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Decisão do colegiado de 26/09/2023

Participantes

· JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTO – PRESIDENTE (*)
· FLÁVIA MARTINS SANT'ANNA PERLINGEIRO – DIRETORA
· OTTO EDUARDO FONSECA DE ALBUQUERQUE LOBO – DIRETOR
· JOÃO CARLOS DE ANDRADE UZÊDA ACCIOLY – DIRETOR

(*) Por estar na CVM de São Paulo, participou por videoconferência.

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SRE – OPA POR AUMENTO DE PARTICIPAÇÃO NA EUCATEX S.A. - INDÚSTRIA E COMÉRCIO – PROC. 19957.004081/2023-41

Reg. nº 2929/23
Relator: SRE/GER-1

Trata-se de recurso interposto por Brascorp Participações Ltda. ("Recorrente" ou "Ofertante"), contra entendimento da Superintendência de Registro de Valores Mobiliários – SRE, manifestado no âmbito da oferta pública de aquisição de ações (“OPA” ou “Oferta”) por aumento de participação de Eucatex S.A. - Indústria e Comércio ("Companhia" ou "Eucatex"), a ser realizada pela Recorrente, cujo pedido de registro foi protocolado na CVM em 18.05.2023.

A análise do pedido de registro da OPA foi suspensa devido ao processo de elaboração de nova avaliação, nos termos do art. 4º-A da Lei nº 6.404/1976 ("LSA") e do art. 28 da Resolução CVM nº 85/2022 ("Resolução CVM 85"). O tema objeto do recurso está relacionado ao referido processo de nova avaliação, no âmbito do qual, o Recorrente alegou que o requerimento de convocação de assembleia especial apresentado por acionistas detentores de ações em circulação não estaria "acompanhado de elementos de convicção que demonstrem a falha ou imprecisão no emprego da metodologia de cálculo ou no critério de avaliação adotado", nos termos do § 1º do art. 4º-A da LSA.

Segundo as informações constantes da última versão do Edital da OPA protocolada na CVM, são objeto da Oferta 594.235 (quinhentos e noventa e quatro mil, duzentos e trinta e cinco) ações ordinárias de emissão da Companhia, que representam a totalidade das ações ordinárias em circulação. O histórico e a razão para o lançamento da OPA por aumento de participação encontram-se descritos nos itens 1.2 e 2.1. do Edital.

Inicialmente, a OPA seria lançada com o preço de R$ 12,00 (doze reais) por ação ordinária, acima do valor apurado em laudo de avaliação elaborado pelo primeiro avaliador (“Laudo de Avaliação Original” e “Avaliador Original”) de R$ 10,78 (dez reais e setenta e oito centavos), com base na metodologia do fluxo de caixa descontado, julgada mais adequada pelo Avaliador Original para a determinação do preço justo das ações da Companhia. O item 7 do Edital apresenta as informações sobre o Laudo de Avaliação elaborado pelo Avaliador Original.

Em 01.06.2023, a Argucia Capital Gestão de Recursos Ltda. ("Argucia"), em nome de determinados Fundos de Investimento por ela geridos ("Fundos Argucia"), acionistas titulares de mais de 10% (dez por cento) das ações ordinárias de emissão da Companhia em circulação, enviou carta à Eucatex requerendo aos seus administradores que convocassem a assembleia especial prevista no art. 4º-A da LSA. Nesse requerimento, a Argucia apresentou, em síntese, os seguintes elementos de convicção, que, em seu entendimento, demonstram falha ou imprecisão no Laudo de Avaliação elaborado pelo Avaliador Original:

(i) “O Laudo utiliza um crescimento real de 0,0% a.a. na perpetuiddade, que parece inconsistente com o histórico da companhia, sua posição competitiva no mercado, com o setor em que atua e com o crescimento real de PIB esperado pelo mercado.”;

