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Decisão do colegiado de 16/01/2024

Participantes

• JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTO – PRESIDENTE
• JOÃO CARLOS DE ANDRADE UZÊDA ACCIOLY – DIRETOR
• DANIEL WALTER MAEDA BERNARDO – DIRETOR
• MARINA PALMA COPOLA DE CARVALHO – DIRETORA (*)


(*) Participou por videoconferência.

RECURSO CONTRA DECISÃO DA SRE – OPA POR AUMENTO DE PARTICIPAÇÃO NA EUCATEX S.A. - INDÚSTRIA E COMÉRCIO – PROC. 19957.004081/2023-41

Reg. nº 2929/23
Relator: SRE/GER-1

Trata-se de expediente apresentado à CVM por Argucia Capital Gestão de Recursos Ltda. (“Recorrente” ou “Argucia”), em nome de determinados fundos de investimento por ela geridos, acionistas da Eucatex S.A. - Indústria e Comércio (“Companhia” ou “Eucatex”), solicitando a suspensão da oferta pública de aquisição de ações da Companhia (“OPA” ou “Oferta”) por aumento de participação, cujo pedido de registro foi deferido pela Superintendência de Registro de Valores Mobiliários – SRE em 18.12.2023, a ser realizada em observância ao art. 4º, §6º da Lei nº 6.404/1976 (“LSA”) tendo a Brascorp Participações Ltda. como ofertante ("Ofertante").

A SRE, visando a dar o melhor aproveitamento ao pleito de suspensão em questão, e evitando interferir no curso da OPA, recebeu o pleito como interposição de recurso contra o deferimento do registro da OPA, nos termos da Resolução CVM nº 46/2021, sem no entanto determinar a suspensão ou paralisação de seu andamento, permanecendo o leilão da Oferta previsto para ocorrer em 19.01.2024, conforme Edital divulgado pela Ofertante em 20.12.2023, tendo como objeto 594.235 ações ordinárias de emissão da Companhia, equivalentes a 1,90% do total de ações que compõem o seu capital social.

Paralelamente ao processo que tratou da análise do pedido de registro da Oferta, a SRE instaurou processo para tratar de reclamações de acionistas em relação à OPA e ao laudo de avaliação, as quais foram consideradas na análise do referido pedido de registro, ensejando, inclusive, a elaboração de diversas exigências que, no entendimento da área técnica, foram integralmente atendidas pela Ofertante e pela instituição responsável pela elaboração do laudo de avaliação e refletidas na documentação da Oferta.

Os detalhes do caso foram destacados no Ofício Interno nº 5/2024/CVM/SRE/GER-1 (“Ofício Interno nº 5”), estando as Características da OPA nos itens 5 a 10, o histórico do Processo nos itens 11 a 34 e as manifestações da Recorrente, da instituição responsável pela elaboração do segundo laudo de avaliação (“Nova Avaliadora”) e da Ofertante, respectivamente nos itens 35, 36 e 37, todos do referido Ofício Interno.

Em relação ao histórico do Processo, em 26.09.2023, o Colegiado da CVM apreciou tema relacionado à Oferta, sob a forma de consulta, acompanhando “o entendimento da área técnica, consubstanciado no Ofício Interno n° 95/2023/CVM/SRE/GER-1 e complementado pelo Ofício Interno nº 96/2023/CVM/SRE/GER-1, no sentido de que, com base nos elementos do caso concreto, o pedido de convocação de assembleia especial prevista no art. 4º-A da LSA para a escolha da instituição responsável pela elaboração de nova avaliação da Eucatex foi legítima por ter observado os requisitos legais previstos no § 1º do art. 4º-A da LSA”.

Em síntese, no expediente ora em análise, a Recorrente alegou que o laudo de avaliação da Companhia, elaborado pela nova Avaliadora após a realização do procedimento de revisão do preço de OPA previsto no art. 4º-A da LSA indicaria "um valor de avaliação da Companhia que se fundamenta em premissas incompatíveis entre si e que demonstram uma tentativa de subavaliar a Companhia para a finalidade da OPA", razão pela qual a Recorrente pleiteou a "(...) adoção do expediente previsto no Artigo 4º, § 2º, II, da Resolução CVM nº 85, de 2022, determinando-se a suspensão da OPA até a retificação das irregularidades (...) apontadas".

Em análise consubstanciada no Ofício Interno nº 5, a SRE detalhou os dispositivos aplicáveis à OPA por aumento de participação e ao procedimento de revisão do preço da referida OPA.

