ATA DA REUNIÃO EXTRAORDINÁRIA DO COLEGIADO DE 16.06.2025
Participantes
• JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTO – PRESIDENTE
• OTTO EDUARDO FONSECA DE ALBUQUERQUE LOBO – DIRETOR
• JOÃO CARLOS DE ANDRADE UZÊDA ACCIOLY – DIRETOR
• MARINA PALMA COPOLA DE CARVALHO – DIRETORA
(*) Reunião realizada por videoconferência.
Outras Informações
Ata divulgada no site em 17.06.2025.
PEDIDOS DE INTERRUPÇÃO E ADIAMENTO DE ASSEMBLEIA GERAL EXTRAORDINÁRIA - BRF S.A. – PROCESSOS 19957.006603/2025-19 E 19957.006664/2025-78
Reg. nº 3297/25Relator: SEP
Trata-se de pedidos de interrupção e adiamento da Assembleia Geral Extraordinária (“AGE”) de BRF S.A. (“BRF” ou “Companhia”) convocada para o dia 18.06.2025, formulados por dois acionistas (“Requerentes”), invocando o disposto no art. 124, §5º, incisos I e II, da Lei nº 6.404/1976 (“LSA”).
Em 16.05.2025, foi convocada AGE da BRF, a ser realizada em 18.06.2025, para deliberar, entre outras matérias, conforme item (ii) da ordem do dia, sobre a proposta de incorporação da totalidade das ações de emissão da Companhia pela sua acionista controladora, a Marfrig Global Foods S.A. (“Marfrig”), na forma prevista no art. 252 da LSA. Conforme estabelecido no Protocolo e Justificação de Incorporação das Ações de Emissão da BRF pela Marfrig (“Protocolo e Justificação”) foram constituídos comitês especiais por ambas as companhias (“Comitês Especiais”), para fins de atendimento ao Parecer de Orientação CVM nº 35/2008 (“PO CVM 35”).
Em 02.06.2025, foi protocolizado por acionista da BRF, Sr. A.R.M.F., detentor de 0,11% de ações da Companhia (“Requerente 1”), pedido para a CVM: (i) determinar a interrupção do prazo de realização da AGE da BRF, convocada para o dia 18.06.2025, nos termos do art. 124, §5º, inciso II , da LSA; (ii) adotar providências cabíveis para assegurar a observância (a) das regras aplicáveis aos acionistas controladores da BRF; (b) dos deveres fiduciários dos administradores da Companhia; (c) da independência dos Comitês Especiais; e (d) da proteção dos direitos dos acionistas minoritários da BRF.
Na mesma data, foi protocolizado por acionista da BRF, Nova Almeida Fundo de Investimento Multimercado (“Nova Almeida FIM” ou “Requerente 2”), pedido para a CVM: (i) deliberar pelo adiamento da AGE por 30 (trinta) dias em razão da insuficiência da documentação apresentada, (ii) cumulativamente, conceder a interrupção do curso do prazo de convocação da AGE pelo prazo máximo legal de 15 (quinze) dias, para a apuração, pela CVM “das ilegalidades apontadas na formulação da ordem do dia e dos vícios relacionados ao descumprimento do PO 35, à ausência de independência dos membros de comitês alegadamente independentes, à participação dos controladores nas deliberações do Conselho de Administração das Companhias, à imposição de condição ilegal para pagar dividendos para afetar o resultado da AGE e à ilegalidade da Relação de Substituição”.
Diante dos referidos pedidos, a Companhia se manifestou nos termos do art. 64 da Resolução CVM nº 81/2022 (“RCVM 81”), conforme destacado no parágrafo 6º do Parecer Técnico nº 69/2025-CVM/SEP/GEA-4.
A Superintendência de Relações com Empresas – SEP analisou os pleitos nos termos do Parecer Técnico nº 69/2025-CVM/SEP/GEA-4. De início, a SEP destacou que sua análise se restringiu aos questionamentos dos acionistas relacionados aos requisitos previstos no art. 124, § 5º, da LSA, tendo em vista o rito relacionado aos pedidos de adiamento e interrupção do prazo de convocação de assembleia.
Nesse sentido, a SEP observou que os pontos que servem de base para os pedidos de adiamento ou interrupção da assembleia são, em resumo: (1) alegadas irregularidades na constituição dos Comitês Especiais - ausência de independência dos membros dos Comitês (Parecer de Orientação CVM n° 35/2008); (2) alegado descumprimento das regras de conflito de interesses - atuação indevida de administradores em situação de conflito de interesses; (3) alegada estruturação abusiva em relação à decisão de pagamento de dividendos - condicionamento do recebimento de dividendos ao não exercício do direito de retirada; (4) questionamento quanto ao critério do período de cotações utilizado como parâmetro em laudo de avaliação da BRF; (5) questionamento quanto ao momento do anúncio da operação; (6) questionamento quanto a não divulgação de documentos elaborados por assessor financeiro externo, incluindo um Fairness Opinion; e (7) alegada falta de clareza na adoção da relação de substituição - relação de substituição desfavorável aos acionistas da BRF.