(ii) “A necessidade de capital de giro utilizada para cálculo do fluxo de caixa na perpetuidade utilizada, combinada com crescimento de 0% na perpetuidade é inconsistente com a teoria e subestima de forma relevante o valor da companhia.”;

(iii) “A utilização de prêmio de risco por tamanho não é corroborada por nenhum estudo acadêmico no mercado brasileiro ou em mercados emergentes e sua utilização, sem comprovação teórica para o mercado brasileiro, subestima de forma relevante o valor da companhia.”; e

(iv) “O Avaliador não considerou a utilização do valor patrimonial como avaliação do valor justo da empresa, o valor do patrimônio líquido é 109% superior ao do valor presente do fluxo de caixa encontrado pelo laudo.”.

Em 13.06.2023, anteriormente à realização da assembleia especial em questão, que se daria em 30.06.2023, a Ofertante encaminhou expediente à CVM, com cópia para a Companhia, alegando resumidamente que o pleito de convocação de assembleia especial realizado pelos Fundos Argucia seria improcedente, bem como apresentando fundamentação técnica elaborada pelo Avaliador Original a fim de rebater cada um dos pontos levantados pelos referidos acionistas minoritários.

Na assembleia especial realizada em 30.06.2023 (“AGEsp”), nos termos do art. 4º-A da LSA, foi escolhida a avaliadora da nova avaliação da Companhia (“Nova Avaliadora” e “Novo Laudo de Avaliação”).


Em 06.07.2023, a Ofertante protocolou na CVM reclamação ("Reclamação") a respeito da escolha da Nova Avaliadora na AGEsp. Na Reclamação a Ofertante solicitou à CVM que: “a. determine imediatamente a suspensão dos efeitos das deliberações havidas na Assembleia Especial realizada no dia 30 de junho de 2023 às 10:00 horas; b. negue, com efeitos ex tunc, o pedido formulado pelos Fundos Argúcia para a realização de uma assembleia especial dos acionistas titulares de ações ordinárias nos termos do art. 4º-A, pela ausência de fundamento legal conforme demonstrado acima; c. anule a Assembleia Especial realizada no dia 30 de junho de 2023 às 10:00 horas; d. determine a realização da Oferta com base no preço por ação de R$12,00 (doze reais) conforme inicialmente proposto pela Ofertante; e. alternativamente, caso entenda que a Assembleia Especial deva ser realizada, determine (e.i) a anulação a Assembleia Especial realizada no dia 30 de junho de 2023 às 10:00 horas; e (e.ii) a realização de nova Assembleia Especial para deliberar a contratação de nova empresa avaliadora em sistema de lista fechada, restrita às 4 (quatro) maiores empresas de auditoria independente no Brasil (...)”.

Tendo em vista que alguns dos temas abordados na Reclamação se referiam a assuntos de competência da Superintendência de Relações com Empresas – SEP, a SRE solicitou manifestação daquela área técnica sobre os seguintes pontos, “relacionados à competência da CVM para (i) suspender efeitos de uma Assembleia Geral de Acionistas já realizada, (ii) anular uma Assembleia Geral de Acionistas já realizada; ou (ii) determinar a realização de uma nova Assembleia Geral de Acionistas.”.

Em resposta, a SEP destacou, em síntese, que “não é possível à CVM, com base em suas competências legais, realizar quaisquer das 3 ações elencadas [na reclamação e no parágrafo acima], restando a atividade sancionadora como instrumento possível para atuação em casos que assim o exijam.".

Em 14.07.2023, Argúcia e a Nova Avaliadora protocolaram na CVM suas respectivas respostas à Reclamação, em que sustentaram, em síntese, (i) “a improcedência da Reclamação, tendo em vista a inexistência de quaisquer ilegalidades seja no Requerimento Argucia, seja na AGEsp que deliberou pela realização do segundo laudo de avaliação e escolheu a [Nova Avaliadora] para realizar o trabalho.”; e (ii) que “as alegações realizadas pela Brascorp para descaracterizar a nomeação e contratação da [Nova Avaliadora] para elaboração do Novo Laudo de Avaliação da Eucatex, direito exclusivo dos sócios minoritários, mostram-se totalmente infundadas, sendo a [Nova Avaliadora] e seus sócios profissionais idôneos, capacitados, experientes e legitimamente selecionados pelos acionistas minoritários da Companhia para a elaboração do Novo Laudo de Avaliação da Eucatex para fins de OPA.".