Sobre a competência da CVM para aferir o preço apurado em avaliação, a SRE fez referência ao voto do ex-diretor da CVM Wladimir Castelo Branco Castro, no precedente referente ao Processo CVM nº RJ2002/7753, acompanhado de forma unânime pelo Colegiado da CVM, em reunião de 17.04.2003, no sentido de que: “(...) não seria compatível com uma abordagem sistêmica da Lei que coubesse à CVM avaliar o preço da OPA em casos de alienação de controle, já que, como visto na extensa transcrição da Lei aí acima, quando se trata de cancelamento de registro, o preço da OPA é avaliado e discutido interna societatis, funcionando a CVM como mero disciplinador do disposto nos artigos 4º e 4º-A, que trata do registro de companhia aberta e de seu cancelamento.”.

No mesmo sentido, a SRE destacou que o Colegiado da CVM, no âmbito do presente Processo, em reunião de 26.09.2023, acompanhando o entendimento da área técnica, manifestou que cabe à CVM, como mero disciplinador do disposto nos arts. 4º e 4º-A da LSA, regulamentar o procedimento de revisão de preço de uma OPA com relação a prazos e efeitos no âmbito da OPA, o que fez por meio dos arts. 27, 28 e 31 da Resolução CVM n° 85/2022 (“Resolução CVM 85”), bem como supervisionar sua observância no âmbito dos casos concretos, sem, contudo, interferir na discussão sobre o preço em si, o que envolveria opinar sobre a seleção das premissas utilizadas em um laudo de avaliação.

Diante disso, conforme destacado pela SRE, não cabe à CVM realizar julgamento sobre a seleção das premissas utilizadas em um laudo de avaliação, devendo os acionistas que discordarem das premissas utilizadas em uma avaliação de companhia objeto da OPA, se titulares de mais de 10% das ações de emissão da companhia em questão, apresentar requerimento aos administradores dessa companhia, incluindo elementos de convicção, que, em seu entendimento, demonstrem falha ou imprecisão no laudo de avaliação dessa companhia, solicitando que os referidos administradores convoquem a assembleia especial prevista no art. 4º-A da LSA.

De outra forma, segundo a SRE, “caso fosse o papel da CVM discutir se uma premissa é melhor do que a outra, estaria a Autarquia, indiretamente, discutindo o preço da Oferta, o que fugiria de sua competência, conforme vimos acima. Em nosso entendimento, o papel da CVM na análise de um laudo de avaliação se restringe aos aspectos objetivamente estabelecidos na Resolução CVM 85, verificando a suficiência de seu conteúdo e seu alinhamento em relação às informações publicamente divulgadas pela companhia objeto, nos termos do art. 4º do Anexo C da mesma Resolução ("As informações constantes do laudo de avaliação devem ser baseadas nas demonstrações financeiras auditadas da companhia avaliada, podendo, adicionalmente, ser fundamentadas em informações gerenciais relativas à companhia avaliada, fornecidas por sua administração ou por terceiros por ela contratados, e ainda em informações disponíveis ao público em geral")”.

Nesse contexto, a SRE ressaltou que, na análise dos demais dispositivos da Resolução CVM 85 que se aplicam ao laudo de avaliação, se verifica que o referido documento deve refletir a opinião do avaliador sobre o valor ou intervalo de valor da companhia avaliada. Assim, cabe ao avaliador, seguindo sua opinião, adotar a metodologia de avaliação que julgar mais apropriada para a situação em que se encontra a companhia avaliada, bem como as premissas a serem utilizadas no emprego da metodologia escolhida.

No entendimento da SRE, “o real valor intrínseco de uma companhia é decorrência da interação complexa de muitos fatores financeiros e econômicos, muitos de difícil observação. Assim, cabe ao avaliador, utilizando seu conhecimento e sua experiência, além de informações gerenciais fornecidas pela companhia avaliada e que julgue consistentes, emitir sua opinião, estimando o valor de uma companhia”.

Isto posto, na visão da SRE, “não cabe à CVM realizar julgamento sobre os elementos de convicção apresentados, a menos que representem erros técnicos ou materiais, pois, caso o fizesse, estaria indiretamente avaliando e discutindo o preço da OPA, que deve ser assunto ‘interna societatis´”.

Em relação ao caso concreto, a SRE observou que a Recorrente alegou a existência de uma suposta inconsistência entre o investimento em ativo biológico e a exaustão desse ativo na perpetuidade, período em que o laudo de avaliação projeta um crescimento real zero no fluxo de caixa da Companhia, conforme itens 6 a 9 do expediente apresentado pela Recorrente.

Não obstante a argumentação apresentada pela Recorrente, a SRE ressaltou seu entendimento de que “o fato de o laudo de avaliação projetar crescimento real zero para o fluxo de caixa da Companhia na perpetuidade não necessariamente obriga o Avaliador a estimar que os valores previstos de investimento em ativo biológico sejam iguais ou inferiores à exaustão desses ativos. No cenário projetado pelo laudo de avaliação, o Avaliador utilizou, por julgar consistentes, as previsões de investimento em ativo biológico previstas pela Companhia e como exaustão desse ativo o custo histórico do investimento realizado, conforme detalhado em sua manifestação”.