Em relação às questões listadas nos itens (1) a (5) acima, objeto de análise nos §§ 13 a 74 do Parecer Técnico nº 69/2025-CVM/SEP/GEA-4, a SEP apresentou a conclusão de que, em princípio, não foram identificados elementos que justificariam, pelas razões expostas, o deferimento do pedido de adiamento ou interrupção da assembleia de acionistas da BRF, convocada para o dia 18.06.2025.
Em relação às questões listadas nos itens (6) e (7) a SEP manifestou que:
(a) Não caberia exigir a divulgação de documento que, segundo informado pela Companhia, não foi elaborado (caso da fairness Opinion que não foi emitida pelo assessor financeiro externo da Marfrig);
(b) Entende-se que não seria exigível a divulgação ao público dos números objeto de discussão no curso das tratativas dos comitês que não vieram a se confirmar como base efetiva da relação de troca ao final proposta;
(c) Não obstante, as informações e documentos relevantes que, ao final, foram levadas em conta pelo Comitê Especial Independente e pelo Conselho de Administração da Companhia, do qual o acionista controlador é Presidente, em atenção ao disposto no art. 22 e Anexo I da RCVM 81, deveriam ter sido disponibilizadas para que os demais acionistas pudessem tomar uma decisão informada;
(d) Tratando-se de operação entre sociedade controladora e controlada, além da descrição do processo de negociação, deve ser apresentada a justificativa com as razões pelas quais a relação de troca proposta é considerada equitativa. Naturalmente, com vista a atender a esse objetivo, não bastaria informar que as condições foram negociadas por comitês independentes. É imprescindível que os acionistas sejam informados dos dados relevantes que nortearam o entendimento dos comitês quanto à comutatividade das condições propostas;
(e) Não se pode deixar de considerar que, no caso concreto, a relação de troca difere, de maneira relevante, da relação histórica das cotações de ações bastante líquidas de emissão das companhias envolvidas na operação. O parâmetro da relação de troca do laudo previsto no art. 264 da LSA também resulta em uma relação bastante diferente, com as ressalvas mencionadas no Parecer Técnico nº 69/2025-CVM/SEP/GEA-4 (vide §§ 102 a 104).
(f) nos documentos divulgados pela Companhia, foi descrito um intenso processo de estudo e negociação por parte do Comitê Especial Independente de BRF, que teria levado em conta, conforme manifestação da Companhia, premissas, estimativas, projeções, indicadores macroeconômicos, e outras variáveis econômico-financeiras. Das atas dos comitês identificam-se menções a uma série de informações e parâmetros, sem que, no entanto, essas informações sejam explicitamente divulgadas, tais como projeções, sinergias, racional de projeções, relação de troca proposta inicialmente e contraproposta, análises das cotações, dados financeiros das Companhias, referências de transações comparáveis, cenários de projeções para EBITDA e múltiplos;
(g) Não se identificam, nos documentos divulgados pela Companhia, informações sobre os números e projeções das Companhias que tenham sido levadas ao conhecimento do controlador, seja considerado o controlador direto, Marfrig, por meio de seu comitê, seja considerado o controlador indireto, Presidente do CA da BRF. Também não se identificam números e projeções que nortearam o entendimento dos comitês quanto à comutatividade das condições propostas;
(h) Não se trata de questionar a relação de substituição proposta, mas a divulgação das informações previstas na Resolução CVM nº 81/22, para que os acionistas possam tomar uma decisão informada. Entende-se não ser suficiente, no caso concreto, informar que o critério resultou de um processo de negociação entre Comitês Independentes. Nesse sentido, a SEP ressaltou que tratando-se de operação entre sociedade controladora e controlada, os critérios e procedimentos adotados para reconhecimento contábil da operação deverão ser acompanhados pela Área Técnica.
Assim, a SEP sugeriu ao Colegiado da CVM o deferimento do pedido de adiamento da assembleia da BRF convocada para o dia 18.06.2025, nos termos do item I do § 5o do artigo 124 da LSA, por até 30 dias, até a apresentação de informações suficientes aos acionistas da BRF para a compreensão dos critérios e informações que levaram o comitê e o conselho de administração da BRF a entender adequado o preço base de cada companhia, utilizado para cálculo da relação de troca proposta.