Em 02.08.2023, a SRE enviou Ofício à Recorrente e à Companhia, comunicando suas conclusões sobre as questões abordadas em manifestações da Recorrente, da Argúcia e da Nova Avaliadora. Em síntese, a SRE ratificou seu entendimento de que os "'(...) elementos de convicção que demonstrem a falha ou imprecisão no emprego da metodologia de cálculo ou no critério de avaliação adotado (...)' apresentados pelo Reclamado, nos termos do § 1º do art. 4º-A da LSA, não se mostraram desarrazoados. A esse respeito, cabe ressaltar que o fato de laudos de avaliação de outras companhias abertas também preverem crescimento real nulo na perpetuidade não significa que tal premissa seja isenta de falha ou imprecisão no contexto da Companhia e de seu Laudo de Avaliação", cumprindo "mencionar que o próprio § 1º do art. 4º-A da LSA prevê o remédio nos casos em que a Companhia não atende ao pleito dos acionistas minoritários de convocação da Assembleia Especial, qual seja, a possibilidade de convocação de tal assembleia pelos próprios detentores de ações em circulação, o que, em nosso entendimento, demonstra que eventual discordância relativa à fundamentação para convocação desta assembleia não teria o poder de obstar sua realização.".

Quanto ao pleito de que a Nova Avaliadora seja obrigada a "considerar exclusivamente os preços, taxa de juros e demais indicadores em período idêntico ao utilizado pela Avaliadora original, ou seja, em período anterior à publicação do edital da OPA", a SRE ressaltou que “o novo avaliador deverá observar estritamente o regramento contido na Resolução CVM 85 na elaboração da nova avaliação, com destaque aos requisitos” constantes nos arts. 9º e 10 e o Anexo C. A esse respeito, a SRE destacou que “não cabe à CVM definir quais as premissas que devem ser adotadas por um avaliador na elaboração de laudo, como solicita o Ofertante, mas sim garantir que tal documento seja elaborado observando a regulamentação aplicável”.

No mesmo expediente, a SRE solicitou que a Companhia se manifestasse sobre a eventual irregularidade cometida mediante o fato de ainda não ter contratado a Nova Avaliadora, “não tendo solicitado à CVM qualquer prazo adicional para fazê-lo, apenas se manifestando 26 dias após a Assembleia Especial para mencionar que aguardaria a discussão de questões trazidas pelo Ofertante para realizar tal contratação, condicionando o cumprimento de um dever legalmente imposto à Companhia à uma discordância trazida pelo Ofertante, a qual, em momento algum, foi subscrita pela Companhia”.

Com relação às questões suscitadas pelo Recorrente e pela Argúcia sobre supostas irregularidades ocorridas, a SRE encaminhou os temas à SEP e à SMI, considerando respectivamente o relato sobre (i) eventual irregularidade cometida no procedimento adotado no âmbito de Assembleia Especial; e (ii) eventual manipulação de mercado.

Em 22.08.2023, diante das conclusões apresentadas pela SRE, a Recorrente protocolou recurso na CVM, solicitando o reconhecimento de “que (i) o requerimento de Assembleia Especial formulado pelos Fundos Argucia não atende aos requisitos impostos pelo artigo 4º-A, §1º, da Lei das S.A., uma vez que não demonstrou a existência de qualquer falha ou imprecisão no Laudo de Avaliação inicialmente elaborado no âmbito da OPA, sendo ilegítimo para fundar nova reprecificação das ações de emissão da Eucatex, (ii) por consequência, a deliberação tomada na Assembleia Especial, de eleição da [Nova Avaliadora] para avaliação das ações não deve ser reconhecida como válida, e (iii) por todos esses fundamentos, eventual preço aferido no âmbito da reavaliação da Eucatex pela [Nova Avaliadora] não pode ser legitimamente considerado no âmbito da OPA.".