Conforme observado pela SRE, esse cenário foi projetado de acordo com o setor de atuação da Companhia e com base nas premissas utilizadas no laudo de avaliação, de modo que, na visão da área técnica, esse laudo seria, “conforme o art. 2º do Anexo C da Resolução CVM 85, uma opinião fundamentada do Avaliador”.

Ademais, a SRE fez referência à observação da Nova Avaliadora no sentido de que “(...) o Laudo de Avaliação realizado teve como objetivo o cálculo do valor justo das ações da Eucatex, não se prestando, portanto, para fazer a avaliação do valor justo de qualquer ativo ou passivo de forma individualizada”.

Nesse contexto, a SRE não identificou “erros técnicos ou materiais no Laudo de Avaliação que devessem ocasionar a suspensão da oferta em andamento ou a alteração das premissas utilizadas no laudo e, consequentemente, os valores apurados na avaliação da Companhia”.

Adicionalmente, a SRE destacou que, caso o preço da Oferta já não tivesse sido submetido ao procedimento de revisão conforme mencionado, “os argumentos apresentados contra as premissas utilizadas no laudo de avaliação possivelmente poderiam ser utilizados como "elementos de convicção" para subsidiar a iniciativa de revisão de preço conforme previsto no art. 4º-A da LSA, mas [...] tal procedimento já ocorreu, por iniciativa da própria Recorrente, sendo escolhido em assembleia especial um avaliador de sua indicação”.

Assim, a SRE entendeu que “não cabe à CVM realizar julgamento sobre as premissas utilizadas no laudo de avaliação consideradas consistentes e ausentes erros técnicos ou materiais, haja vista que a determinação das premissas deve ser assunto "interna societatis", ressaltando que tal discussão já ocorreu na presente OPA, não sendo previsto na LSA mais de uma revisão de preço da Oferta”.

Ante o exposto, a SRE manteve o entendimento de que o laudo de avaliação que determinou o valor econômico da Companhia, elaborado pela Nova Avaliadora, contempla os pressupostos previstos na regulamentação aplicável, não tendo sido identificados erros nas premissas a serem retificados. Desse modo, a SRE entendeu que a OPA por aumento de participação da Companhia não deve ser suspensa.

A Diretora Marina Copola apresentou manifestação de voto pelo não provimento do recurso interposto, acompanhando integralmente o Ofício Interno nº 5. Adicionalmente, a Diretora apresentou considerações sobre os laudos de avaliação exigidos em ofertas públicas de aquisição, destacando alguns aspectos do sistema estabelecido pela LSA para tratar das tensões que podem cercar sua elaboração.

Em seu voto, a Diretora abordou, em síntese, a perspectiva “da companhia como fonte de informações gerenciais, e dos seus administradores (e, eventualmente, do acionista controlador) como pontos de contato com os próprios avaliadores”.

A esse respeito, conforme observado pela Diretora, no âmbito das OPAs, “a tutela dos acionistas de mercado não se dá apenas por via do art. 4º-A da lei acionária, mas também pela observância [dos] deveres” impostos pela LSA aos acionistas controladores e administradores (no caso dos administradores, notadamente os “deveres fiduciários”). Nesse sentido, a Diretora ressaltou que a “sensibilidade do contexto de uma oferta pública para tais acionistas exige que, na dinâmica com os avaliadores, as pessoas referidas no art. 10 da Resolução CVM nº 85 atuem com a diligência, a lealdade e a independência necessárias, a despeito de quem seja o ofertante”.

Nesse contexto, em relação aos limites da análise a ser realizada pela CVM, a Diretora destacou que “no caso concreto a área técnica deu uma boa demonstração do que se espera, cotejando a racionalidade das justificativas apresentadas com as demonstrações financeiras. Reiter[ando]: não cabe à CVM imiscuir-se na adequação do preço ofertado e reconhecidamente, há uma linha tênue entre um e outro campo de investigação.”.

Isto posto, a Diretora reforçou que “uma análise, com essas limitações, acerca do cumprimento dos deveres que recaem nos termos da lei sobre acionistas controladores e administradores, não é inédita para a área técnica. (...) vez que não é de hoje que a autarquia vem entendendo que a demonstração do cumprimento de deveres fiduciários pode, conforme o caso (frise-se), demandar cuidados adicionais”. Assim, “ainda que a CVM não influa, e não deva influir, na fixação do preço da oferta, ela está atenta a todos esses aspectos atinentes à dinâmica das avaliações em processos de oferta pública”.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando a manifestação da área técnica e a manifestação de voto apresentada pela Diretora Marina Copola, deliberou pelo não provimento do recurso, ratificando o entendimento de que a oferta pública de aquisição de ações por aumento de participação da Eucatex S.A. - Indústria e Comércio, cujo leilão está previsto para 19.01.2024, não deve ser suspensa.

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