EXTRATO DA ATA DA REUNIÃO DO COLEGIADO Nº 20 DE 10.06.2025
Participantes
• JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTO – PRESIDENTE
• JOÃO CARLOS DE ANDRADE UZÊDA ACCIOLY – DIRETOR (*)
• MARINA PALMA COPOLA DE CARVALHO – DIRETORA (*)
(*) Participou por videoconferência.
Outras Informações
- Decisão referente ao Proc. 19957.005983/2025-66 (Reg. 3292/25) publicada em 10.06.2025.
PEDIDO DE INTERRUPÇÃO DO CURSO DO PRAZO DE CONVOCAÇÃO DE ASSEMBLEIA GERAL EXTRAORDINÁRIA DA ROSSI RESIDENCIAL S.A – EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL – PROC. 19957.005983/2025-66
Reg. nº 3292/25Relator: SEP
Trata-se de pedido de interrupção do curso do prazo de convocação de assembleia, referente à Assembleia Geral Ordinária e Extraordinária (“AGOE”) da Rossi Residencial S.A. – Em recuperação judicial (“Companhia” ou “Rossi”), convocada para 12.06.2025, formulado pelos acionistas Aperoama Participações Ltda. (“Aperoama”) e RCR Servicos Administrativos Ltda. (“RCR” e, em conjunto com Aperoama, “Requerentes”), com base no art. 124, §5°, II, da Lei n° 6.404/1976 (“LSA”).
Em 13.05.2025, a Companhia publicou edital de convocação para a AGOE a ser realizada em 12.06.2025, sendo previstos os seguintes itens na ordem do dia da AGE:
(i) Aprovação da suspensão dos direitos políticos do acionista RCR Serviços Administrativos Ltda., na forma do artigo 120 da Lei das Sociedades por Ações, em razão de violação ao Estatuto Social;
(ii) Aprovação da suspensão dos direitos políticos do acionista Aperoama Participações Ltda., na forma do artigo 120 da Lei das Sociedades por Ações, em razão de violação ao Estatuto Social;
(iii) Aprovação do aumento do capital social da Companhia, no valor de R$ 748.769,79 (setecentos e quarenta e oito mil, setecentos e sessenta e nove reais e setenta e nove centavos), corrigidos e atualizados de acordo com a TR acumulada até a data da AGEO, nos termos da cláusula 3.1.3.2. do Plano de Recuperação Judicial, mediante subscrição privada de novas ações, para viabilizar a capitalização prevista no Plano de Recuperação Judicial; e
(iv) Aprovação da alteração do artigo 5º do Estatuto Social da Companhia para refletir o novo capital social da Companhia.
Na proposta da administração divulgada em 13.05.2025, a Companhia informou que: (a) a RCR e Aperoama “são veículos exclusivos detidos, respectivamente, por [R.R.C.R.] e [J.P.F.R.C.], e foram utilizados pelos Conselheiros Rossi para a prática de diversas irregularidades e recebimento de recursos indevidos”; e (b) “diante da gravidade e da recorrência dessas práticas, com o descumprimento permanente e atual de obrigação legal em favor da Companhia, é imperativo que, nos termos do art. 120 da Lei das Sociedades por Ações, delibere-se pela suspensão dos direitos políticos da RCR e Aperoama enquanto não restituírem os valores indevidamente recebidos e não promoverem a reparação dos danos causados à Companhia”.
Os Requerentes apresentaram pedido de interrupção da AGE, em 27.05.2025, alegando essencialmente que:
(a) “em linha com os precedentes da CVM, a proposta de suspensão dos direitos políticos dos acionistas Aperoama e RCR - itens (i) e (ii) da ordem do dia da assembleia geral extraordinária - é manifestamente ilegal, na medida em que não está relacionado a “situações objetivamente verificáveis” de descumprimento de obrigação prevista na lei ou no estatuto”;
(b) “não há obrigação inadimplida pelos acionistas Aperoama e RCR, ora Requerentes, pois, sequer há obrigação”; “os valores transferidos à Aperoama e RCR são (i) restituição de valores pagos por Aperoama e RCR após a constrição de seu patrimônio por dívidas da Companhia; e (ii) pagamento da remuneração devida pelo exercício de cargo na administração, realizada por meio de veículos de investimento, tendo em vista a constrição e bloqueio das contas bancárias dos administradores, em razão de dívidas da Companhia, que se encontra em recuperação judicial”;
(c) “ainda que fosse uma dívida civil ela não caracterizaria uma “violação do Estatuto Social”, como propõe a administração. Não há dispositivo do Estatuto Social que permita a suspensão de direitos políticos de acionistas por dívidas que, in casu, sequer existem. Portanto, não houve violação ao Estatuto Social da Companhia por parte dos Requerentes”;
(d) “a Companhia sequer propôs uma demanda contra os acionistas ora Requerentes, iniciando um procedimento arbitral apenas contra os ex-administradores (…). Não existe título, nem haverá, da suposta obrigação inadimplida, porque a Companhia não deduziu nenhuma pretensão contra os acionistas ora Requerentes. Nem mesmo uma notificação extrajudicial foi enviada”;
(e) “não se pode confundir (alegados) atos ilícitos com obrigação. O art. 120 da Lei 6.404/76 tem como propósito forçar o cumprimento de uma obrigação objetivamente verificada, sendo inconciliável com o regime jurídico da responsabilização civil do acionista (...)”