As razões do Recurso foram destacadas no item 33 do Ofício Interno n° 95/2023/CVM/SRE/GER-1.

Em 13.09.2023, a Nova Avaliadora encaminhou o Novo Laudo de Avaliação da Companhia, tendo apurado o valor justo das ações de emissão da Companhia no intervalo entre R$ 12,75 e R$ 14,01, com ponto médio no valor de R$ 13,38, utilizando-se da metodologia do fluxo de caixa descontado, julgada mais adequada pela Nova Avaliadora. Desse modo, o Ofertante teve até o dia 18.09.2023, nos termos do inciso IV do art. 28 da Resolução CVM 85 para se manifestar sobre a manutenção da OPA, com a consequente majoração de seu preço, ou se desistiria da Oferta, desde que assumisse o compromisso de realizar a devolução do excesso de participação que adquiriu, nos termos do art. 32 da mesma Resolução.

Em 18.09.2023, a Companhia divulgou Fato Relevante informando que a Ofertante manifestou seu interesse em seguir com a OPA, majorando seu preço para R$ 13,38 (treze reais e trinta e oito centavos).

A SRE analisou o recurso nos termos do Ofício Interno nº 95/2023/CVM/SRE/GER-1, tendo destacado, de início, que, até aquele momento, o Laudo de Avaliação Original não havia sido objeto de análise por parte da Área Técnica, uma vez que o pleito de convocação de assembleia especial de detentores de ações em circulação para deliberar sobre a realização de nova avaliação suspendeu o curso da análise do pedido de registro da OPA.

Em sua análise, a SRE detalhou os dispositivos aplicáveis à OPA por aumento de participação e ao procedimento de revisão do preço da referida OPA.

Nesse contexto, a SRE refutou o questionamento do Recorrente, no sentido de que o pleito de convocação da assembleia especial que deliberou pela contratação de nova avaliação não teria observado a regulamentação aplicável. Sobre esse tema, a SRE reiterou seu entendimento de que o §1º do art. 4º-A da LSA apresenta critérios objetivos previstos para a requisição "aos administradores da companhia que convoquem assembleia especial dos acionistas titulares de ações em circulação no mercado, para deliberar sobre a realização de nova avaliação pelo mesmo ou por outro critério, para efeito de determinação do valor de avaliação da companhia (...)", quais sejam, (i) requerimento tempestivo e (ii) "(...) devidamente fundamentado e acompanhado de elementos de convicção que demonstrem a falha ou imprecisão no emprego da metodologia de cálculo ou no critério de avaliação adotado (...)".

Nesse sentido, na visão da SRE, “tendo sido o pedido de convocação da referida Assembleia apresentado tempestivamente, fundamentado e acompanhado dos elementos de convicção que demonstrem falha ou imprecisão no emprego da metodologia de cálculo ou no critério de avaliação adotado, sem qualquer característica que possa de pronto denotar um erro ou um aspecto que seja desarrazoado no pleito em questão”, “não caberia à CVM realizar julgamento sobre os elementos de convicção apresentados, sendo esses elementos, além de requisitos objetivos para justificar o pleito de nova avaliação, subsídios para instruir a participação dos acionistas minoritários da Companhia na assembleia especial a ser realizada, ponderando o risco de uma nova avaliação resultar em um valor inferior ao da primeira avaliação e obrigar tais acionistas a ressarcirem a Companhia pelos custos dessa nova avaliação”.