Os membros do Colegiado acompanharam o Parecer Técnico nº 69/2025-CVM/SEP/GEA-4. Adicionalmente, os Diretores Otto Lobo, João Accioly e Marina Copola apresentaram manifestações destacando suas considerações sobre a matéria.
O Diretor Otto Lobo apresentou manifestação de voto no sentido de suspender a assembleia da BRF pelo prazo de 21 (vinte e um) dias até que sejam apresentadas informações suficientes, bem como, estudos, apresentações, relatórios, opiniões e pareceres, aos seus acionistas que permitam a compreensão dos critérios adotados pelo Comitê Independente e, posteriormente, pelo Conselho de Administração que justificam a fixação da relação de substituição das ações tal como previsto no Protocolo.
A Diretora Marina Copola manifestou que este é um caso que evidencia a importância da atuação da CVM nos termos do art. 124, §5º, da Lei nº 6.404/76. Trata-se de uma operação de incorporação entre partes relacionadas, regida pelo art. 264 da mesma lei. Da análise dos materiais colocados à disposição dos acionistas, vê-se que a fixação da relação de substituição não se deu com base nas cotações das ações, ainda que ambas integrem índice de liquidez, mas a partir de negociação realizada entre comitês ditos independentes. Tal relação de substituição mostrou-se significativamente diferente do critério histórico de negociação em bolsa.
Segundo a Diretora, isso, por si só, não é um problema, nem cabe à autarquia imiscuir-se no mérito da relação de substituição, desde que seja constatado que a negociação foi travada em bases adequadas. A estrita observância do Parecer de Orientação 35 costuma ser um forte – talvez o mais forte – indício de que houve comutatividade, mas mesmo esse indício pode ser desbancado por diversos outros que apontem para uma eventual distorção no processo adotado. Em outras palavras, o Parecer de Orientação 35 cria uma presunção relativa, e como tal, ela pode ser afastada.
De qualquer forma, a Diretora destacou que essas não são questões para o juízo cognitivo sumário que deve ser exercido pelo Colegiado aqui, na forma do art. 124, §5º, da Lei nº 6.404/76. O que parece claro é que, sobretudo nas hipóteses em que há discrepância relevante entre um critério de natureza mais objetiva e o resultado da negociação, maior é o ônus informacional que recai sobre a sociedade incorporadora ao divulgar os critérios que culminaram na fixação da relação de substituição em cumprimento ao art. 22 da Resolução CVM 81/22. Dito de outro modo: quanto mais afastado o valor proposto aos acionistas estiver de um parâmetro de cunho mais objetivo e verificável, maior deve ser a transparência, completude e suficiência das informações divulgadas com vistas a subsidiar a tomada de decisão pelos acionistas sobre a operação. A existência de partes relacionadas em lados opostos do negócio apenas reforça esta conclusão.
Por fim, a Diretora reiterou que para fins do que aqui se discute, nada disso tem a ver com um julgamento sobre os critérios adotados ou a adequação ou não dos valores propostos em concreto. O papel da CVM, neste estágio, é assegurar que os acionistas tenham condições de tomar uma decisão devidamente informada. No caso da assembleia em comento, o conjunto informacional disponibilizado para subsidiar a decisão dos acionistas foi, como bem apontou a SEP, insuficiente, não podendo, por isso, ser considerado cumprido o art. 22 da Resolução CVM 81/22.
Assim, o Colegiado, por unanimidade, acompanhando a manifestação da SEP consubstanciada no Parecer Técnico nº 69/2025-CVM/SEP/GEA-4, decidiu pelo provimento do pedido de adiamento da AGE da BRF convocada para 18.06.2025, pelo prazo de 21 dias contados da disponibilização das informações pela Companhia quanto ao exigido pelo art. 9° da Resolução CVM nº 81/2022.
Para fins de clareza, em referência ao § 138 do Parecer da SEP, presumir-se-ão por informações suficientes aquelas que permitam compreender os critérios e informações que levaram o comitê e o conselho de administração da BRF a entender adequado o preço base de cada companhia, utilizado para cálculo da relação de troca proposta, nomeadamente as informações mencionadas nas Atas de Reuniões dos Comitês Especiais Independentes, observado o exposto no § 117 do Parecer da SEP. Ao final, o Presidente João Pedro Nascimento, acompanhado pelo Diretor João Accioly, destacou que no contexto da disponibilização das “informações suficientes” devem ser preservadas aquelas referentes aos planos de negócios das companhias envolvidas na operação, bem como outros documentos sensíveis e de ordem interna das companhias, que – por tal motivo – são analisadas no nível dos comitês independentes (e não necessariamente diante da generalidade dos acionistas).
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