Em suma, os Requerentes solicitaram que a CVM:
(a) declare, de plano, a ilegalidade dos itens (i) e (ii) da ordem do dia da Assembleia Geral Extraordinária da Rossi, informando a Companhia acerca de seu entendimento, nos termos do art. 124, §5º, inciso II, da LSA, e art. 68, § 2º, da Resolução CVM n° 81/2022 (“RCVM 81”); e
(b) caso a SEP e o Colegiado da CVM, mesmo diante da flagrante ilegalidade dos itens (i) e (ii) da ordem do dia da Assembleia Geral Extraordinária da Rossi, entendam ser necessária análise mais perfunctória das propostas apresentadas à AGOE, os Requerentes, em caráter subsidiário, requerem a interrupção do curso do prazo de antecedência de convocação da Assembleia Geral Extraordinária, nos termos do art. 124, §5º, inciso II, da LSA, e art. 68 da RCVM 81.
Instada a se manifestar, a Companhia apresentou tempestivamente os seguintes pontos principais:
(a) “a Aperoama e a RCR, veículos exclusivos dos ex-administradores supramencionados, receberam pagamentos irregulares por parte da Companhia, incluindo por meio de operações nas quais a Companhia foi representada em inobservância ao artigo 26 do seu Estatuto Social”;
(b) “tendo recebido valores que sabiam indevidos, ambos possuem obrigação de devolução imediata de tais valores à Companhia”;
(c) “quanto à possibilidade jurídica de suspensão dos direitos dos Requerentes, conforme o Professor Luiz Daniel Haj Mussi ensina, a medida pode ser aplicada em razão de violação aos deveres fiduciários do acionista, como o dever de lealdade”; e
(d) “é interessante observar que, por ocasião da AGE de 23 de outubro de 2024, foi proposta a suspensão dos direitos de “[S.T.L.] e pessoas vinculadas”, por suposta violação à realização de OPA estatutária. Na ocasião, não houve sequer identificação de quem seriam as pessoas vinculadas e as obrigações descumpridas. No entanto, a CVM, ao analisar pedido de interrupção de prazo da AGE (Processo CVM nº 19957.017480/2024-52, j. em 18.10.2024), entendeu que inexistiria irregularidade na assembleia.”.
A Companhia também apresentou manifestação de consultor jurídico no sentido de que: “os Veículos Rossi deveriam ter restituído os valores que lhes foram transferidos indevidamente pela Companhia – o que, até agora, não ocorreu, configurando mora daqueles acionistas. Nesse contexto, a aplicação do art. 120 da Lei nº 6.404/1976 é uma medida legítima para coagi-los a purgar a mora perante a Companhia”.
A Superintendência de Relações com Empresas – SEP analisou o pleito nos termos do Parecer Técnico nº 59/2025-CVM/SEP/GEA-3. De início, a SEP destacou que sua análise se restringiu às questões relacionadas diretamente ao pedido de interrupção do curso do prazo de convocação da AGE convocada para 12.06.2025 referente aos dois itens da pauta questionados pelos Requerentes.
Nesse sentido, a SEP observou que os Requerentes apresentaram diversos argumentos que, no entendimento deles, demonstram que a Companhia teria um bloco de controle. No entanto, o Parecer Técnico não analisou esta questão, uma vez que não é o escopo de um pedido de interrupção de assembleia.
Ainda, a SEP afastou o argumento da Companhia sobre análise da CVM no âmbito do Processo CVM nº 19957.017480/2024-52. A respeito, a SEP esclareceu que naquele caso não foi analisada a legalidade da deliberação, mas sim a regularidade da convocação da assembleia. Como mencionado naquela análise, consubstanciada no Parecer Técnico nº 101/2024-CVM/SEP/GEA-3, “o Requerente questiona uma eventual irregularidade na convocação da AGE de 23.10.2024, não questionando diretamente que a deliberação violaria dispositivos legais”. E, conforme indicado na conclusão do referido parecer, “não foi identificada ilegalidade na convocação da AGE marcada para 23.10.2024”.
Isto posto, a SEP destacou que, no presente caso concreto, os Requerentes questionam uma eventual irregularidade na deliberação, pelo que não foi analisada a regularidade da convocação, mas sim se os itens (i) e (ii) da AGE a ser realizada em 12.06.2025 violam dispositivos legais ou regulamentares.
Analisando os pontos apresentados na Proposta da Administração, a SEP observou que a Companhia menciona que os acionistas RCR e Aperoama teriam recebido recursos indevidos, referentes a atos praticados por ex-administradores que são os únicos cotistas dos mencionados acionistas. Posteriormente, em sua manifestação, a Companhia mencionou ainda que o art. 120 poderia ser aplicado “em razão de violação aos deveres fiduciários do acionista, como o dever de lealdade”. Não obstante, tal questão não foi mencionada na Proposta da Administração, tendo sido mencionado apenas o art. 398 do Código Civil ressaltando que “até o presente momento nenhum valor irregularmente recebido pelos Veículos foi devolvido ou indenizado à Companhia, caracterizando um descumprimento de obrigação legal por parte dos Veículos”.