Sobre esse ponto, a SRE fez referência ao voto do ex-diretor da CVM Wladimir Castelo Branco Castro, no precedente referente ao Processo CVM nº RJ2002/7753, acompanhado de forma unânime pelo Colegiado da CVM, em reunião de 17.04.2003, no sentido de que: “(...) não seria compatível com uma abordagem sistêmica da Lei que coubesse à CVM avaliar o preço da OPA em casos de alienação de controle, já que, como visto na extensa transcrição da Lei aí acima, quando se trata de cancelamento de registro, o preço da OPA é avaliado e discutido interna societatis, funcionando a CVM como mero disciplinador do disposto nos artigos 4º e 4º-A, que trata do registro de companhia aberta e de seu cancelamento.”.

Portanto, na visão da SRE, caberia à CVM, como mero disciplinador do disposto nos arts. 4º e 4º-A da LSA, regulamentar o procedimento com relação a prazos e efeitos no âmbito da OPA, o que fez por meio dos arts. 27, 28 e 31 da Resolução CVM 85, bem como supervisionar sua observância no âmbito dos casos concretos, sem, contudo, interferir na discussão sobre o preço em si, o que envolveria analisar a justeza das premissas utilizadas em um laudo de avaliação.

Nada obstante, segundo a SRE, caberia à CVM, como fez no presente caso, observar se foram objetivamente apresentados elementos de convicção que demonstrem a falha ou imprecisão no emprego da metodologia de cálculo ou no critério de avaliação adotado na confecção do laudo de avaliação, verificando se seriam tais elementos desprovidos de qualquer razoabilidade, o que, se fosse o caso, justificaria a interferência da CVM no sentido de manifestar entendimento de que os critérios estabelecidos pelo § 1º do art. 4º-A não teriam sido objetivamente observados, cabendo à Companhia tomar as providências cabíveis no âmbito da assembleia que porventura tenha sido realizada com vício.

De outra forma, conforme ressaltado pela Área Técnica, caso fosse o papel da CVM discutir se uma premissa é melhor do que a outra, estaria a Autarquia, indiretamente, discutindo o preço da Oferta, o que fugiria de sua competência. No entendimento da SRE, o papel da CVM na análise de um laudo de avaliação se restringe aos aspectos objetivamente estabelecidos na Resolução CVM 85, verificando a suficiência de seu conteúdo e seu alinhamento em relação às informações publicamente divulgadas pela companhia objeto, nos termos do art. 4º do Anexo C da mesma Resolução ("As informações constantes do laudo de avaliação devem ser baseadas nas demonstrações financeiras auditadas da companhia avaliada, podendo, adicionalmente, ser fundamentadas em informações gerenciais relativas à companhia avaliada, fornecidas por sua administração ou por terceiros por ela contratados, e ainda em informações disponíveis ao público em geral").

No mesmo sentido, a SRE observou que o Parecer de Orientação CVM nº 01/78, apesar de tratar de tema diverso do tema em análise no presente caso, elucida, em seu item 13, questão conceitual importante, qual seja, que a CVM não deve julgar o mérito das avaliações dos preços das companhias.

Por outro lado, a SRE ressaltou que, da análise dos demais dispositivos da Resolução CVM 85 que se aplicam ao laudo de avaliação, verifica-se que o referido documento deve refletir a opinião do avaliador sobre o valor ou intervalo de valor da companhia avaliada. Assim, cabe ao avaliador, seguindo sua opinião, adotar a metodologia de avaliação que julgar mais apropriada para a situação em que se encontra a companhia avaliada, bem como as premissas a serem utilizadas no emprego da metodologia escolhida.

Nesse contexto, considerando que o real valor intrínseco de uma companhia é decorrência da interação complexa de muitos fatores financeiros e econômicos - muitos de difícil observação - no entendimento da área técnica, caberia ao avaliador, utilizando seu conhecimento e sua experiência, emitir sua opinião, estimando o valor de uma companhia.

