS no âmbito deste Processo, de modo que as condutas de Joesley Batista e Wesley Batista sejam analisadas à luz do disposto no art. 117, caput, da Lei nº 6.404/1976, sob a capitulação de abuso de poder de controle, conforme modalidades exemplificativas previstas nas alíneas “a” e “c” do §1° do mesmo art. 117; e (ii) a manutenção da imputação escolhida pela Acusação, de prática de operação fraudulenta, conforme definida no item II e vedada no item I da Instrução CVM n° 8/1979, quanto a Natalino Bertin, Silmar Bertin e Gilberto Biojone.

Ademais, nos termos do Despacho do Relator, caso aprovada a proposta, o Processo deverá ser encaminhado à GCP para que providencie, nos termos do art. 47, §1°, da Resolução CVM n° 45/2021, a intimação de todos os acusados para aditamento de suas defesas, no prazo de 30 (trinta) dias a contar do recebimento da intimação, facultada a produção de novas provas, nos termos da legislação e regulamentação aplicáveis.

O Colegiado, por unanimidade, aprovou a proposta de nova definição jurídica dos fatos nos termos do despacho apresentado pelo Relator, no sentido de que a acusação de prática de operação fraudulenta com cotas do Bertin FIP, conforme definidas no item II, e vedadas no item I da Instrução CVM n° 8/1979, seja substituída pela acusação de infração ao art. 117, caput, da Lei nº 6.404/1976, sob a capitulação de abuso de poder de controle, conforme modalidades exemplificativas previstas nas alíneas “a” e “c” do §1° do mesmo art. 117, em relação aos acusados Joesley Mendonça Batista e Wesley Mendonça Batista, mantendo a capitulação originalmente proposta pela área técnica em relação aos acusados Gilberto de Souza Biojone Filho, Natalino Bertin e Silmar Roberto Bertin.

Sem adentrar na análise do mérito do caso concreto, o Presidente João Pedro Nascimento acompanhou a proposta de nova definição jurídica dos fatos apresentada pelo Diretor Relator. Em complemento, o Presidente observou que, diante da fase processual avançada e da maior proximidade do Diretor Relator com os fatos e demais elementos do caso, ele tem melhor cognição sobre a correta definição jurídica dos fatos do que os demais membros do Colegiado. Nesse sentido, com base em uma amostra dos precedentes trazidos na manifestação do Diretor Relator, nota-se que o Colegiado acompanhou todas as propostas de redefinição jurídica dos fatos apresentadas por Diretores Relatores em situações semelhantes.

Voltar ao topo