Nesse sentido, a SEP observou que, embora a Companhia tenha alegado que os acionistas receberam recursos que teriam sido desviados pelos ex-administradores, resta pendente a comprovação dos supostos pagamentos irregulares, indevidos e/ou sem o devido registro e lastro contábil causados pelos ex-administradores em benefício dos acionistas. Ademais, não há título judicial ou contratual que certifique a existência, o valor e a exigibilidade da alegada dívida, muito menos que se enquadraria como a obrigação prevista no referido art. 120 da LSA.
Da mesma forma, a SEP ressaltou que a existência de dívidas de acionistas com companhia aberta, por si só, não tem o condão de permitir a utilização do art. 120 da lei societária, sem que demonstrado tratar-se de descumprimento de obrigação imposta pela lei ou pelo estatuto, conforme exige o citado artigo.
Ademais, como mencionado no Ofício Circular/Anual-2025-CVM/SEP, “o instituto da suspensão dos direitos políticos teve origem na intenção de forçar o cumprimento de uma obrigação e não o de ser instrumento de solução de conflitos em geral”, conforme decidido pelo Colegiado da CVM no âmbito do Processo CVM nº 19957.002748/2023-71, em reunião realizada em 25.04.2023”. Por interferir de maneira relevante na esfera dos direitos do acionista, segundo a SEP, tal instituto deve ser utilizado apenas quando se estiver diante do descumprimento de obrigação imposta pela lei ou pelo estatuto, o que não foi comprovado no presente caso.
Assim, na visão da SEP, restou demonstrado que as deliberações dos itens (i) e (ii) propostas à AGE da Rossi, a ser realizada em 12.06.2025, violam o disposto no art. 120 da LSA.
Ante o exposto, a SEP sugeriu que o Colegiado da CVM: (i) declare a impossibilidade de serem deliberados os referidos itens da pauta da AGE da Rossi, a ser realizada em 12.06.2025; ou (ii) determine, por até 15 (quinze) dias, a interrupção do curso do prazo de antecedência de sua convocação e, se for o caso, informe à Companhia, até o término da interrupção, as razões pelas quais entende que as deliberações propostas à assembleia violam dispositivos legais ou regulamentares.
O Presidente João Pedro Nascimento acompanhou as conclusões da SEP, com os complementos apresentados em sua manifestação de voto. De início, destacou que a CVM deve ser bastante criteriosa na aplicação da faculdade que lhe conferiu a Lei nº 10.303/2001, devendo o julgador se ater ao exame da legalidade da convocação e/ou das propostas a serem submetidas à assembleia, nos termos do art. 124, §5°, inciso II, da LSA.
O Presidente apontou que na avaliação da legalidade da deliberação para suspensão de direitos com base no art. 120 da LSA, precedentes do Colegiado da CVM têm exigido a existência de um “descumprimento específico e objetivamente verificável” por parte do acionista sujeito à sanção.
Nesse sentido, acrescentou que, de plano e neste contexto específico, não é possível identificar, nas razões apresentadas pela Companhia, a existência de uma obrigação certa e específica atribuível aos Requerentes, que teria importado em violação ao estatuto social e/ou a lei, nos termos do art. 120 da LSA. Na visão do Presidente João Pedro Nascimento, não há qualquer título judicial e/ou contratual que “certifique a existência, o valor e a exigibilidade da alegada dívida, muito menos que se enquadraria como a obrigação prevista no referido artigo 120”. A proposta da administração tampouco indica a existência de medidas judiciais ou arbitrais adotadas para cobrança dos supostos valores devidos pelos Recorrentes.
Assim, em linha com as considerações da SEP no Parecer Técnico nº 59, o Presidente concluiu que as deliberações dos itens (i) e (ii) constantes da ordem do dia da AGE da Rossi, a ser realizada em 12/06/2025, violam o disposto no art. 120 da LSA.
A Diretora Marina Copola acompanhou o entendimento da área técnica.
O Diretor João Accioly votou acompanhando a manifestação da SEP, tendo apresentado Manifestação de Voto com considerações adicionais sobre a matéria.
Assim, por unanimidade, acompanhando as conclusões da área técnica, o Colegiado entendeu que as deliberações constantes dos itens (i) e (ii) do edital de convocação da Assembleia Geral Extraordinária ("AGE") da Rossi Residencial S.A. - Em recuperação judicial ("Rossi"), convocada para 12.06.2025, violam o disposto no art. 120 da Lei nº 6.404/1976 (“LSA”). Nesse sentido, o Colegiado determinou, nos termos do art. 124, § 5º, II, da LSA, que a Companhia seja informada acerca das conclusões do Colegiado sobre a impossibilidade de que os referidos itens sejam deliberados na AGE da Rossi, prevista para 12.06.2025, destacando seu entendimento de que seria possível a realização da AGE na data prevista desde que os itens (i) e (ii) da ordem do dia sejam retirados de pauta.
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