Nesse sentido, segundo a SRE, ainda que o pleito de convocação de assembleia especial para deliberar sobre a realização de nova avaliação elenque como "elementos de convicção (...)" questões relacionadas a premissas adotadas que já foram utilizadas em outras avaliações sem qualquer questionamento, caso haja com relação a tais premissas um grau de incerteza que possa tornar razoável o argumento de que outra premissa poderia ser melhor empregada, já seria o suficiente, na visão da área técnica, para justificar o pleito em questão, legitimando a discussão "interna societatis" que a própria Lei prevê.

Adicionalmente, a SRE observou que o próprio § 1º do art. 4º-A da LSA prevê a possibilidade de convocação de assembleia pelos próprios detentores de ações em circulação, nos casos em que a companhia não atenda ao pleito realizado pelos acionistas minoritários, o que, no entendimento da SRE, demonstra que eventual discordância relativa à fundamentação para convocação desta assembleia não teria o poder de obstar sua realização.

Ainda, a SRE ressaltou que, em caso de realização de nova avaliação e sendo apurado o valor das ações objeto superior ao apontado pelo laudo de avaliação original, a regulamentação não permite que o ofertante de uma OPA por aumento de participação desista da OPA, o que é possível em uma OPA na modalidade "para cancelamento de registro", salvo se, alternativamente, realize o procedimento de devolução do excesso de participação adquirida, previsto no art. 32 da Resolução CVM 85.

Em relação ao caso concreto objeto do Recurso, a SRE entendeu que o pedido de convocação da Assembleia Especial atendeu objetivamente a todos os requisitos legais previstos no §1º do art. 4º-A da LSA, pois foi tempestivo e fundamentado, apresentando, assim, subsídios para instruir a participação dos acionistas minoritários da Companhia na assembleia especial a ser realizada.

Nesse ponto, a SRE destacou não ter considerado desprovidos de qualquer razoabilidade os elementos de convicção apresentados no pedido de convocação da Assembleia Especial, como: (i) a discordância em relação à previsão de crescimento real nulo da Companhia; e (ii) a utilização de um prêmio de tamanho no cálculo do custo médio ponderado do capital da Companhia. Isto porque, tendo em vista a posição competitiva da Companhia no mercado em que atua, seu crescimento real em anos anteriores, o crescimento real do PIB esperado e o fato de haver estudos que indicam que a utilização de um prêmio de tamanho no cálculo do custo de capital próprio não ser adequada para algumas empresas, seria assim legítimo que acionistas titulares de ações em circulação considerem a opinião do Avaliador Original como imprecisa no que tange a essas premissas utilizadas, considerando que foram apresentados fundamentos que justificam a opção por premissas diferentes, denotando, na visão desses acionistas, uma falha ou imprecisão no emprego da metodologia de cálculo ou no critério de avaliação adotado.

Isto posto, a SRE destacou que não cabe à CVM realizar julgamento sobre os elementos de convicção apresentados, pois, caso o fizesse, estaria indiretamente avaliando e discutindo o preço da OPA, que deve ser assunto "interna societatis".

Da mesma forma, segundo a SRE “não cabe à CVM substituir a Assembleia Especial, em sua prerrogativa de julgar o quanto os elementos de convicção apresentados para demonstrar falha ou imprecisão no laudo de avaliação original refletem ou não a realidade da Companhia, sob o risco, cumpre lembrar, de os acionistas que votaram favoravelmente à realização de nova avaliação terem que restituir a Companhia dos custos do novo laudo”.

Ademais, a SRE ressaltou que, mesmo que a Ofertante não possa contestar as opiniões do avaliador no âmbito do segundo laudo de avaliação – conforme alegado pela Recorrente –, caso o referido laudo siga corretamente o regramento previsto na Resolução CVM 85, em especial em seu anexo C, a Recorrente teria a possibilidade de desistir de lançar a OPA, caso se comprometa a realizar o procedimento de devolução de excesso de liquidez previsto no art. 32 da Resolução CVM 85. De acordo com a SRE, seria possível, ainda, a depender da situação fática da Companhia, apresentar pleito ao Colegiado da CVM, devidamente justificado, de concessão de prazo adicional para a devolução do excesso de participação, em linha com o precedente referente ao Processo RJ2014/3380, apreciado pelo Colegiado em 30.06.2014 (conforme decisão retificada em 03.07.2014).

Ante o exposto, a SRE manteve o entendimento de que o pedido de convocação da Assembleia Especial foi legítimo por ter observado de forma estrita os requisitos legais previstos no § 1º do art. 4º-A da LSA, o que inclui a apresentação dos elementos de convicção demonstrando falha ou imprecisão no emprego da metodologia de cálculo ou no critério de avaliação adotado, cabendo à CVM o papel de disciplinador do rito de revisão de preço, garantindo que tenham sido observados os aspectos formais previstos, deixando que a discussão sobre o preço, que inevitavelmente envolve as premissas utilizadas no laudo de avaliação original, fique a cargo dos acionistas minoritários, uma vez que trata-se de discussão "interna societatis".

Em manifestação complementar, nos termos do Ofício Interno nº 96/2023/CVM/SRE/GER-1, a SRE destacou que, em 20.09.2023, a Ofertante apresentou requerimento de desistência do Recurso.

Não obstante, a SRE observou que o presente Processo se encontra em fase pré-sancionadora, em razão de eventual infração cometida pela Eucatex por retardar a contratação da empresa escolhida para elaborar a nova avaliação da Companhia na assembleia especial realizada em 30.06.2023. A esse respeito, a Companhia alegou ter retardado a contratação da instituição escolhida para elaboração da segunda avaliação devido aos questionamentos que o Ofertante havia feito junto à CVM sobre eventual inobservância, no âmbito da convocação da citada AGesp, dos requisitos constantes do § 1º do art. 4º-A da LSA. Assim, considerando que tais questões foram abordadas no Recurso, a SRE entendeu ser de suma importância para a melhor condução desse processo pré-sancionador que o Colegiado da CVM enfrentasse o mérito do Recurso, ainda que tenha havido o pedido de desistência da Recorrente.

Adicionalmente, a SRE destacou que o tema objeto do Recurso tem significativa repercussão no mercado, pois trata dos requisitos legais previstos na LSA para a convocação de assembleia especial de acionistas detentores de ações em circulação a fim de deliberar sobre a contratação de nova avaliação e o papel da CVM nesse rito de revisão de preço.

Desse modo, e considerando o contexto do caso concreto e o disposto no art. 5º da Resolução CVM nº 46/2021 e o § 8º do art. 4º da Resolução CVM nº 46/2021, a SRE sugeriu ao Colegiado da CVM que apreciasse o tema objeto do Recurso sob a forma de consulta.

A Diretora Flávia Perlingeiro acompanhou integralmente os entendimentos externados pela Área Técnica por meio do Ofício Interno n° 95/2023/CVM/SRE/GER-1, concordando com o recebimento do Recurso como consulta, nos termos propostos no Ofício Interno n° 96/2023/CVM/SRE/GER-1. A propósito, a Diretora destacou a relevância do ferramental erigido pelo disposto no art. 4°-A da Lei das Sociedades Anônimas (LSA), para os fins de proteção dos direitos dos acionistas minoritários a que a norma se destina.

Nesse contexto, a Diretora pontuou que, como bem ressaltado pela SRE, a modalidade de OPA em questão veio estabelecer, em certa medida, maior equilíbrio entre as situações em que se encontram acionistas controladores/pessoas vinculadas vis-à-vis acionistas minoritários, uma vez que a extrapolação do limite apontado pela regra como aquele que traz prejuízo à liquidez dá ensejo à obrigação de oferecer aos minoritários um evento de liquidez a preço justo. Assim, frisou a Diretora que, na hipótese de revisão do preço da OPA na forma prevista pelo art. 4-A da LSA, não é permitida a desistência da OPA pelo ofertante, salvo se adotar o procedimento alternativo de que trata o regramento aplicável para alienar o excesso de participação adquirida (não podendo as ações então alienadas ter como adquirentes pessoas vinculadas ao acionista controlador).

A Diretora enfatizou, ainda, que se trata de situação que enseja OPA obrigatória, mas o respectivo fato que gera a obrigação de realizar a OPA é o aumento da participação no capital social da companhia aberta que excede a patamar previamente conhecido, portanto, como bem salientado pela SRE é uma “ação espontânea” do controlador/pessoa vinculada.

Por fim, a Diretora Flávia Perlingeiro ressaltou também a importância de que seja resguardada a integridade do conclave especial a que se refere o art. 4°-A da LSA, preservando a deliberação restrita aos acionistas titulares das ações em circulação, em linha com o previsto na lei e na regulamentação da CVM.

O Diretor Otto Lobo acompanhou, preliminarmente, a proposta da SRE no sentido de que o recurso seja aceito como consulta. No mérito, o Diretor acompanhou integralmente as conclusões da SRE de que o pedido de convocação de assembleia especial prevista no art. 4º-A da Lei 6.404/76, apresentado por Argucia Capital Gestão de Recursos Ltda., em nome de determinados Fundos de Investimento por ela geridos, para a escolha da instituição responsável pela elaboração de nova avaliação da Eucatex foi legítimo por ter atendido estritamente a todos os requisitos formais previstos no § 1º do art. 4º-A da LSA.

Contudo, o Diretor Otto Lobo entendeu relevante destacar a questão central do recurso, ora consulta, qual seja, a necessidade de que o pedido de convocação de assembleia especial para deliberar sobre a realização de nova avaliação, esteja acompanhado de detalhados elementos de convicção que demonstrem a falha ou imprecisão no emprego da metodologia de cálculo ou no critério de avaliação adotado.

A esse respeito, o Diretor Otto Lobo destacou que a LSA não faz menção a quem ou de que forma a demonstração da falha ou imprecisão deverá ser avaliada ou informações mínimas para que tal demonstração possa ser aceita. Tampouco a Resolução CVM nº 85 trata especificamente sobre o tema.

Segundo o Diretor, depreende-se que, ao avaliar e deliberar pela contratação de nova avaliação na assembleia especial, os acionistas estão julgando a validade dos elementos de convicção apresentados. Tal interpretação é a que mais faz sentido, à luz do disposto no art. 4º-A da LSA, sendo certo que a intenção do legislador foi proteger o direito de revisão do preço nos casos em que há divergência entre acionistas e ofertantes, mantendo sua apreciação “interna societatis”.

Ainda, nos termos do §6º do referido art. 4º-A, o Diretor Otto Lobo entendeu não existir razão para que a CVM não examine estas questões e tenha um entendimento na Resolução 85, que regula as OPAs, que está prevista para ser revista, conforme pauta regulatória da CVM.

O Presidente João Pedro Nascimento e o Diretor João Accioly acompanharam integralmente a manifestação da SRE consubstanciada no Ofício Interno n° 95/2023/CVM/SRE/GER-1 e complementada pelo Ofício Interno nº 96/2023/CVM/SRE/GER-1.

Em conclusão, o Colegiado, por unanimidade, tendo em vista o pedido de desistência do recurso apresentado pelo Recorrente, decidiu pelo conhecimento do tema objeto do recurso sob a forma de consulta e acompanhou o entendimento da área técnica, consubstanciado no Ofício Interno n° 95/2023/CVM/SRE/GER-1 e complementado pelo Ofício Interno nº 96/2023/CVM/SRE/GER-1, no sentido de que, com base nos elementos do caso concreto, o pedido de convocação de assembleia especial prevista no art. 4º-A da LSA para a escolha da instituição responsável pela elaboração de nova avaliação da Eucatex foi legítima por ter observado os requisitos legais previstos no § 1º do art. 4º-A da LSA.

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